Malala inspira garotas a lutarem pela educação e se consolida como exemplo

20 de outubro, 2014

(Correio Braziliense, 20/10/2014) O jinriquixá — carrinho de duas rodas puxado por um homem — parou diante do Pearl Continental Hotel, na cidade de Peshawar, em 3 de dezembro de 2011. Vestida com o uniforme escolar, a menina de 14 anos desembarcou, cumprimentou ativistas da organização não governamental Aware Girls, entre elas Gulalai Ismail, e subiu ao púlpito. “Em seu discurso, ela disse que existe uma desigualdade de poder entre homens e mulheres, e que essa lacuna precisa ser preenchida para pôr fim à violência”, afirmou Gulalai ao Correio. Exatamente 311 dias depois, a mesma garota foi surpreendida por um militante do Talibã dentro do ônibus, em Mingora, no Vale do Swat (norte do Paquistão), ao retornar da escola. “Quem é a Malala?”, questionou o extremista. “Eu sou Malala”, respondeu. O homem disparou-lhe um tiro à queima-roupa na cabeça. Vieram a batalha pela vida, a comoção internacional e a coragem de seguir adiante na luta pela educação. No último dia 10, o Nobel da Paz sacramentou o mito. Aos 17 anos, Malala Yousafzai se tornava uma estadista sem Estado, a personificação de uma causa maior.

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“Os talibãs acharam que aquelas balas nos silenciaram. Mas falharam e, então, do silêncio vieram milhares de vozes”, afirmou a estudante, vestida com o véu e o xale da ex-premiê paquistanesa Benazir Bhutto, em discurso na ONU, em 12 de julho de 2013. Gulalai não esconde o orgulho pela compatriota e colega. Ambas guardam semelhanças: começaram no ativismo com a mesma idade, 13 anos, e foram alvo de atentados. “O triunfo de Malala é uma vitória das meninas, das mulheres e da educação. Malala veio do noroeste do Paquistão, onde o analfabetismo feminino chega a 35%. Em Khyber-Pakhtunkhwa, onde ela nasceu, 65 em cada 100 garotas estão fora da escola”, lamentou a presidente da Aware Girls. Ao menos 1.030 escolas foram destruídas pelo Talibã naquela província entre 2009 e 2013.

Política

Comparada a Benazir Bhutto, Malala não esconde as pretensões políticas. “Eu quero me tornar a premiê do Paquistão”, declarou. A adolescente crê que a melhor forma de combater o terror e defender a educação seja por meio da política. “Um médico só pode ajudar uma comunidade, um político pode auxiliar um país”, disse.

O Nobel coloca sobre Malala uma responsabilidade vitalícia, um pacto que ela resolveu assumir. “Mas também lhe dá uma plataforma mais sólida para seu trabalho, algo que fará com que ela continue a ser escutada por toda a vida”, aposta Harpviken. “Malala mostrou integridade moral e comprometimento necessários para cumprir com esse papel”, acrescenta. Com a propriedade de quem escreveu um livro com a própria Malala, Patricia McCormick — coautora da biografia Malala: the girl who stood up for education and changed the world (“Malala: a garota que se levantou pela educação e mudou o mundo”) — conta que a laureada ajudou a montar uma escola em um campo de refugiados sírios. “As crianças costumam ficar nesses locais por sete anos, sem educação. Malala acha que isso lhes define um futuro de desesperança e oportunidades limitadas, o que pode levar à criação de nova geração de terroristas.”

Exemplo de coragem

“Malala é um exemplo vivo de coragem, não se trata de uma personagem histórica. Ela é uma jovem real que se manifestou pelo direito de ir à escola. E manteve a campanha, apesar das ameaças de morte e do sofrimento real. Agora ela vive no Reino Unido, onde frequenta uma escola bem diferente daquela no Paquistão. E ainda mantém uma agenda exigente para falar sobre os direitos das crianças — ao mesmo tempo, faz o dever de casa como qualquer outro estudante.”

Co-autora da biografia Malala: The girl who stood up for education and changed the world (“Malala: a garota que se levantou pela educação e mudou o mundo”)

Um caminho para mudanças

“Por meio de seu exemplo, Malala inspirou inúmeras garotas no Paquistão que desejam a educação e querem se levantar por seus direitos. Ela atrai atenção internacional aos desafios, bem como à força das garotas e mulheres paquistanesas. Se as forças domésticas se reunirem com o apoio construtivo internacional, tomando como exemplo o compromisso de Malala, isso terá o potencial de conduzir uma mudança fundamental na sociedade paquistanesa.”

Presidente do Instituto de Pesquisas da Paz (Prio), em Oslo, e ex-diretor do Comitê Norueguês do Afeganistão, em Peshawar.

Rodrigo Craveiro

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