Nota de pesar pelo falecimento da pesquisadora feminista Fúlvia Rosemberg

13 de setembro, 2014

O feminismo brasileiro perde Fúlvia Rosemberg, falecida na sexta-feira, 12 de setembro, em decorrência de complicações causadas por um câncer.

Pesquisadora sênior da Fundação Carlos Chagas e professora titular em Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Fúlvia coordenou no Brasil o Programa Internacional de Bolsas de Pós-Graduação da Fundação Ford/Fundação Carlos Chagas.

Durante várias décadas desenvolveu estudos sobre Ideologia e Educação, atuando principalmente com os temas: construção social da infância, educação infantil, políticas educacionais e relações de gênero, raça e idade. Uma mulher pioneira, brilhante e corajosa, Fúlvia Rosemberg deixa um imenso legado para as atuais e novas gerações.

Vejam a seguir um texto emocionado escrito por Carmen Barroso, atualmente diretora regional da IPPF (International Planned Parenthood Federation) e que, como pesquisadora sênior da Fundação Carlos Chagas, conviveu intensamente com Fúlvia Rosemberg como colega ao longo das décadas de 1970 e 1980 e como amiga desde então.

Irmã ausente na visita à casa paterna

Volta à Carlos Chagas após longos anos.
Pedaço de mim, pedaço de vida, grandes momentos revisitados.
Revendo meu nascimento profissional: colegas, amigas – na verdade irmãs.
Também meu desabrochar na cidadania: companheiras.

Várias ausências. Onde esta Fúlvia?
O choque: não está bem.
O olhar angustiado de quem conta revela o eufemismo:
Não é um mal passageiro.

No outro lado do celular, a voz tranquila de sempre:
Estou internada, fazendo testes de câncer.
Não queria saber o resultado dos testes do cérebro
mas eles foram bons.
Se declara um tanto cansada com as drogas tomadas para os testes,
Mas é a mulher de sempre
Firme e forte,
tendo clareza sobre o que quer e controle sobre o que faz.

Agora, deixa um buraco no mundo. Imenso.
Mas também deixa uma rica herança.
Seu exemplo e as inúmeras pessoas
Cujas vidas ela tocou.

Campeã das creches como justiça social e liberação feminina
Alma do Mulherio, abrindo novas fronteiras, fazendo ouvir novas vozes
Ousada pesquisadora das injustiças raciais
Dinâmica impulsionadora de oportunidades para os injustiçados
Professora e mentora por excelência.

Muitos e muitas não a esquecerão
Muitas e muitos mudaram suas vidas por sua causa
Guardarei comigo recordações preciosas.

O primeiro dia em que nos encontramos.
A jovem que voltava de Paris com um vivo interesse nos estereótipos sexuais nos livros infantis.
Nossa afinidade imediata com uma causa comum.
A seriedade ao considerar nosso convite para se juntar à Carlos Chagas.

O trabalho da bibliografia anotada.
O senso de humor ao lidar com os egos
O rigor na metodologia
A disciplina na execução.

A ida a Brasília para inaugurar a CPI da Mulher
O deslumbramento de encontrar Nelson Carneiro nos esperando no aeroporto
O quarto compartido no Hotel Nacional onde dividimos ansiedades e esperanças
A enorme responsabilidade enfrentada com competência e segurança.

Nossos caminhos se separaram,
mas nos encontramos várias vezes
Em diversos pedaços do mundo
Onde compartilhamos interesses comuns
Paixão pela mudança social, e claro
Mas também: boa comida,
Boa literatura, boa vida.

Sofro sua ausência
Mas prezo muito
A presença da sua memória.

Por Carmen Barroso

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