Mais de 50% das meninas já deixaram de praticar atividades por vergonha do próprio corpo

06 de outubro, 2017

“Pedi ajuda à minha mãe para perder peso.”

(HuffPost Brasil, 06/10/2017 – acesse no site de origem)

Mais de metade de todas as meninas do mundo (54%) não têm boa autoestima corporal, e muitas estão deixando passar oportunidades importantes na vida. A informação é de um novo estudo global.

Na pesquisa realizada pela Dove e à qual o HuffPost UK teve acesso exclusivo foram entrevistadas mais de 5.000 garotas com idades entre 10 e 17 anos, em 14 países.

A pesquisa revelou que possuir um nível mais elevado de autoestima corporal – definida como a avaliação que as pessoas fazem de sua própria aparência física – exerce impacto duradouro sobre a autoconfiança de uma menina, sua resiliência e sua satisfação com a vida na fase em que ingressa na idade adulta.

As meninas com baixa autoestima corporal revelam tendência maior a ceder diante das pressões de beleza e aparência e de se afastar de atividades fundamentais para a construção de uma vida sadia, como a convivência social, praticar esportes ou a participação em clubes.

A autoestima corporal das meninas no estudo foi avaliada com o uso da escala de Mendelson, composta de 18 afirmações.

Foi pedido às meninas que assinalassem quanto se identificavam com afirmações negativas, como “há muitas coisas que eu mudaria em minha aparência, se pudesse”, ou afirmações positivas, como “tenho orgulho de meu corpo”. A partir disso, receberam uma nota geral de “autoestima corporal”.

O estudo constatou que quase seis em cada dez meninas, em nível mundial, já evitaram praticar uma atividade devido à sua aparência. Essa porcentagem sobe para três quartos (75%) no caso de meninas russas e indonésias.

No Brasil, foi identificado que mais da metade das garotas (52%) não tem confiança corporal alta. Todas a meninas brasileiras (100%) com confiança corporal baixa evitam atividades importantes, tais como socializar com amigos e familiares, participar de atividades fora de casa e tentar fazer parte de times de esporte ou grupo de atividades, em comparação com apenas 4 em cada 10 (37%) meninas com confiança corporal elevada que exibem o mesmo comportamento.

A título de comparação, 53% das meninas britânicas já evitaram praticar uma atividade porque estão insatisfeitas com sua aparência. O Japão foi o país menos afetado: apenas 22% das meninas disseram a mesma coisa.

Louise*, que tem 17 anos e vive no sudeste da Inglaterra, disse ao HuffPost Reino Unido que a ansiedade em torno de sua aparência influi sobre seus hábitos sociais.

“Muitas vezes eu não saio de caso. Acho que outras pessoas vão odiar minha aparência, porque eu odeio”, ela disse.

“Falo que não posso sair para jantar e dou desculpas para não comer, porque não estou satisfeita com meu corpo naquele dia. Não quero me mostrar, não quero que outras pessoas me vejam porque vão pensar que estou gorda.”

Louise disse que a imagem unidimensional de beleza que vemos exposta na mídia contribui para a baixa autoestima sentida por meninas de sua idade e mais jovens.

“Muito disso tem a ver com as redes sociais e o jeito como pessoas tipo Kylie e Kendal Jenner são apresentadas como sendo ‘a beleza’ da sociedade, porque elas são tão magrinhas”, ela explicou.

“Todas as modelos que a gente vê são magérrimas. Então na nossa cabeça, e na minha cabeça, preciso ser magra porque elas são magras.”

Lamentavelmente, o caso de Louise não é singular. O estudo constatou que, em todo o mundo, cinco em cada dez meninas (55%) deixam de passar tempo com seus amigos e sua família, de participar de atividades fora de casa ou de tentar entrar em um time ou clube quando não estão satisfeitas com sua própria aparência.

Esse número sobe significativamente, chegando a oito em cada dez (80%) das meninas com baixa autoestima corporal, mas cai para quatro em cada dez (41%) entre as meninas com alta autoestima corporal.

O estudo também concluiu que, em comparação com as meninas que têm alto nível de autoestima corporal, as meninas com baixa autoestima corporal sentem pressão adicional para receber notas boas na escola, para se casarem e para nunca cometerem erros.

Abiee Harris tem 20 anos e é educadora no movimento de escoteiras. Ela contou que a autoimagem corporal era uma grande preocupação sua na adolescência e impactou sua vida escolar.

“Com 10 anos de idade, me lembro de ficar tão chateada com minha aparência quando eu me trocava para a aula de Educação Física que pedi à minha mãe para me ajudar a perder peso”, ela contou ao HuffPost Reino Unido.

“No colégio secundário, eu deixava de levantar a mão em sala de aula, caso estivesse com manchas de suor nas axilas. E às vezes deixava de usar roupas das quais gostava, porque eram justas demais.”

“Hoje, quando olho para trás, vejo que não havia nada de errado, mas mesmo assim aquele sentimento me freava. Hoje em dia sinto muita confiança em meu corpo, mas mesmo assim eu fraquejo um pouco, de vez em quando.”

Abiee Harris. (Foto: Reprodução)

Harris comentou que em seu trabalho com as escoteiras, ela ainda vê adolescentes tendo os mesmos problemas que ela tinha quando era mais jovem.

