Representação feminina: democracia inclusiva é o que se busca, por Luciana Lóssio

13 de março, 2019

O Brasil — empatado com o Paraguai — possui a pior representação feminina no parlamento, entre todos os países da América do Sul, apesar de ser a maior economia da região. Estamos entre as dez maiores economias do mundo, mas no ranking mundial de 193 democracias, ocupamos a 133ª colocação em relação à presença feminina na Câmara Baixa, ficando atrás de países como Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, que tradicionalmente renegam direitos às mulheres.

E a pergunta que, instintivamente, se faz é: o que o Estado pode fazer para corrigir esse déficit de representação?

O Poder Legislativo, desde a década de 1990, aprovou uma lei de cotas que traz representação mínima de 30% de cada sexo. O Poder Executivo a sancionou.

E após mais de 20 anos em vigor, com uma representação feminina de aproximadamente 10% nas Casas Legislativas, a política afirmativa foi revigorada por decisões históricas do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, que garantiram recursos financeiros e tempo de propaganda às candidaturas femininas.

O efeito prático dessas decisões foi o significativo aumento do número de cadeiras ocupadas no parlamento, correspondente a 50% na Câmara dos Deputados e 35% nas Assembleias Legislativas.

A situação ilustra a importância simbólica do Poder Judiciário no efetivo cumprimento da lei e reforça o seu papel essencial na concretização da igualdade de gênero na política.

Os dados do cenário internacional reforçam essa compreensão, pois, nos oito países da América Latina que possuem lei de paridade de gênero, a representação feminina varia de 18,3% a 53,1%, com relação direta entre o melhor desempenho e o grau de rigor judicial no controle da ação afirmativa.

Evidente, portanto, que não basta a criação de lei. É necessário que ela seja cumprida! É imperioso que os partidos tenham a certeza de que serão sancionados caso descumpram a legislação.

Cabe ao Poder Judiciário avançar na sua digna missão de implementar e distribuir justiça, sinalizando para todos os atores do processo eleitoral que continua atento ao princípio fundamental da igualdade de gênero, e que adotará as medidas necessárias para a consolidação dessa importante ação afirmativa.

E é nesse momento histórico de importantes avanços, no mês que se comemora o dia internacional da mulher, e quando tanto se fala em democracia inclusiva para assegurar os direitos humanos de mais da metade do eleitorado brasileiro, que o Tribunal Superior Eleitoral analisará um caso de candidatas laranjas, fantasmas, ou fictícias, registradas apenas e tão somente para alcançar o percentual mínimo de 30% e permitir que homens fossem candidatos.

Sem dúvida, essa vicissitude reclama alguma providência, pois somente com uma sinalização clara da Justiça Eleitoral será possível desestimular e coibir candidaturas fictícias, ainda verificadas em 2018, inclusive para desviar recursos dos fundos públicos de financiamento de campanha.

Não se pode conceber que mulheres sejam registradas como candidatas apenas para viabilizar candidaturas masculinas, e que os partidos políticos descumpram a lei de forma tão acintosa. Impõe-se uma correção dos rumos do processo político brasileiro, que clama por uma maior representação feminina nos cargos eletivos.

O argumento falacioso de que não há mulheres almejando a vida pública é o mesmo utilizado quando da discussão sobre o voto feminino, em 1932, quando se falava que as mulheres não se interessavam pela política, logo, não precisavam votar.

Já há quem queira acabar com a lei de cotas. Será que o próximo passo será acabar com o voto feminino?

Confiamos na justiça brasileira. Ainda há juízes em Brasília!

Luciana Lóssio é advogada e ex-ministra do Tribunal Superior Eleitoral

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