10 mitos sobre o aborto que precisam ser desfeitos

23 de fevereiro, 2015

(Brasil Post, 23/02/2015) A Suprema Corte dos Estados Unidos deu às mulheres americanas o direito ao aborto legal com a histórica decisão do processo Roe vs. Wade, 42 anos atrás.

Quatro décadas mais tarde, o direito ao aborto ainda é atacado. Nos últimos anos, políticos conservadores lançaram uma campanha altamente agressiva para reverter os direitos reprodutivos das mulheres. Eles retratam o aborto como um procedimento imoral, perigoso e doloroso procurado por mulheres equivocadas e que sem dúvida se arrependerão de sua decisão mais adiante. E vêm usando esses mitos para justificar uma enxurrada de novas leis e restrições ao aborto. Com isso, as americanas hoje enfrentam cada vez mais obstáculos quando procuram um aborto legal e feito em condições de segurança.

Em meio a todo o discurso, contudo, alguns dos fatos mais importantes relativos ao aborto tendem a ser obscurecidos. Veja a seguir alguns mitos reiterados com frequência e que precisamos desmentir.

1. MITO: O aborto é perigoso.

A REALIDADE: Mais de 99,75% dos abortos não causam problemas médicos importantes.

De acordo com um estudo realizado em 2014 pela Universidade da Califórnia em San Francisco (UCSF), que monitorou 55 mil mulheres por seis semanas após seus abortos, menos de um quarto de 1% dos abortos realizados nos Estados Unidos levaram a complicações graves de saúde.

Os pesquisadores notaram que, com esse resultado, o grau estatístico de risco do aborto é mais ou menos igual ao de uma colonoscopia.

Se esse fato parece surpreendente, pense em como a cultura popular americana deturpa os riscos do aborto: segundo outro estudo de 2014 da UCSF, 9% das personagens de cinema e televisão que fazem abortos morrem em consequência direta do procedimento.

2. MITO: O aborto medicamentoso, feito com fármacos, ainda é usado em poucos casos e não tem reconhecimento médico pleno.

A REALIDADE: Mais ou menos um em cada cinco abortos é um aborto medicamentoso.

Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças constataram que 19% dos abortos realizados nos EUA em 2011 foram medicamentosos e que 28,5% dos abortos medicamentosos foram feitos nas primeiras nove semanas de gestação.
O Instituto Guttmacher também constatou que os abortos medicamentosos aumentaram substancialmente entre 2008 e 2011, indicando que mais mulheres vêm encerrando suas gestações com esse método, uma alternativa ao aborto cirúrgico.

3. MITO: As mulheres que fazem abortos vão se arrepender e terão mais chances de sofrer problemas de saúde mental.

A REALIDADE: A maioria das mulheres não vai se arrepender de sua decisão e não terá chances maiores de sofrer problemas de saúde mental que as mulheres que levam uma gravidez não planejada até o fim.

Muitas mulheres sofrem emoções conflitantes após um aborto, mas 95% das abortam acabam sentindo que tomaram a decisão certa, segundo um estudo de agosto de 2013 da UCSF. “Sentir emoções negativas após um aborto não é o mesmo que pensar que o aborto não foi a decisão certa”, explicaram os pesquisadores.

Além disso, enquanto a gravidez não planejada com frequência gera estresse emocional, não há evidências que sugiram que mulheres que optam por interromper uma gravidez terão probabilidade maior de sofrer problemas de saúde mental. A afirmação consta de um estudo de 2008 da Associação Americana de Psicólogos (APA) que investigou todos os estudos médicos relevantes publicados desde 1989.

A conclusão da APA foi que os estudos anteriores segundo os quais o aborto causa depressão e outros problemas de saúde mental deixaram de levar em conta outros fatores de riscos, especialmente o histórico médico da mulher. A APA levou esses fatores em conta e constatou que, entre as mulheres que têm uma gravidez não planejada, as que fazem abortos não têm probabilidade maior de apresentar probllemas de saúde mental que as que levam a gravidez a termo.

4. MITO: O feto sente dor durante um aborto.

A REALIDADE: O feto não consegue sentir dor antes da 24ª semana de gravidez, no mínimo.

Especialistas diversos que vão da Real Faculdade de Obstetras e Ginecologistas, do Reino Unido, até o Congresso Americano de Obstetras e Ginecologistas, concordam com esse prazo. Na realidade, pesquisadores da UCSF concluíram que o feto não sente dor antes de chegar à 29ª ou 30ª semana de desenvolvimento.

Por que, então, tantos países proíbem o aborto após 20 semanas de gestação? Uma deturpação dos resultados de pesquisa pode ser parcialmente responsável: muitos dos pesquisadores mais frequentemente citados por políticos contrários ao direito do aborto disseram ao New York Times que suas pesquisas não provam nada sobre a dor fetal.

5. MITO: A maioria dos americanos acha que o aborto não deveria ser permitido por lei.

A REALIDADE: A maioria dos americanos é favor do direito de escolha da mulher no tocante ao aborto.

