A escola falhou se o aluno acha que menina é inferior, diz pesquisadora

13 de janeiro, 2016

(UOL, 13/01/2016) “Se uma criança fica convencida de que meninas, negros e pessoas de religiões não-cristãs são inferiores, não importa que ela saiba ler e escrever, a escola terá falhado”, afirma a professora Daniela Auad, da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora), especialista em relações de gênero na escola.

Para ela, a escola que discute gênero é a que a ensina respeito, é a escola de todos. A discussão de gênero vai além da questão homem-mulher.

Em entrevista ao UOL, Auad disse que a escola tem papel fundamental no combate às violências e que o debate já faz parte do ambiente de convívio dos alunos. “Quando você pede para a criança, no 2º ano do ensino fundamental, desenhar a família, ela vai desenhar a mãe, o pai, o marido novo da mãe, os irmãos que advêm das novas relações”, exemplifica.

“O gênero está na escola, ainda que se tire do PNE [Plano Nacional de Educação], continua a violência contra a mulher, o abuso sexual, e isso é material da escola, sim.”

“Os meninos aprendem na escola que têm mais força, que têm que ter cuidado com a própria força, que poderiam até estuprar uma mulher se quisessem. Temos que ir contra essa mentalidade, para que não tenhamos no futuro um jovem que estupra a colega na Faculdade de Medicina”, diz a pesquisadora, em referência aos casos de violência sexual denunciados na USP (Universidade de São Paulo).

Para Auad, falar de gênero não é induzir as crianças à homossexualidade, como dizem os contrários a essa discussão na escola. “Ninguém vai inventar a homossexualidade para as crianças, isso já existe e é bom que seja debatido antes que elas sejam vítimas de todo o tipo de violência por falta de debate”.

Existe educação de menino e de menina?
“Não. A boa educação, que a gente pensa como ideal para formar homens, mulheres e todas as pessoas que têm que fazer parte da sociedade, é uma educação para todos, respeitando a especificidade de cada um e dos grupos em suas múltiplas identidades”, diz.

“A escola pode estar ensinando a criança a fazer um texto muito bom, a saber matemática, questões de geográfica, mas o que adianta se ela vira para o colega e chama de ‘viadinho’, ‘puta’, ‘piranha’?”

A professora da UFJF defende que uma escola de qualidade é que a ensina a criança a questionar as suas hipóteses do que é ser menina, do que é ser menino e do que é ser belo, por exemplo. “A escola que não debate as questões raciais, de gênero, de orientação sexual, é ruim para todos, e para os filhos de casais compostos por homem e mulher, haja vista que o Enem tematizou várias questões do gênero [em 2015]. Então, uma escola de qualidade debate todos os esses pontos que tem a ver com cidadania, que são conteúdos escolares para todas as pessoas. O fato é que a escola hoje não tem qualidade para ninguém”.

Mas como tratar o tema em sala de aula?
“Não silenciando quando meninos e meninas usam adjetivos pouco respeitosos, como ‘galinha’, ‘puta’, ‘viado’. Esse tema deve ser pensado dentro do quadro de negociações da escola, de comportamentos que respeitem todas as famílias, todas as raças, todas as religiões”, afirma Auad.

A pesquisadora diz que há materiais disponíveis de apoio para os professores abordarem gênero em sala, mas que as boas soluções fogem dos discursos prontos. “Não é mais um tema novo, o professor não pode mais dizer ‘não sei trabalhar esse tema na escola’. Tem muito material online”, diz a autora do livro “Educar Meninas e Meninos: relações de gênero na escola”. “Não há solução fácil e rápida. É super importante que esse debate esteja nos mais diferentes lugares”, afirma.

Marcelle Souza

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