Naturalização da violência no trabalho contra a mulher é obstáculo no combate ao assédio

28 de junho, 2021

Maioria das mulheres já sofreu algum tipo de violência ou assédio no trabalho, mas demoram a perceber a situação

(Jornal da USP | 28/06/2021 | Por Robert Siqueira | Acesse a matéria no site de origem)

Dois casos de assédio chamaram a atenção no mundo do futebol nas últimas semanas. Rogério Caboclo, presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), foi acusado de assédio moral e sexual por uma funcionária da entidade. Dias depois, Caboclo foi afastado do cargo. Já o atacante Neymar, da Seleção Brasileira e do Paris Saint-Germain, da França, foi acusado de assédio sexual por uma funcionária de uma empresa de material esportivo, que patrocinava o jogador. O caso está sendo investigado.

Os casos ganharam grande repercussão na mídia, mas são apenas a ponta do iceberg, já que a maior quantidade dos casos sequer é denunciada. Para se ter ideia, um levantamento feito pelo Instituto Patrícia Galvão, organização feminista de referência na defesa às mulheres no Brasil, revelou que 76% das mulheres já sofreram violência ou assédio no trabalho.

Violência no trabalho

A palavra assédio, seja moral ou sexual, traz a ideia de que existe uma relação de poder do assediador sobre a vítima. Mas é preciso entender cada caso e suas diferenças, como explica a terapeuta ocupacional Maria Paula Panúncio, professora e presidente da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.

O assédio moral se configura com gestos, palavras e comportamentos que expõem uma pessoa a circunstâncias humilhantes e constrangedoras, e que podem ser ofensivas à personalidade, dignidade e integridade física ou psíquica, com o objetivo de excluir a pessoa das suas funções, desqualificar ou prejudicar o trabalho. “Esses atos, para serem considerados como assédio, têm que ser frequentes, repetidos e intencionais”, destaca Maria Paula.

Já o assédio sexual se caracteriza por palavras ou atitudes que constrangem uma pessoa com a finalidade de conseguir vantagem ou favorecimento sexual. Conta a professora que esse tipo de assédio “pode ser caracterizado mesmo que praticado uma única vez e que a vítima se negue a realizar os atos sexuais”.

Apesar de o tema ser cada vez mais discutido, muitas pessoas ainda têm dificuldades em reconhecer uma situação de assédio. Segundo Maria Paula, a naturalização desse tipo de violência – já enraizada na sociedade – é um dos principais obstáculos. Brincadeiras e comentários sexistas ou de cunho sexual, assim como o tratamento rude ou grosseiro de um chefe, são exemplos de assédio moral e sexual, vistos com naturalidade no cotidiano.

Ações de conscientização

Para conscientizar e informar a comunidade sobre “algumas práticas que são naturalizadas e vistas como comuns nos ambientes de trabalho e acadêmico, mas que são práticas abusivas”, a Comissão de Direitos Humanos da Faculdade de Medicina da USP, em Ribeirão Preto, produziu a cartilha Violência interpessoal no trabalho: como identificar e combater o assédio moral e sexual.

O documento, disponível gratuitamente pela internet, deve reforçar a importância de colocar o assunto em pauta e estimular a realização de campanhas de conscientização que, segundo a professora, têm papel fundamental no combate ao assédio. Maria Paula alerta para o fato de que as pessoas que fizeram e fazem piadas de cunho sexual ou sexista, ou que tratam mal os funcionários, vão continuar repetindo suas atitudes se não forem orientadas e conscientizadas. “Essa conscientização é uma luta, e temos que praticar diariamente os mantras do respeito, dos direitos e das boas relações.”

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