Relatores da ONU: negar aborto legal a mulheres com zika é tortura

03 de novembro, 2016

Parecer foi enviado ao Supremo Tribunal Federal que julgará ação sobre o caso

(O Globo, 02/11/2016 – Acesse no site de origem)

ultrassom zika

Relatores especiais do Conselho de Direitos Humanos da ONU defendem, no Supremo Tribunal Federal (STF), que negar o aborto legal a mulheres infectadas pelo vírus zika, e que desejam interromper a gravidez, pode ser uma forma de tortura. A manifestação inédita, que consta de parecer encaminhado à Corte, partiu de quatro representantes das Nações Unidas, que se pronunciam de forma independente da entidade.

O documento deverá integrar a ação direta de inconstitucionalidade ajuizada em agosto pela Associação Nacional de Defensores Públicos, sobre direitos das mulheres em meio à epidemia de zika. Entre eles, está o acesso ao aborto seguro e dentro da lei. A manifestação dos relatores é o conteúdo principal do pedido do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (Anis), que pretende ingressar no processo para auxiliar o tribunal.

No parecer, os relatores defendem que “o sofrimento mental que mulheres e meninas podem enfrentar quando desejam interromper uma gravidez, incluindo o contexto do zika, mas não têm acesso legal ao serviço, pode ser grave e pode atingir o nível de tortura e/ou tratamento cruel, desumano ou degradante”. Assinalam que a situação se torna mais crítica em mulheres “particularmente vulneráveis, em função de sua idade, status de deficiência, ou as circunstâncias de sua gravidez”.

Os relatores reuniram a jurisprudência internacional sobre o tema e detalharam a compreensão atual em relação à tortura. Explicam, por exemplo, que ela não ocorre apenas para extração de confissão ou para punir alguém. A discriminação também é fator motivador e, segundo o documento, pode estar especificamente baseada em gênero.

Endossam o parecer os representantes independentes do conselho Dubravka Simonovic, relatora especial sobre violência contra as mulheres; Dainius Puras, relator especial sobre o direito à saúde física e mental; Catalina Devandas-Aguilar, relatora especial sobre os direitos das pessoas com deficiência; e Juan Mendez, relator especial sobre tortura e tratamento ou castigo cruel, desumano e degradante. O mandato de Mendez terminou nesta semana.

Além dos quatro relatores especiais, também assinaram o documento Alda Facio, Emna Aouij, Kamala Chandrakirana, Frances Raday e Eleonora Zielinska, integrantes do grupo de trabalho sobre discriminação contra mulheres da ONU.

Para Sinara Gumieri, pesquisadora e advogada do Anis, a manifestação mostra a evolução dos conceitos de direitos humanos:

— Esse parecer é extremamente importante ao apontar que, quando a agressão ocorre no cenário de discriminação a um grupo, gênero ou raça específica, por exemplo, pode ser considerada tortura.

Em fevereiro deste ano, a ONU fez uma defesa enfática do direito ao aborto em caso de zika. O Alto Comissário de Direitos Humanos das Nações Unidas, Zeid Al Hussein, declarou que países afetados pelo vírus deveriam permitir às mulheres o acesso a métodos contraceptivos e ao aborto.

 

 

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