Mulheres dizem porque são a favor da legalização do aborto

05 de dezembro, 2017

Mulheres foram às ruas em setembro e novembro contra a PEC 181/15 (PEC Cavalo de Tróia) por vê-la como uma ameaça ao direito ao aborto nos casos de gestação que apresenta risco de vida para a mulher, gravidez fruto de estupro e feto anencéfalo. Inicialmente, o projeto tratava apenas sobre a ampliação da licença-maternidade para prematuros, mas numa artimanha, ele passou a prever que a vida começa desde a concepção. Se a PEC 181/15 for aprovada com esse teor, o aborto pode ser totalmente criminalizado no Brasil.

(Revista Fórum, 05/12/2017 – acesse no site de origem)

Além das inúmeras mobilizações contra o avanço de retrocessos e em busca de avanços, como o #AlertaFeminista e a Virada Feminista Online, em março de 2017, PSOL e Anis entraram com o ADPF 442 em busca da descriminalização do aborto até a 12ª semana e já no fim de novembro, eles apresentaram uma liminar buscando a liberação do aborto no caso de Rebeca, mulher grávida há seis semanas. A liminar foi negada sem análise do mérito e Rebeca entrou com pedido de habeas corpus na justiça de SP.

A criminalização do aborto no Brasil está em discussão e muita gente sequer sabe o que pensar sobre o assunto. Por isso, reuni nesse texto falas de feministas a favor da legalização e contra a criminalização total do aborto no Brasil. Confira:

“Sou a favor da descriminalização do aborto e a favor da liberdade e humanização das mulheres. A favor do reconhecimento da potência e capacidade feminina na condução e decisão de suas vidas e corpos. Penso sempre no desespero e desamparo enfrentados por mulheres em todo o país, todos os dias, quando decidem abortar e não têm segurança para tal. Sou a favor da assistência física, psíquica, social e emocional de mulheres nestas condições. Penso e desejo que a construção e debate sobre este tema devem ter em seu cerne a palavra e o desejo feminino. E, jamais, o julgamento e moralismo dos homens. Pela vida das mulheres!” – Thaís Alves – Psicóloga, Especialista em Saúde Mental.

“Eu defendo que aborto não é crime e que deve ser legalizado. Precisa sair do código penal e ser tratado como decisão de foro íntimo das mulheres. Nós mulheres sabemos o peso e responsabilidade de colocar uma criança no mundo, por isso quando uma gravidez indesejada se instala a primeira coisa que fazemos é decidir se queremos e podemos ter filho naquele momento. Nos debatemos eticamente com esta decisão e quando decidimos por abortar a gestação é porque pensamos muito e avaliamos bem as circunstâncias. Não podemos ser castigadas, punidas, presas por esta decisão, porque é uma decisão responsável. Ao mesmo tempo, o aborto deve ser legalizado, para que cada mulher que precisar abortar tenha condições de fazê-lo ao início da gestação e em condições seguras. Um aborto até 12 semanas é mais simples que uma cesárea. Não tem porque se ter mortes ou sequelas por isso.” – Silvia Camurça é socióloga e educadora, integra a equipe do SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia.

“Sou a favor da legalização do aborto porque o corpo é da mulher e cabe a ela escolher. E porque chega de hipocrisia. Todo mundo conhece alguém que abortou. Vão querer jogar milhões de mulheres na prisão? Saiu uma pesquisa dizendo que 50% dos brasileiros querem que a mulher que abortou seja presa. Querem prender sua mãe, sua filha, sua irmã, sua esposa ou namorada? A mesma pesquisa revela que 48% dos homens entrevistados concorda com a frase “Eu jamais deixaria uma mulher interromper a gravidez de um filho meu”. O machismo e a hipocrisia na frase são evidentes. Há milhões de homens que não assumem a paternidade, milhões que não pagam pensão. Entre os que pagam pensão, há os que fazem apenas isso, mais nada. O ônus de criar o filho é todo da mulher. Enquanto continuamos com esse faz de conta, milhares de mulheres seguem sendo vítimas em abortos clandestinos. Vamos parar com esse sofrimento e essa culpabilização das mulheres.” – Lola Aronovich, professora da UFC e autora do blog Escreva Lola Escreva.