“Quando comando sessões com grupos de meninas no movimento de escoteiras, elas falam do ‘mito da imagem’. É assustador ver que todas as meninas falam da mesma ideia e da mesma visão. É aquilo que elas aspiram se tornar, e isso é triste de se ver”, ela comentou.

Embora as garotas demonstrem consciência crescente do papel da mídia na promoção de ideais de beleza inatingíveis, o estudo constatou que apenas as meninas com alta autoestima corporal parecem equipadas para resistir a essas pressões.

Oito em cada dez 78%) das meninas com boa autoestima corporal disseram que se consideram bonitas, mesmo que sejam diferentes do que veem na mídia. Apenas uma em cada dez (12%) das meninas com baixa autoestima corporal falou a mesma coisa.

Talvez não seja surpreendente que sete em cada dez (68%) das meninas ao todo tenham dito que gostariam que a mídia destacasse mulheres de atratividade física, idade, etnia, tamanhos e formas diferentes.

Apesar das pesquisas anteriores que sugeriram que mídias sociais baseadas em imagens, como o Instagram, podem estar tendo impacto negativo sobre a saúde mental dos jovens, o estudo da Dove sugere que as meninas podem estar usando as redes sociais para aumentar sua autoconfiança corporal.

O estudo revelou que as meninas vêm usando as redes sociais como plataforma para expressar sua individualidade com confiança; metade delas (51%) disseram que se sentem mais confiantes interagindo com as pessoas online.

Comentando os resultados, Jess Weiner, professora da Escola Annenberg de Jornalismo da Universidade do Sul da Califórnia (USC), disse: “As meninas em todo o mundo estão atrelando o poder das redes sociais para democratizar a narrativa da beleza, quer nós façamos parte disso ou não.

“Elas estão formando suas próprias comunidades online para falar das questões que mais afetam sua saúde física e emocional, inundando o espaço com seus relatos e imagens. Estão se tornado sujeitas de suas próprias histórias, e não objeto da história de outros.”

A Dra. Phillippa Diedrichs, professora assistente no Centro de Pesquisas da Aparência da University of West England, disse ao HuffPost Reino Unido que as conclusões do estudo da Dove não a surpreenderam.

“As constatações do estudo da Dove são confirmadas por pesquisas acadêmicas, que mostram as preocupações com imagem corporal impactando todas as áreas mais importantes da vida das meninas. Isso inclui sua saúde mental e física, sua vida social, educação e aspirações profissionais”, ela prosseguiu.

“Embora eu não esteja surpresa, me sinto motivada a acabar com isso. Existem medidas concretas que podemos tomar para combater essa questão, e não é hora de ficarmos inativos.”

Além de combater o bullying movido pela aparência, Diedrichs disse que precisamos prestar atenção às conversas que temos com mulheres e meninas que toquem no tema da aparência física.

“Comentários aparentemente inócuos, tipo ‘você está ótima, perdeu peso?’, ou ‘esse vestido lhe cai muito bem, deixa você super magrinha’, podem reforçar a pressão sobre as meninas para terem uma aparência determinada”, ela explicou.

“Ao nível da comunidade, podemos perguntar às escolas locais o que estão fazendo para promover a autoconfiança corporal e lhes indicar recursos baseados em evidências e que têm impactos mensuráveis após apenas algumas poucas aulas.”

O relatório também destacou algumas conclusões mais positivas.

O estudo constatou que oito em cada dez (82%) das meninas acham que há algo nelas que é belo e que quase todas (80%) se sentem mais autoconfiantes depois de fazer coisas que as deixam felizes com elas mesmas, seu corpo e sua saúde, como leitura ou exercícios físicos.

Sophie Galvani, vice-presidente global da Dove Masterbrand, disse que é animador ver as meninas conscientes e tomando suas próprias iniciativas para criar mudanças, mas que “elas não conseguem fazer isso sozinhas”.

“Nossa pesquisa mostra que uma menina de 17 anos tem chance maior de sentir menos felicidade e satisfação com a vida que uma menina de 10 anos”, ela disse em comunicado à imprensa.

“Esse é um momento crucial na vida de uma menina, quando não necessários apoio e intervenções pró-ativas, e é exatamente isso que o Projeto Dove de Autoestima foi criado para fazer. Seus workshops, ferramentas e intervenções comprovadamente ajudam a construir autoconfiança corporal positiva nos jovens e, em última análise, a ajudar a próxima geração a alcançar seu pleno potencial na vida.”

*O nome foi mudado para proteger o anonimato da entrevistada.

Foram entrevistadas para o estudo meninas de vários países do mundo, incluindo Índia, Estados Unidos, Reino Unido, Brasil, China, Japão, Turquia, Canadá, Alemanha, Rússia, México, África do Sul, Austrália e Indonésia.

De acordo com a Dove, os países foram escolhidos para representar adequadamente a diversidade de meninas em matéria de cultura, crenças, pressões sociais e desenvolvimento econômico, além de uma representação equitativa da diversidade cultural e das tradições ligadas à beleza. O objetivo foi que a amostra fosse amplamente representativa da população de meninas de cada país em termos de idade, região e estrato social.

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