28/05/2011 – Fim da impunidade, por Rosiska Darcy de Oliveira (Globo)

28 de maio, 2011

(O Globo) Pimenta Neves ficou onze anos em liberdade até ser condenado pelo assassinato da jornalista Sandra Gomide. Dominique Strauss-Kahn conseguiu sair da cadeia depois de pagar um milhão de dólares de fiança e mais cinco milhões de garantia contra a possível fuga da prisão domiciliar. Para a escritora Rosiska Darcy de Oliveira, os dois são exemplos para desmoralizar qualquer sistema judiciário.

“Quando do crime de Pimenta Neves, como agora no caso DSK, os refletores iluminaram a tragédia do homem todo-poderoso que põe a vida a perder. No episódio brasileiro, Sandra Gomide, que perdeu a vida com duas balas nas costas, ficou fora de foco. Já a Promotoria de Nova York descreveu em detalhes, apoiada em indícios e testemunhos, uma africana apavorada, trêmula, escondida atrás de um armário, vomitando e balbuciando que tinha sido violada pelo cliente da suíte 2806, que ela não sabia sequer quem era.”

“A arrogância do poder tem o poder de cegar. Pimenta e DSK têm em comum a cegueira que não lhes permite entender que os tempos são outros, que já não se viola e mata uma mulher impunemente. Nem um nem outro são desinformados. Um dirigiu o mais tradicional jornal de São Paulo. O outro se preparava para lançar sua candidatura à Presidência da França pelo Partido Socialista que, há mais de quarenta anos, se bate pela dignidade das francesas.”

“Amarrar um frango antes de colocá-lo no forno para assar”

“Comentando o caso Strauss-Kahn, o ex-ministro da cultura Jacques Lang deu de ombros: “Afinal, não morreu ninguém.” Jean-François Kahn, ex-diretor da revista de esquerda “Marianne”, alegou que não se tratava de um caso de estupro, mas de um “simples troussage de domestique”. Quem leu Emile Zola conhece a expressão que, no sentido literal, quer dizer amarrar um frango antes de colocá-lo no forno para assar. No sentido figurado, é o que ainda hoje pode acontecer, mundo afora, com domésticas ou camareiras.”
“Os valores mudaram dos tempos de Zola até hoje. Não há mais lugar para a cumplicidade, ainda que surda ou irônica, com a brutalidade. A desqualificação das mulheres como coisas, no entanto, conservou-se intacta no espírito de certos homens. Pior para eles.”

“Para além das tragédias pessoais, outra lição: a Justiça que nada tem de cega e está longe de ser igual para todos reflete como um espelho os precários equilíbrios da sociedade mas, na sua desequilibrada balança, o poder das mulheres está pesando cada vez mais.”


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