Mulheres, não há nada de errado com as nossas vaginas, por Jenavieve Hatch

17 de maio, 2016

(HuffPost Brasil, 17/05/2016) De forma assustadora, atualmente, muitas mulheres jovens têm a impressão de que precisam modificar cirurgicamente os lábios vaginais.

Em fevereiro de 2014, a Sociedade Americana de Cirurgia Plástica Estética reportou que os procedimentos de labioplastia vaginal aumentaram uns 44 porcento nesse ano.

“Eu acredito que o aumento dramático nesses procedimentos é indicativo de tendências globais bem complexas que dizem respeito sobre a imagem corporal, um conceito de beleza que está evoluindo sempre e sobre a autoconfiança”, disse Michael Edwards, que cumpre o papel de presidente eleito na Sociedade Americana de Cirurgia Plástica Estética, em um relatório.

E o desejo de fazer essa operação continua aumentando. Em abril, o New York Times relatou que “400 garotas de 18 anos ou mais tiveram labioplastia no ano passado, um aumento de 80 porcento das 222 garotas que tiveram cirurgia estética vaginal em 2014”.

No mês passado, o Congresso Americano de Obstetras e Ginecologistas lançaram recomendações oficiais para os profissionais de saúde sobre como falar com os pacientes que perguntam sobre o procedimento, devido a frequência dos pedidos.

Muitas respostas sobre o tema foram escritas —noThe Guardian, Jessica Valenti argumentou que a necessidade de lábioplastia se originou nas pressões sociais profundamente enraizadas para que as mulheres sejam perfeitas.

“Apesar de todo o progresso feminino já feito”, escreveu a jornalista, “ainda existe uma quantidade chocante de desprezo com a anatomia feminina quando não é firme, arrumada, ajeitada e depilada”.

Como mulher e feminista com uma imagem positiva do corpo, eu concordo. E não consigo evitar pensar sobre a minha própria experiência.

Minha mãe me deu à luz no hospital Naval em Portsmouth, Virginia. Para as esposas de marinheiros, como minha mãe, o nascimento de uma criança não era considerado emergência e por isso as mulheres não tinham um obstetra.

Eu tive que nascer nas mãos de quem estivesse ali no dia. Infelizmente para minha mãe e para mim, o homem que trabalhava lá esse dia era um babaca. Eu fui seu primeiro nascimento e sendo a terceira de minha mãe, sai rápido.

Ao começar o trabalho de parto, o jovem doutor disse a minha mãe “PARE!” — dica profissional: não é assim que o trabalho de parto funciona — e, ao nascer, ele disse que eu era menino. Minha avó, ficou atordoada pois antecipava uma netinha, fazendo inclusive questão de marcar presença no hospital, e quase desmaiou.

Mas então ele me levou e uma enfermeira imediatamente o corrigiu. O babaca que fez o parto, é claro, errou. Minha lábia estava inchada, apenas.

Essa é uma história engraçada contada pela família. Uma que tem se repetido várias vezes no meu aniversário. Mas por muitos anos, essa história também me arrepiava. Eu passei boa parte da minha infância e adolescência me perguntando se havia algo de errado comigo— meus lábios genitais, vulva e vagina.

Todas as mulheres enfrentam um verdadeiro ataque de expectativas irrealistas sobre seus corpos basicamente desde o nascimento e eu não fui exceção.

Como a maioria das minhas amigas adolescentes, perdi muito tempo comparando meu corpo — inclusive a “anatomia da mulher” — com figuras femininas que representavam “beleza|” na nossa cultura naquele momento.

Quando eu conseguia dar uma espiada nas edições da Playboy dos meus pais— uma revista que destacava o suposto auge do que era a atração feminina — o que eu via eram mulheres que estavam depiladas (e com cabelos brilhantes e ondulados), oleosas e bronzeadas.

Eu não era nenhuma dessas coisas. Eu tinha cabelo crespo, cabeluda e tinha a certeza de que era um desastre físico. (Aos 13 anos, quem não se sente um desastre?) Mas até em meus piores momentos, nunca passou pela minha cabeça que eu precisava modificar uma parte dos meus órgãos sexuais.

Mas para muitas mulheres jovens de hoje, isso parece ser algo que está ocorrendo com elas. Roni Caryn Rabin escreveu o seguinte no The New York Times recentemente:

Para adultos, o procedimento é comercializado como “rejuvenescedor vaginal”, apertando os músculos internos e externos da vagina, o que frequentemente dá o formato dos lábios genitais; é direcionado às mulheres mais velhas e às mulheres que já deram à luz

Mas os ginecologistas que cuidam das adolescentes dizem que recebem pedidos todas as semanas de pacientes que querem cirurgia para seus pequenos lábios, em sua maioria por motivos estéticos, mas ocasionalmente por razões funcionais, tais como aliviar desconforto.

Não é necessariamente uma surpresa que muitas jovens estejam procurando esse tipo de procedimento e que o termo “rejuvenescimento vaginal” exista — o segundo termo mais procurado em vídeos pornôs no site PornHub está na palavra-chave “Teen” (“Adolescentes”) e mulheres depiladas e em forma, sem pelos nem covinhas fora de lugar, estão enriquecendo ao promover chás detox para emagrecer nas suas contas no Instagram — contas essas que são seguidas literalmente por milhares de mulheres jovens.

Os ideais de beleza oficialmente transcenderam os cabelos, a pele e o peso corporal. Nós estamos em um ponto onde até as partes mais íntimas precisam de reparo.

Embora campanhas recentes como a da Dove Love YourHair (“Ame seu cabelo”)e os comerciais de Aerie sem retoques certamente têm como objetivo diversificar os padrões de beleza, claramente não é suficiente para fazer com que as jovens mulheres sintam que seus corpos — e, portanto, elas mesmas — sejam adequadas e merecedoras.

Diante da pressão social para sermos “perfeitas” o aparentemente simples ato de autoaceitação pode parecer revolucionário. Excitante, até. Nós todas deveríamos tentar.

Acesse no site de origem: Mulheres, não há nada de errado com as nossas vaginas (HuffPost Brasil, 17/05/2016)

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