Em todo o Brasil, 249 bebês vivem com suas mães em presídios

15 de fevereiro, 2018

Situação é semelhante a de Jessica, que dividiu cela com seu filho recém-nascido em SP

(UOL, 15/02/2018 – acesse no site de origem)

Em todo o Brasil, 249 bebês vivem com suas mães dentro de presídios, segundo levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgado em janeiro. Presas, as mães dessas crianças estão em situação semelhante a de Jessica Monteiro, de 24 anos, que passou mais de 24 horas dividindo uma cela com seu filho recém-nascido em São Paulo durante o carnaval. Na quarta-feira, ela foi transferida para a Penintenciária Feminina de Santana, também na capital paulista, equipada com berçário.

Desde março de 2016, o Código de Processo Penal (CPP) permite que o juiz substitua a prisão preventiva de mulheres grávidas e com filhos de até 12 anos por regime domiciliar. Para isso, o magistrado analisa, entre outros critérios, a conduta da presa, a violência do crime, as condições da família de cuidar da criança enquanto a mãe estiver detida. A defesa de Jessica argumenta que ela é ré primária, e que não cometeu um crime violento — ela foi flagrada com quatro porções de maconha escondidas no sutiã, segundo a polícia.

Durante audiência de custódia, o juiz Claudio Salvetti D’Angelo entendeu que a quantidade de drogas apreendida com Jessica e outro homem, que somavam 90 gramas, era muito grande, o que configuraria tráfico. Em seu despacho, escreveu que isso o levava a supor “serem os averiguados portadores de personalidade dotada de acentuada periculosidade”.

Quando a Justiça não concede a liberdade à mulher que está amamentando seu filho recém-nascido, o Estado deve garantir a permanência da criança no estabelecimento prisional até, no máximo, um ano e seis meses, de acordo com resolução do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) de 2009.

Ao todo, 44,7 mil mulheres estão presas no Brasil, cerca de 60% por tráfico de drogas, segundo censo realizado em 2016 pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen). Como a maior parte da população carcerária feminina está em São Paulo, o estado tem também a maior quantidade de mulheres que amamentam seus filhos na cadeia (96) e que estão grávidas (139). No país todo, 373 grávidas estão em prisão preventiva ou cumprindo pena. Em Minas Gerais, a pesquisa do CNJ encontrou 34 lactantes e 22 grávidas. No Rio, são 10 as presas que amamentam seus filhos e 28 as grávidas.

A situação dessas detentas têm sido alvo constante de comentários da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do CNJ, ministra Cármen Lúcia. Ela já classificou como “inadmissível”, disse que é um desrespeito à “Lei do Ventre Livre”

— Não quero que nenhum brasileirinho nasça dentro de uma penitenciária. Isso não é condição precária, é de absoluta indignidade — disse a ministra, em janeiro.

‘VIOLAÇÃO DE DIREITOS’

No estudo “Dar à luz na sombra: condições atuais e possibilidades futuras para o exercício da maternidade por mulheres em situação de prisão”, as pesquisadoras Ana Gabriela Mendes Braga e Bruna Angotti identificaram que os “espaços específicos para exercício da maternidade são excepcionais” e que, mesmo em unidades modelo, há “falhas estruturais e conjunturais”.

Publicado em 2015 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o relatório aponta como uma das saídas para o problema a conversão das prisões para domiciliar. “Concluímos que uma melhor possibilidade de exercício de maternidade ocorrerá sempre fora da prisão e, se a legislação for cumprida, tanto em relação à excepcionalidade da prisão preventiva como no tangente à aplicação da prisão domiciliar, grande parte dos problemas que afetam a mulher no ambiente prisional estarão resolvidos”.

Para o advogado Ariel de Castro Alves, conselheiro do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), o caso de Jessica é uma violação aos direitos:

— Ela foi presa com pequena quantidade de drogas, é primária, bons antecedentes, tem um filho de 3 anos e o bebê recém-nascido. Tem direito a prisão domiciliar e a responder pelo crime em liberdade provisória. São flagrantes violações de direitos humanos.

Tiago Dantas

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