Para a proteção de mães e filhos, organizações pedem mudanças na Lei de Alienação Parental, por CLADEM Brasil

17 de setembro, 2018

As organizações Coletivo de Proteção à Infância Voz Materna, Coletivo Mães na Luta, ONG Vozes de Anjo e CLADEM Brasil manifestam-se publicamente para pedir, entre outros pontos, a revogação de partes da Lei de Alienação Parental tendo em vista a forma como a legislação é aplicada, em favor de agressores.

(Justificando, 17/09/2018 – acesse no site de origem)

De acordo com o manifesto, os grupos também solicitam a “averiguação das reais condições das crianças afastadas das mães ou que foram encaminhadas ao convívio forçado com os genitores ditos alienados”. Nesse contexto, o aumento das denúncias do uso da legislação para obter impunidade e reversão de guarda em casos de abuso sexual infantil e violência doméstica vêm obtendo êxito em 87% dos casos.

Abaixo, leia o manifesto na íntegra:

Manifestação e Requerimento

Os coletivos e organizações de defesa dos direitos humanos vêm se manifestar em relação aos processos onde ocorreram a inversão de guarda ou liberação de visitas, após acusações de alienação parental ao genitor guardião que tenha denunciado a suspeita de abuso sexual intrafamiliar ou violência doméstica.

Entre 2011 e 2017, o Brasil teve um aumento de 83% nas notificações gerais de violências sexuais contra crianças e adolescentes, segundo boletim epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde em 25/06/2018. No período foram notificados 184.524 casos de violência sexual, sendo 58.037 (31,5%) contra crianças e 83.068 (45,0%) contra adolescentes. A maioria das ocorrências ocorreu dentro de casa e os agressores são pessoas de convívio das vítimas, geralmente familiares.

O mesmo estudo mostra que a maioria das violências é praticada mais de uma vez. Dado comprovado, também, por registros do Centro de Referência ao Atendimento Infanto Juvenil (CRAI), os quais apontam que na maioria dos casos ocorre a reincidência e que, na quase totalidade de casos de óbitos relacionados ao abuso sexual infantil, já haviam registro de denúncias anteriores.

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 2017 registrou 388.263 novos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, o que representa um aumento de 16% nestes processos em relação a 2016. Só no ano passado, a Justiça estadual recebeu 2.795 processos de feminicídio, isto é, oito novos casos por dia. A taxa de mortes em razão do gênero feminino é, portanto, de 2,7 casos a cada cem mil mulheres.

Nesse contexto, o aumento das denúncias do uso da Lei de Alienação Parental (Lei 12.318/2010) para obter impunidade e reversão de guarda em casos de abuso sexual infantil e violência doméstica, que vêm obtendo êxito em 87% dos casos. Como consequência, a inversão de guarda ao agressor, mesmo que a alegada alienação parental não seja provada, violando o prazo contido no artigo quinto, inciso terceiro, da própria lei.

Considerando também a atualização dos enunciados da Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (COPEVID), de março de 2018. Como diz o enunciado número 17, a “prática de atos de violência doméstica contra a mulher na presença de crianças ou adolescentes constitui forma de violência psicológica contra estes”.

Segundo o enunciado número 35, “o promotor de justiça deve zelar para que na vigência da medida protetiva de urgência em favor da mulher, de regulamentação de direito de convivência dos seus filhos e filhas (art. 22 da Lei 10 Maria da Penha), considerados vítimas diretas ou indiretas da violência contra ela praticada, tal decisão deva prevalecer sobre a decisão da Vara de Família que concede visitas ou regulamentação de guarda ao agressor, tendo em vista o disposto no artigo 13 da Lei Maria da Penha, a especialização em gênero e o direito à proteção integral previsto no art. 227 da Constituição Federal.”

O enunciado seguinte diz que a “absolvição do réu, por falta de provas em processo por violência doméstica ou estupro de vulnerável, não configura, por si só, alienação parental.”

Segundo, ainda, o documento de Avaliação sobre o cumprimento da Convenção Para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres (CEDAW), que cita no item Estereótipos e Práticas Daninhas, a aceitação e o uso em distintos tribunais da Síndrome de Alienação Parental em casos de Abuso Sexual na Infância, desconsiderando, ainda, históricos de violência doméstica e que a violência contra os filhos é violência de gênero.

