Exames de zika para grávidas e bebês estão prontos para uso, mas ainda indisponíveis no SUS

13 de outubro, 2016

País mais afetado pela epidemia de zika, Brasil está atrasado na oferta de testes

Dois testes do tipo sorológico para zika – que pode ser feito em qualquer momento e indicar há quanto tempo a pessoa foi infectada – já foram avaliados pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) e apresentaram bons resultados em termos de precisão, tanto em sensibilidade quanto especificidade.

Os testes – o rápido e o ELISA (do inglês Enzyme-Linked Immunosorbent Assay, ou ensaio de imunoabsorção), da Bahiafarma e da Euroimmun, respectivamente – já haviam sido aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Em comunicado, a estatal Bahiafarma informou sobre o resultado obtido por seu teste – o primeiro para detecção de infecção por zika vírus a obter registro na Anvisa, em maio de 2016: “O kit diagnóstico Zika IgG / IgM Combo da Bahiafarma foi avaliado pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) e registrou índices de 97% de sensibilidade e 96% de especificidade para infecções recentes (IgM) e de 100% de sensibilidade e 98% de especificidade para infecções mais antigas (IgG).”

Em entrevista à Agência Patrícia Galvão, Gustavo Janaudis, diretor da provedora de soluções para diagnóstico Euroimmun, informou que o INCQS também testou seu teste sorológico para zika, que utiliza a metodologia ELISA, e que os índices registrados são altos, mas preferiu não falar em percentuais, por acreditar que cabe ao INCQS apresentar os números. “A Organização Mundial da Saúde aponta números próximos de 100% de sensibilidade e especificidade”, declarou Janaudis à reportagem.

Gestantes e bebês continuam à espera dos testes

Os testes sorológicos são especialmente importantes para as mulheres gestantes e para bebês nascidos em áreas de zika epidêmica ou no caso de suspeita de infecção pelo vírus na mãe – mesmo quando o perímetro cefálico é considerado dentro dos padrões normais para o período gestacional/idade.

Diferentemente dos testes PCR, hoje os únicos disponíveis no Sistema Único de Saúde, os testes sorológicos identificam anticorpos e não o vírus. Assim, mesmo que a pessoa infectada já esteja livre do vírus zika no sangue, ainda é possível identificar se houve contágio e estimar se ocorreu no curto ou médio prazos. Este fator é muito relevante no caso do vírus zika porque se estima que entre 70% e 80% dos casos são assintomáticos. Assim, apenas o exame sorológico pode dar alguma segurança para mulheres que querem engravidar ou estejam grávidas. Além disso, os bebês só podem ser testados com o método sorológico, uma vez que é pouco provável que a contaminação congênita tenha ocorrido em menos de sete dias antes do parto.

País mais afetado pela epidemia de zika, Brasil está atrasado na oferta de testes

Apesar da situação de urgência de saúde pública nacional em decorrência da relação entre a infecção por zika e a má formação em fetos, o Brasil ainda não comprou nenhum dos dois tipos de exames sorológicos já avaliados. Segundo a Euroimmun, no início de outubro as Forças Armadas abriram ata de registro de preços e uma secretaria estadual de saúde também o fez. A ata de registro de preços permite que o Estado possa comprar determinado insumo pelo menor preço registrado, até quando melhor convier aos órgãos que integram a ata.

Consultado sobre quando o exame sorológico estará disponível na rede pública, o Ministério da Saúde informou por e-mail que “está viabilizando a compra dos testes de Zika neste momento e, assim que tivermos mais informações divulgaremos para a imprensa”. É importante lembrar que os exames sorológicos já são de cobertura obrigatória nos planos de saúde, por determinação da Agência Nacional de Saúde (ANS), desde julho deste ano.

Ainda no final do ano passado, o governador de São Paulo Geraldo Alckmin prometeu em propaganda divulgada pela TV que o Estado seria o primeiro a disponibilizar o exame de zika para grávidas. Questionado pela Agência Patrícia Galvão, a assessoria de comunicação do Governo declarou desconhecer que há testes já aprovados e reafirmou o posicionamento de que aguarda os testes dos exames.

México, França, Espanha, Alemanha e EUA já adquiriram testes

De acordo com a Euroimmun, os testes sorológicos comercializados pela empresa já foram adquiridos pelos governos de alguns países, entre eles México, França, Espanha e Alemanha. Os Estados Unidos adquiriram o produto de forma emergencial.

O último Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde informa que foram registrados 196.976 casos prováveis de febre pelo vírus Zika no país, distribuídos em 2.277 municípios, tendo sido confirmados 101.851 casos, desde janeiro até a primeira quinzena de agosto de 2016. Em relação às gestantes, foram registrados 16.264 casos prováveis, sendo 8.904 confirmados por critério clínico-epidemiológico ou laboratorial.

Mais de 3 mil casos de bebês notificados ainda aguardam testes

Até 25 de junho de 2016, 8.165 casos foram notificados, segundo as definições do Protocolo de Vigilância (recém-nascido, natimorto, abortamento ou feto). Desses, 3.061 (37,5%) casos permanecem em investigação e 5.104 casos foram investigados e classificados, sendo 1.638 confirmados para microcefalia e/ou alteração do SNC (sistema nervoso central) sugestivos de infecção congênita e 3.466 descartados.

A disponibilidade do teste sorológico no sistema público de saúde poderia agilizar o diagnóstico dos mais de 3 mil casos de bebês notificados para microcefalia e cujas famílias ainda aguardam uma resposta. Além disso, pesquisas recentes mostram que há bebês nascendo com o vírus zika, mas sem evidências físicas claras. Para acompanhar e oferecer estimulação precoce a essas crianças, é fundamental a disponibilidade do teste sorológico.

Com a transmissão sexual, é urgente testar também os homens

De acordo com Edison Durigon, especialista em virologia clínica e molecular do Departamento de Microbiologia da Universidade de São Paulo (USP), pode haver muitos casos de bebês afetados pelo vírus zika que estão passando despercebidos. A preocupação cresce porque a grande maioria das pessoas não têm sintomas da infecção e as descobertas mais recentes indicam que a transmissão sexual é mais relevante do que havia se pensado inicialmente.

“Estamos acompanhando a doença em dois homens totalmente assintomáticos para zika mas que, passados meses após o pico da epidemia, ainda estão eliminando o vírus no esperma. E muitos médicos não estão alertando as grávidas sobre os cuidados que seus parceiros devem ter. Eles falam do repelente para elas, mas não para os homens. Também não se fala do preservativo”, afirma Durigon.

De acordo com o especialista, é necessário oferecer o teste sorológico para as grávidas uma vez por trimestre. Quando houver o positivo para zika, é preciso testar a criança assim que nascer. Todas as crianças com resultado positivo para o anticorpo precisam fazer ressonância e tomografia. “Aí sim teremos uma prevenção adequada em todo o país. Como está hoje, não dá para saber, apenas os casos mais evidentes são encaminhados para os exames de imagem. Não há condição de mandar todas as crianças para a tomografia e ressonância”, conclui Durigon, lembrando que com a retomada das altas temperaturas no país, o risco de a epidemia voltar é grande.

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