O aborto não deveria ser uma questão de opinião, nem de religião. E, sim, de direito. Direito à vida e a saúde das mulheres. Tema sensível que, até o momento, não conseguiu avançar no Brasil. Ainda não conseguimos descriminalizar e regulamentar o aborto como um direito das mulheres em todos os casos, não apenas nos casos de violência sexual, anencefalia, e risco à vida da mãe. Casos estes que, mesmo legalizados, ainda fazem com que muitas mulheres sofram opressões e violências morais por exercerem seus direitos de escolha e optarem pelo procedimento. Ao invés de avançarmos na compreensão de que o direito pátrio deveria, a exemplo de tantos países como Espanha, França, Estados Unidos, Uruguai, Itália e – até – a Tunísia, resguardar o direito de escolha das mulheres em relação ao próprio corpo, estamos dando passos largos em sentido contrário. A bancada fundamentalista avança em seu projeto de país pentecostal e, golpe atrás de golpe, não para de propor projetos de lei que restringem o direito ao aborto legal, e dificultam o acesso das mulheres à saúde. A recente PEC 181 é exemplo disso. Ao pretender resguardar o direito à vida desde a concepção, este projeto de emenda constitucional pretender dar resguardo jurídico aos embriões recém conceptos, em detrimento da saúde das mulheres. Ou seja, pretende impedir o aborto mesmo nos casos de violência sexual. Mesmo nos casos de anencefalia. Pretende dizer bem alto para as mulheres que seus corpos não valem nada perante o Estado, e que um embrião, que não possui personalidade jurídica nem formação biológica capaz de sentir, sofrer ou ter consciência, vale mais que a vida e a saúde da mulher que o gera, em seu útero, em seu corpo, em suas células. As mulheres abortam. Não pedimos a ninguém que mude sua opinião ou sua escolha no sentido contrário. Apenas pedimos respeito e direito de escolha, para que aquelas que decidem abortar, pelo motivo que for, não morram. é pela vida das mulheres!” – Silvia Badim, professora da UNB.

Através da análise de dados da pesquisa “Opiniões sobre aborto no Brasil”, conduzida pelo Instituto Locomotiva em parceria com a Agência Patrícia Galvão, é possível perceber que as opiniões sobre o aborto são contraditórias e variam muito. Quase metade dos entrevistados conhecem uma mulher que abortou, metade dos participantes da pesquisa acham que a mulher que aborta deve ser presa, enquanto apenas 7% alegam que denunciariam alguma pessoa próxima (amiga, prima, irmã, etc) que tivesse feito aborto voluntário. O estudo mostra que o verso “Hipocrisia, para desconhecida é punição, mas se for da família é só tratar com discrição”, cantado por Luana Hansen na música “Ventre Livre de fato”, fala muito da realidade brasileira. Quando o aborto é apresentado de maneira menos desumanizadora, tratando sobre as dores de pessoas que eles conhecem o rosto, a posição tende a ser mais flexível, o que expõe que apesar de alguns defenderem que aborto é uma questão prisional, na prática, a sociedade vê como algo de foro íntimo, algo que acontece.

Por isso, pedi para a Karoline Gomes, do Think Olga, falar sobre a campanha #PelaVidadeRebeca e o lançamento do minimanual de jornalismo sobre como abordar o tema do aborto na mídia, ações que tem o viés de humanizar o tema na comunicação.

“A experiência recente com a campanha #PelaVidadeRebeca, um descobramento da campanha #EuVouContar que desenvolvemos ao lado da Anis – Instituto Bioética, tem sido mais um reforço da importância da mídia ao divulgar notícias sobre aborto. Rebeca pediu na justiça o direito de interromper uma gravidez de forma segura e o aborto ainda é um assunto coberto de mitos, tabus e moralismos. Por isso, nesses casos, quaisquer palavras e declarações podem ser determinantes para inclinar a opinião pública a proteger ou a atacar uma mulher.  Compreendemos a dificuldade dos jornalistas em escrever sobre o assunto, mas isso não os isenta do compromisso e responsabilidade com as vítimas do aborto ilegal no Brasil e nossa missão como ONG de empoderamento feminino por meio da informação é justamente proteger as mulheres dessas publicações nocivas e educar a imprensa a respeitá-las. Logo, já tínhamos uma ferramenta importantíssima: o Minimanual de Jornalismo Humanizado. E, com apoio da Global Health Strategies do Brasil, desenvolvemos uma edição especial para falar somente sobre a questão do aborto na mídia. É basicamente um manual do que não fazer e, principalmente, do que fazer  para divulgar notícias sobre o assunto de maneira humanizada.  Então o Minimanual traz questões importantes como termologia, uso e apuração de dados, escolha de imagens e, principalmente, o tratamento a mulher em cobertura de denúncias.” – Karoline Gomes, coordenadora de conteúdo e comunidades da ONG Think Olga.

Thaís Campolina

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