Tipo de parto não influencia a vida sexual da mulher, diz estudo

23 de abril, 2015

(Folha de S. Paulo, 23/04/2015) O tipo de parto influencia na sexualidade da mulher após o nascimento do bebê? Um novo estudo da USP que acompanhou 831 mães por quase dois anos diz que não.

O trabalho avaliou partos normais (com ou sem cortes) e cesáreas e derruba o mito de que, por preservar a região genital, a cesariana favorece a retomada da vida sexual.

“No Brasil é comum essa conversa de que o parto normal estraga o ‘playground’ do marido. A pesquisa mostra que a cesárea não traz nenhuma vantagem, não traz nenhuma proteção”, afirma a médica Simone Diniz, professora do departamento de saúde materno-infantil da USP.

O estudo, publicado no periódico “Journal of Sexual Medicine”, também gerou controvérsias entre as ativistas do parto humanizado ao apontar que a episiotomia (corte na região que fica entre a vagina e o ânus) não traz impacto à sexualidade.

“Mulheres submetidas a episiotomias relatam dor por anos. É difícil pensar em uma vida sexual plena sentindo dor”, afirma a obstetriz Ana Cristina Duarte, coordenadora do Gama (Grupo de Apoio à Maternidade Ativa).

Para o ginecologista Alexandre Faisal-Cury, pesquisador do Departamento de Saúde Preventiva da USP e autor principal do estudo, a episiotomia pode trazer algum impacto logo após o parto, mas isso tende a melhorar após os seis meses –as mulheres foram avaliadas entre seis e 18 meses após o parto.

A mesma opinião tem o médico obstetra Jorge Kuhn, defensor do parto normal sem episiotomia. “Após os seis meses, a maioria já se recuperou [da episiotomia]. Mas há casos em que a dor pode persistir por anos”, afirma.

Isso depende, entre outros fatores, do tipo de corte sofrido durante o parto. Os que envolvem lacerações profundas da musculatura vaginal ou que atingem a região anal tendem a ter uma recuperação mais difícil.

LIMITAÇÕES

As mulheres que participaram da pesquisa tiveram seus filhos na rede pública de saúde de São Paulo. Tinham 25 anos, em média. As entrevistas aconteceram antes do parto e ao longo de 18 meses após o nascimento do bebê.

Quase um terço das entrevistadas (32%) foi submetida a cesáreas. Entre as que tiveram parto normal, 16% passaram por episiotomias.

Até três meses depois de o bebê nascer, só uma a cada cinco entrevistadas tinha retomado a vida sexual. “É perfeitamente normal haver um declínio nesse período, é uma fase de ajuste na vida do casal”, afirma Faisal.

Depois dos seis meses, 87% das mulheres relataram desejo sexual, mas 21% se queixaram de que ele era inferior ao que sentiam antes da gravidez.

Para a psiquiatra Carmita Abdo, coordenadora do Projeto Sexualidade, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, a queixa é comum. “A libido, o afeto e a atenção da mulher ficam direcionadas para o bebê.”

Para o autor da pesquisa, tanto o desejo quanto o prazer feminino após a maternidade podem ser influenciados por outros fatores, como imagem corporal, saúde mental e situação do casamento.

O trabalho tem algumas limitações, como não ter questionado sobre a sexualidade antes da gravidez. “Se elas já tinham uma vida sexual ruim antes, continuará ruim depois do bebê”, pondera Carmita

Também há a hipótese de que muitas mulheres não se sintam confortáveis em falar de sexo, o que comprometeria os resultados. “Sexualidade ainda é tabu”, diz Kuhn.

Cláudia Collucci

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