Soma-se ainda a esse cenário, as mais de cinco mil denúncias de erros processuais na Comissão Parlamentar de Inquérito dos Maus-Tratos instaurada no Senado para investigar atos de negligência, violência e abuso contra crianças e adolescentes, e o crescente número de denúncias junto a Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul.

E, finalmente, considerando a Nota Pública do CONANDA – Conselho Nacional dos Direitos das Criança e dos Adolescentes, de 30/08/2018, sobre a Lei de Alienação Parental, em que pede a revogação do inciso VI do artigo 2o e dos incisos V, VI e VII do artigo 6° da Lei n° 12.318 de 2010, sem prejuízo ao aprofundamento do debate acerca da possibilidade da revogação de outros dispositivos ou de inteiro teor da referida Lei da Alienação Parental, requeremos:

Que os processos, em que haja a acusação de Alienação Parental, sejam revistos por este Tribunal e analisados priorizando a segurança das crianças vítimas de abuso, afastando-as, imediatamente, do suposto agressor, assim como, avaliando o histórico de violência doméstica, tendo a criança como vítima indireta, quando citados. A averiguação das reais condições das crianças afastadas das mães ou que foram encaminhadas ao convívio forçado com os genitores ditos alienados. Tal verificação deverá ocorrer no âmbito familiar, escolar e social. E a redistribuição de todos os processos das Varas de Família para a Vara da Infância ou Violência Doméstica, conforme o caso, onde hajam, simultaneamente, denúncias de violência e Alienação Parental e/ou a suspensão dos processos das Varas de Família onde estejam ocorrendo os trâmites de inquérito policial.

Requeremos ainda a estrita observância das Recomendações insculpidas no Mecanismo de Monitoramento de Implementação da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (MESECVI), “Convenção de Belém do Pará”, de setembro de 2014, a saber:

Garantir que as vítimas de violência recebam um tratamento digno, tomando todas as medidas relevantes para promover a sua recuperação física e psicológica e reintegração social, num ambiente favorável à saúde, bem-estar, auto-estima, dignidade e autonomia das pessoas e que leve em conta suas diferentes especificidades e necessidades;

Garantir a confidencialidade das vítimas desde o próprio ato de denunciar os fatos e durante todo o processo de ação diante de uma situação que constitui violência, e um processo rápido e ágil, conferindo credibilidade às vítimas e protegendo a privacidade e dignidade das pessoas afetadas;

Reduzir o número de intervenções de mulheres, meninas e adolescentes vítimas de violência no processo a uma única declaração ou reclamação, tanto quanto possível, e interrogar as vítimas apenas sobre o fato denunciado em busca de obter a informações mínimas e essenciais para pesquisa, a fim de evitar a revitimização;

Realizar investigações rápidas e completas, levando em conta o contexto de coercibilidade como um elemento fundamental na determinação da existência de violência, usando evidências técnicas e proibindo explicitamente evidências baseadas no comportamento da vítima a fim de inferir o consentimento, como falta de resistência, história sexual ou retração durante o processo ou a desvalorização do depoimento baseado na suposta Síndrome Alienação Parental (SAP), de tal forma que os resultados destes possam combater a impunidade dos agressores;

Proibir mecanismos de conciliação ou comprometimento entre o agressor e as vítimas de violência agressão sexual contra as mulheres, bem como de atenuantes nesses casos, que enviam uma mensagem de permissividade à sociedade, reforçam o desequilíbrio de poderes e aumentam o risco físico e emocional de mulheres que não estão em igualdade condições na negociação;

Eliminar dos ordenamentos jurídicos as leis que perpetuam a prática da violência contra mulheres, meninas e adolescentes, bem como garantir que a violência e a humilhação não sejam reproduzidas em ambientes institucionais e que o pessoal de saúde não revitimize ou negue acesso aos serviços de saúde às mulheres que os requerem e assegurem o acesso a informação sobre saúde reprodutiva, essencial para que as mulheres possam exercer autonomia reprodutiva e seus direitos à saúde e integridade física;

Que estas recomendações, específicas à mulheres e crianças meninas, alcance aos meninos, que do mesmo modo são vítimas de violência sexual e de gênero, como já entende a Lei Maria da Penha.

Coletivo de Proteção à Infância Voz Materna

Coletivo Mães na Luta

ONG Vozes de Anjo

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