Por que contratar gays – e mulheres e negros – é bom para os negócios

08 de maio, 2017

No último sábado, 6, cerca de 300 jovens deixaram de lado a folga para passar um dia todo falando de trabalho. Mais especificamente, sobre como ser gay, lésbica ou transgênero e conquistar espaço no mundo profissional sem ter que se esconder.

(O Estado de S. Paulo, 08/05/2017 – Acesse o site de origem)

Organizado pela organização americana Reaching Out e trazido ao Brasil pela consultoria McKinsey, o evento tem palestras com profissionais LGBT e uma feira de recrutamento. Assim, além de ouvir a experiência de outros, os jovens entram em contato com empresas interessadas em contratá-los.

Neste ano, em sua terceira edição, a conferência teve 12 patrocinadores – e uma novidade. Entre as várias multinacionais – Bain & Company, Microsoft, AmBev, AT Kearney, The Boston Consulting Group, Goldman Sachs, IBM, JP Morgan, Dow e SAP -, um escritório de advocacia com atuação nacional, o Mattos Filho. Será que as empresas nacionais estão aprendendo a ver o valor da diversidade?

Diversidade no trabalho traz lucro. Foto: Adam Przewoski

Assim como as mulheres e os negros, as pessoas LGBT estão sub-representadas nos cargos de chefia nas empresas. E, embora muita gente não pareça preocupada com isso – basta ver que homens brancos heterossexuais ainda são maioria esmagadora em cargos de diretoria e conselhos de administração nas empresas brasileiras -, várias pesquisas vêm mostrando o valor da diversidade para os negócios.

Um estudo da McKinsey, por exemplo, mostrou correlação entre diversidade na liderança e melhores resultados financeiros. As empresas com maior diversidade de gênero tinham, em média, 15% a mais de chance de ter resultados acima da média para o setor. Nas com maior diversidade racial, essa chance subia para 35%. Já as companhias com menor diversidade tinham menos probabilidade de ter um desempenho acima da média.

“Ter funcionários diversos ajuda a lidar com tarefas e públicos diversos”, afirma Heloisa Callegaro, sócia da McKinsey. “Times formados por pessoas diferentes funcionam melhor e também representam melhor a sociedade onde as empresas fazem seus negócios”. Heloisa lidera a iniciativa de recrutamento de mulheres na América Latina e é coautora de estudos sobre a importância da diversidade de gênero para as empresas.

Um dos resultados mostra, por exemplo, que, na América Latina, uma participação maior das mulheres nas posições executivas leva a uma valorização 44% maior das ações da empresa. É uma constatação parecida com o que encontraram na Europa.

Segundo dados da consultoria, se as mulheres participassem da economia do mesmo modo que os homens, o PIB anual do mundo poderia ficar US$ 28 trilhões maior até 2025 – um acréscimo de 26% acima do esperado. É como se o mundo ganhasse uma produção do tamanho das economias de Estados Unidos e China, só para dar uma ideia.

Num país em recessão, como o Brasil, é ainda mais importante olhar para esse potencial. Segundo o estudo da McKinsey, melhorar um pouco a participação das mulheres na economia poderia fazer o PIB da América Latina crescer 10 pontos porcentuais acima das atuais estimativas. Seria ótimo, não é mesmo?

Para Heloisa, o debate sobre a inclusão das mulheres é o mais avançado no Brasil, e a inclusão do público LGBTQ também tem caminhado, mas ainda precisamos trabalhar muito pela inclusão racial. Talvez o País esteja tão atrás porque reluta em assumir o problema do racismo.

Embora nem sempre a inclusão de grupos caminhe na mesma velocidade, os avanços de um podem ajudar os outros. “A diversidade muda a cultura da empresa, ataca os preconceitos velados. E, mesmo que o trabalho esteja focado em promover um grupo, outras minorias podem se beneficiar, porque essa ação muda a cultura que era predominante”, diz Brian Rolfes. Sócio da McKinsey e diretor global de recrutamento, ele lidera a iniciativa voltada a profissionais LGBTQ. Foi dele uma das palestras aos jovens no sábado.

“Como o objetivo da empresa é recrutar, desenvolver e reter os melhores talentos do mercado, ter uma cultura que espanta uma parte desses talentos é prejudicial”, diz Brian. “Aqueles que nunca saem do armário têm 75% mais chances de abandonar seus empregos”. Poder ser quem se é em todos os lugares aumenta a satisfação e, claro, a produtividade. Mas isso ainda não é a regra no Brasil. Segundo uma pesquisa divulgada no ano passado pelo Center for Talent Innovation, 61% dos profissionais LGBT brasileiros não se assumem no trabalho.

Na McKinsey, desde que a empresa decidiu promover a diversidade de orientação sexual, o número de pessoas abertamente gays, lésbicas e transgêneros quintuplicou – são cerca de 500 hoje. E mais de 2000 os chamados “aliados”, funcionários interessados em trabalhar pela causa e treinados para apoiar esse público.

“Uma vez eu estava em uma conferência da empresa e um grupo de funcionários começou a fazer comentários sobre gays. Eles não sabiam que eu era gay. Eu não queria interrompê-los, porque o clima ficaria chato, mas um aliado encerrou a conversa. Perguntaram se ele concordava com os comentários. Ele, hétero, pai de três filhos, disse que não. E ainda completou: ‘Na verdade, me incomoda que vocês estejam fazendo esse tipo de comentário’.” Quem conta a história é Rafael Felippe, gerente de engajamento da McKinsey e responsável por trazer o Reaching Out ao Brasil.

Claro que qualquer pessoa não preconceituosa poderia ter feito o mesmo por Rafael. Mas o fato de a empresa treinar os funcionários para identificar preconceitos, velados ou não, e promover aliados pode melhorar o ambiente de trabalho para as minorias.

Heloisa conta que também já houve cliente que reclamasse de receber uma equipe liderada por uma mulher. “A empresa disse, então, que essa era a pessoa certa para comandar o trabalho. Se eles quisessem, ficaríamos felizes. Mas não mudaríamos a equipe só porque era uma mulher.”
“Às vezes, o trabalho nesse cliente resistente é bem-sucedido justamente porque foi liderado por uma mulher. Isso pode mudar a cultura da empresa e abri-la para um grupo que representa 52% da população mundial”, afirma Brian.

Mulheres, negros, LGBTQ, somos, juntos, uma maioria. Uma maioria capaz de lidar com realidades diferentes e ajudar, junto com os homens brancos héteros de sempre, a encontrar melhores saídas para os problemas. É o que os números mostram. Será que um dia o bolso falará mais alto do que o preconceito?

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