De acordo com uma pesquisa Gallup de 2014, 78% dos americanos acham que o aborto deveria ser permitido por lei sob algumas circunstâncias ou em quaisquer circunstâncias (50% disseram “algumas circunstâncias” e 28%, “quaisquer circunstâncias”). Ademais, em 2012 o instituto Gallup descobriu que 61% dos americanos acham que os abortos devem ser permitidos por lei no primeiro trimestre de gravidez. Vale notar que, segundo o Instituto Guttmacher, nove em cada dez abortos realizados nos Estados Unidos são feitos no primeiro trimestre.

6. MITO: O índice de aborto nos Estados Unidos está subindo vertiginosamente.

A REALIDADE: O índice de aborto nos Estados Unidos está no nível mais baixo desde 1973.

O índice de aborto está em queda há anos e chegou ao nível mais baixo em 2011, segundo os dados mais recentes obtidos do Instituto Guttmacher. O autor do estudo atribuiu o declínio em parte ao uso de anticoncepcionais mais eficazes e de opçõescontraceptivas de mais longo prazo, como o DIU.

7. MITO: A maioria das americanas tem acesso fácil ao aborto.

A REALIDADE: As mulheres enfrentam mais e mais barreiras para fazer um aborto.

Mais de 57% das americanas vivem em Estados hostis ou extremamente hostis ao direito ao aborto, segundo o Instituto Guttmacher. É um aumento acentuado em relação a 2000, quando 31% das americanas viviam nesses Estados. Em 2011, 89% dos condados nos Estados Unidos não contavam com clínicas de aborto.

Não é por acaso que a situação é essa: nos últimos quatro anos, segundo uma análise do Guttmacher feita em janeiro de 2015, parlamentares promulgaram 231 novas restrições ao direito ao aborto. Com isso, muitas mulheres estão tendo que viajar para longe para chegar a uma clínica de aborto e podem ter que aguardar 24 horas para ser atendidas quando chegam. Essas barreiras afetam especialmente as mulheres que vivem em áreas rurais e as mulheres de baixa renda, que em muitos casos não têm como se ausentar do trabalho e pagar pelo transporte e por um quarto de hotel. Outras leis obrigam as mulheres a passar por procedimentos potencialmente sofridos, como olhar suas fotos de ecografia, antes de levarem adiante um aborto.

8. MITO: As mulheres frequentemente são coagidas a abortar.

A REALIDADE: As mulheres raramente citam pressões de seu parceiro ou sua família como tendo levado à decisão de interromper a gravidez.

Um estudo de 2005 do Instituto Guttmacher concluiu que menos de 1% das mulheres pesquisadas citou esse tipo de pressão como sendo uma de suas principais razões para abortar. Um estudo de 2013 da UCSF chegou a uma conclusão semelhante e descobriu que, embora as mulheres raramente citem a coerção de seus parceiros como razão para buscar um aborto, muitas citaram o desejo de escapar de um relacionamento negativo ou de violência doméstica.

9. MITO: As mulheres nunca fariam aborto se já soubessem como é ter um filho.

A REALIDADE: As mulheres que procuram um aborto já são mães, em sua maioria.

Sessenta e um por cento das mulheres que fizeram abortos em 2008 eram mães, e 34% tinham dois ou mais filhos, segundo o Instituto Guttmacher. O número apenas aumentou após a queda financeira de 2009. A Federação Nacional do Aborto disse à revista Slate que entre 2008 e 2011, 72% das mulheres que buscaram abortar já eram mães. Um estudo do instituto Guttmacher apontou que as mães geralmente procuram um aborto para proteger os filhos que já têm, por falta de condições para criar mais um filho.

10. MITO: É perigoso fazer um aborto em uma clínica que não siga os mesmos padrões que as clínicas cirúrgicas ambulatoriais.

A REALIDADE: A exigência de que as clínicas de aborto atendam aos padrões das clínicas cirúrgicas não favorece em muito a segurança das pacientes e obriga muitas clínicas de aborto a fechar.

Atualmente, 22 Estados americanos exigem que as clínicas de aborto se enquadrem em padrões restritivos e em muitos casos arbitrários, ditando que precisam ficar próximas de hospitais e que seus corredores e armários sigam medidas predeterminadas. Para cumprir as exigências, as clínicas muitas vezes precisam passar por reformas caras, e importantes organizações médicas dizem que as leis contribuem pouco para melhorar a segurança das pacientes.

Além disso, 11 Estados dos EUA hoje exigem que os médicos de clínicas de aborto tenham o direito de fazer procedimentos cirúrgicos num hospital próximo, mas muitos hospitais se negam terminantemente a lhes conceder esse direito. Com isso, os hospitais, na prática, têm o poder de fechar clínicas de aborto situadas nas proximidades.

Amanda Scherker

Acesse no site de origem: 10 mitos sobre o aborto que precisam ser desfeitos (Brasil Post, 23/02/2015)

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