Discurso de artistas populariza bandeiras de movimento feminista

21 de março, 2015

(Correio Braziliense, 21/03/2015) Apesar das conquistas, as mulheres ainda esbarram em limitações restritas ao gênero, como a dupla jornada de trabalho

As cantoras Pitty, Valesca Popuzuda e Beyoncé seguem caminhos distintos musicalmente. Também é difícil traçar, à primeira vista, semelhanças profissionais entre as atrizes Patricia Arquette, Emma Watson e Luana Piovani. No entanto, todas elas, em diferentes momentos, empunharam a bandeira feminista. Seja em cima dos palcos, seja fora deles.

Leia mais: O que significa ser feminista nos dias de hoje? (TV UOL, 23/03/2015)

Elas não são as únicas artistas a ressuscitar o feminismo na música, no cinema e no mercado editorial. Algumas, como a funkeira Valesca Popozuda, diferem-se do estereótipo de ativista e dão nova forma à causa. “Essa é a lógica dos movimentos, se reiventarem a cada nova geração”, explica a antropóloga Débora Diniz, professora da UnB e pesquisadora da Anis — Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero. De acordo com ela, um caminho para o feminismo se tornar popular e atingir seus objetivos é fazer-se mais acessível, “não falar a linguagem das entendidas, de quem já faz parte do movimento”, exemplifica a especialista.

Segundo Débora, declarações como a da cantora escocesa Annie Lennox, que acusou Beyoncé de usar o feminismo para se promover, provocam debates de pouca importância. “Beyoncé tem uma postura antirracista evidente. O alcance que suas mensagens podem ter é impressionante. Se isso também é uma forma de se promover, parece menos importante”, comenta.

Obviamente, a situação feminina já não é a mesma dos primórdios do movimento, no século 18. As mulheres já podem sair de casa desacompanhadas. Podem votar. Escolher o parceiro e, se nada der certo, pedir o divórcio. No entanto, apesar dessas conquistas, ainda esbarram em limitações restritas ao gênero, como a dupla jornada de trabalho.

Adesão masculina

A ideia de que os homens também deveriam engrossar a lista de pessoas favoráveis ao feminismo foi defendida pela atriz Emma Watson, conhecida pelo papel de Hermione na saga Harry Potter. Ela foi a porta-voz da campanha Heforshe (Ele por ela, em tradução literal), comandada pela ONU para convidar homens a aderir ao movimento. 

“Minhas pesquisas recentes mostraram que feminismo virou uma palavra não muito popular. Aparentemente, estou entre as mulheres que são vistas como muito fortes, agressivas, anti-homens, não atraentes”, afirmou a atriz. “Precisamos mobilizar tantos homens e garotos o quanto possível para a mudança. Queremos tentar e ter certeza que é tangível”, completou.

Carlos Vieira/CB/D.A Press

Ministra Eleonora Menicucci participou da segunda onda do feminismo brasileiro, a partir de 1975, e avalia, as transformações recentes do movimento (Foto: Carlos Vieira/CB/D.A Press)

Cinco perguntas // Eleonora Menicucci, ministra-chefe da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM)

A senhora acredita estar havendo uma renovação no movimento feminista?
Acredito na renovação, mas na perspectiva geracional. As jovens e adolescentes têm se percebido como feministas e passam a ter esses temas como delas, como algo pertencente a elas também. É fundamental para que as ideias feministas possam permanecer a cada geração. Hoje, com parte da população brasileira envelhecendo, as feministas também entraram nessa faixa etária, algumas já passam dos 60, 70 anos. Ter a adesão de pessoas mais novas lutando contra a ditadura da magreza, por exemplo, é muito importante. As mulheres têm direito a viver a vida como quiserem.

O que pensa sobre temas feministas sendo debatidos por personalidades, como a cantora Beyoncé e atriz Patricia Arquette?
Esses temas só sairão do reduto feminista e do foco de políticas públicas quando toda a sociedade se comprometer com eles. Nós somos 52% por cento da população brasileira, e mãe da outra metade. Essas questões não podem ficar confinadas em um pequeno grupo de mulheres. Temos feito tudo para avançar na quebra do preconceito, dos estereótipos, da discriminação, na tolerância zero. Acredito que todas essas atrizes e cantoras que se posicionaram o fizeram com muita convicção, e não em busca de marketing ou de autopromoção. Elas deram uma contribuição enorme. Acredito na capilaridade, na renovação e na inclusão de mulheres e nos homens nas pautas feministas.

Qual a importância dos homens estarem inseridos nesse debate?
A inclusão de homens no debate é essencial, eles não podem ficar só assistindo essa mudança de valores, e sim com elas. Tê-los como parceiros, por exemplo, na briga por salários iguais para pessoas que ocupam o mesmo cargo, é fundamental. Uma mulher feliz e vivendo sem violência transforma as famílias e a sociedade, e passamos a ter uma democracia mais forte.

A senhora se declara a favor da legalização do aborto, uma das causas mais importantes discutidas pelo feminismo?
O aborto é um assunto que tem que ser mais discutido pela sociedade, e não continuar sendo pauta apenas das feministas. Sou favorável a garantia dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.

Quais as posições que o feminismo precisa marcar hoje? Em qual esfera a Secretaria tem atuado com mais afinco?
Temos atuado com mais afinco no enfrentamento a violência, universalizando o acesso ao disque 180, inaugurando a Casa da Mulher Brasileira (teremos nove somente esse ano), temos ônibus e barcos percorrendo áreas rurais para atender mulheres vítimas de agressões. Além disso, estamos atuando em prol da autonomia econômica, formulando políticas públicas para a entrada de mais mulheres no mercado de trabalho. Em nosso governo, o primeiro onde uma mulher foi eleita e assumiu o poder, celebramos dados como 68% de mulheres que compõem o Pronatec, entre outros avanços.

E esse ano temos uma meta: uma reforma política inclusiva na perspectiva de gênero. Queremos listas partidárias com homens e mulheres, buscamos a participação delas nas mesas diretoras do Parlamento. Pleiteamos uma reforma representativa e participativa para todos

Adriana Izel e Rebeca Oliveira

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