Os 7 erros das pessoas que julgaram a escolha de Rebeca Mendes pelo aborto, por Debora Diniz

13 de dezembro, 2017

A escolha de Rebeca foi o aborto. Foi à justiça e esperou. Sem resposta, viajou à Colômbia e fez, legalmente, o procedimento.

(HuffPost Brasil, 13/12/2017 – acesse no site de origem)

A escolha de Rebeca foi o aborto. Foi à justiça e esperou. Sem resposta, viajou à Colômbia e fez, legalmente, o procedimento. De volta ao Brasil, sua história é pública, pois Rebeca não se esconde. Recebeu mais apoio que ofensas. Gente desconhecida invadiu sua casa para compartilhar experiência e dar lição de moral. Julgadores de plantão anunciaram os sete erros da escolha de Rebeca.

1. Só engravida quem quer.

Quem diz isso é mentiroso ou conhece pouco de métodos contraceptivos. Os métodos falham, basta ler a bula de qualquer um deles. E mais que isso: o “quem” precisa ser específico nesta frase. Sequer sabemos o nome do companheiro de Rebeca nesta gravidez. É o pai dos filhos, mas até hoje anônimo. A ele não houve acusação disto ou daquilo, a ele não se reclamou o uso da camisinha. O mais importante, no entanto: planejamento reprodutivo não é uma tabuada em que as contas são pré-determinadas. É um campo em que os afetos importam, por isso as pessoas se confundem ou erram em seu uso.

2. Ela está matando um inocente. Matando o próprio filho

Rebeca responde de jeito diferente. Estava grávida de nove semanas, cinco semanas de atraso menstrual. Para quem se apoia na embriologia para falar de vida do feto, não há coração batendo, é um estágio muito inicial da gravidez. Isso importava para a escolha de Rebeca – por isso, procurou a justiça com duas semanas de atraso de menstrual. Há países que sequer descrevem este procedimento como interrupção da gestação, mas esvaziamento do útero.

3. Ela poderia encaminhar para adoção.

Antes disso, ela teria que se manter grávida contra sua vontade por 9 meses. O laudo médico que acompanhou o pedido judicial no Brasil mostrou que havia risco à sua saúde mental com a gravidez. Seu sofrimento traria consequências para si mesma, para seus dois filhos e para o feto em desenvolvimento. Além disso, a fila de crianças à espera de adoção no Brasil é grande, por que essas crianças seriam preteridas à escolha de Rebeca?

4. Ela gostou de fazer, agora deve arcar com a responsabilidade.

Filho não é castigo, é amor e escolha. Rebeca é mãe de dois filhos, sabe o que é a maternidade, sabe o sentido de cuidar de seus filhos com responsabilidade. É verdade que o encontro sexual é um momento prazeroso, o que não significa, no entanto, que a gravidez se transforme por isso em um dever. Exatamente por ser uma mulher responsável na maternidade que Rebeca sabia não poder ter mais um filho.

5. Ela é egoísta. Só pensa nela.

Rebeca pensa em sua família, nos dois filhos e no futuro que poderá oferecer a eles se terminar a faculdade e trabalhar. Seus filhos têm 9 e 6 anos, Rebeca só voltou a trabalhar quando o mais novo tinha 4. Durante anos foi só mãe e cuidadora da casa. Egoísta é um julgamento que não se encaixa em sua vida de estudo, trabalho e maternagem.

6. Outras mulheres conseguem. Ela também pode conseguir.

Todas somos diferentes, é verdade. Algumas mulheres conseguem ter dois filhos, trabalhar e estudar, como faz Rebeca. Outras não conseguem. Algumas mulheres sequer têm filhos, outras não conseguem imaginar-se sem marido na casa para cuidar dos filhos. O próprio exemplo não é um sinal de solidariedade, mas de opressão pela escolha vivida. A escolha de Rebeca é só dela.

7. Ela está indo contra a natureza. É pecado, vai ser punida.

Rebeca foi criada em uma família evangélica, e já ouviu muito sobre pecado ou leis divinas. Como ela, não acredito em maternidade como destino, ou aborto como pecado. Rebeca estava em risco para sua saúde, sua escolha foi por cuidar de si e dos filhos.

Debora Diniz antropóloga, professora de direito e documentarista

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