População negra é a que mais morre em decorrência da aids em São Paulo, afirmam especialistas

29 de outubro, 2016

“Essa não é uma vulnerabilidade biológica, mas social”, afirmou Eliana Gutierrez, coordenadora do Programa Municipal de DST/aids de São Paulo, durante o seminário HIV/Aids e Relações Étnicos Raciais, que aconteceu nesta sexta-feira (28), na Escola da Cidade, em São Paulo. A afirmação de Eliana foi citada de diferentes maneiras por todas as participantes da mesa. O que todas concordaram é que o racismo institucional e a falta de acesso aos serviços existe e precisa ser combatido.

(Agência Aids, 29/10/2016 – acesse no site de origem)

“Hoje, o risco de uma pessoa preta, infectada pelo HIV, morrer por aids é 2,4 vezes maior do que de uma pessoa branca”, disse Sara Romero, da Vigilância Epidemiológica do Estado de São Paulo. “Também, temos mais mulheres pardas sem acesso ou adesão ao tratamento do que brancas”, continuou.

De acordo com Sara, no estado de São Paulo, 21,5% das pessoas pretas soropositivas morreram em decorrência da aids, sem nunca ter iniciado o tratamento. “Para avaliar dados, nós não agrupamos pretos e pardos, a raça/cor é autodeclarada. Fazer essa junção também pode mascarar grandes diferenças”, explica.

Casos de aids

Na cidade de São Paulo, em 2015, a taxa de detecção de casos de aids, em cada 100 mil habitantes, foi de 21,4 em mulheres pretas; 13,4 em pardas; e 7,3 em brancas. No caso dos homens, esse número é de 51,8 em pretos; 40,6 em pardos; e 30,7 em brancos; conforme dados preliminares do Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), apresentados por Eliana.

A taxa de mortalidade por aids no município também apresenta uma grande disparidade. Ela é de 12,8 em pretos, 5,8 em pardos e 7,2 em brancos. “Epidemias como essa atingem as pessoas de maneiras diferentes, mas a população negra é mais afetada do que a branca. Não quero que mais pessoas brancas se infectem, mas quero discutir o motivo de que elas atingem mais aos negros. Essa é uma situação que exige mudança”, disse Eliana.

Conforme mostrou Margarete Lira, da coordenação de Epideomologia e Informação da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo, além da aids, as mortes por homicídios, doenças infecciosas e parasitarias, hipertensiva e cerebrovascular, também atingem prioritariamente aos negros.

No caso da tuberculose, por exemplo, a incidência de mortes é de 84,4 em pessoas pretas, 48,7 em pardas e 37,4 em brancos. A de sífilis congênita é de 6,2 em pretos, 6,3 em pardos e 4,7 em brancos, isso em cada mil habitantes.

“Esses resultados tornam evidente a relação entre condições sociais e categoria racial com a saúde. Reafirma que a categoria racial é um importante marcador de desigualdade”, afirma Lira. “Esses números revelam que se as ações de prevenção estão acontecendo, elas não estão no caminho certo. Pois não chegam a toda população do mesmo jeito. Isso levanta questionamentos a respeito da categoria social, escolaridade e o racismo institucional”, disse Sara Romero.

Conhecimento

Por meio de dados como esses, segundo Eliana, o município procurou saber se a falta de conhecimento a respeito das tecnologias de prevenção e serviços de saúde também eram fatores responsáveis por essa realidade. No entanto, uma ampla Pecap (Pesquisa de Conhecimento, Atitudes e Práticas) mostrou que ambos têm conhecimento sobre a importância do uso da camisinha. Porém, a maioria da população branca pode comprar o insumo na farmácia. Já os pretos e pardos procuram nos serviços de saúde do SUS (Sistema Único de Saúde).

“Isso nos ajuda a repensar se a oferta está acontecendo da mesma forma para todo mundo, se o tratamento é o mesmo. Quais fatores repelem e quais aproximam as pessoas dos serviços de saúde? Se a Secretaria não consegue chegar a toda a população, temos que mudar. Esses resultados nos envergonham”, afirmou Eliana.

Edna Muniz, do Centro de Estudos e Relações do Trabalho e Desigualdades (CEERT), afirmou que no Brasil o racismo institucional acontece em todos os setores, inclusive na saúde. “No país somos 51% da população. Deve se prestar mais atenção nesses dados para uma ação. Fica aí uma tarefa para que seja cumprida”.

O seminário HIV/Aids e Relações Étnicos Raciais foi realizado pelo Programa Municipal de DST/aids de São Paulo.

Daiane Bomfim

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