Médicos alertam para índices crescentes de HIV e HPV entre jovens, hepatite B e sífilis

17 de abril, 2016

(O Globo, 17/04/2016) Mais da metade da população brasileira admite não usar camisinha

Não são poucos os indícios de que, outrora causadoras de pânico, as doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), hoje, parecem já não assustar. Grande sinal disso é que o uso de preservativos, principal forma de evitar essas infecções, torna-se cada vez menos popular: mais da metade da população sexualmente ativa admite não usar camisinha, mesmo que 95% reconheçam sua eficácia. Como consequência, a transmissão de hepatite B na população brasileira cresceu 74% desde 2004, e a transmissão de HIV na faixa de 15 a 19 anos aumentou 53% na última década. Enquanto isso, o estoque da vacina contra o papilomavírus humano (HPV) — um dos principais causadores de câncer de colo do útero —, oferecida pela rede pública a meninas de 9 a 13 anos, está sobrando nos postos. A imunização só atingiu 44,23% dessas meninas este ano, índice bem longe da meta de 80%. E há, ainda, a assustadora epidemia de sífilis, que assola principalmente o Rio, estado com o maior número de casos da doença em gestantes e recém-nascidos.

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— Perdemos o medo das DSTs. A Aids, por exemplo, passou de uma doença que levava à morte muito rapidamente para uma doença crônica, tratável. Os jovens de hoje não chegaram a ver seus ídolos morrendo por causa dela — disse Alberto Chebabo, infectologista do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da UFRJ.

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Chebabo foi um dos palestrantes da última edição do Encontros O GLOBO Saúde e Bem-Estar, na última quarta-feira, dia 13, que discutiu as DSTs e contou também com a presença da ginecologista Cláudia Jacyntho, doutora pela Unicamp, e do cardiologista Cláudio Domenico, coordenador do evento, mediado pelo jornalista do GLOBO, William Helal Filho.

Se, por um lado, a perda do medo dessas doenças é positiva porque tira o estigma associado a quem tem uma DST, por outro é usada como justificativa para deixar a camisinha de lado.

— O mais complexo na medicina é convencer o ser humano a mudar de comportamento — avalia Domênico. — Para muitos males, como sífilis, HIV e gonorreia, não há sequer vacinas. Então, a melhor saída é usar preservativo. Prevenir é sempre melhor do que remediar.

QUEDA NA PROCURA POR VACINA CONTRA HPV

Nos últimos dois anos, o Brasil conheceu uma nova forma de prevenção com a vacina quadrivalente do HPV, que protege contra os sorotipos 6, 11, 16 e 18. Os dois primeiros são responsáveis por 90% dos casos de verrugas genitais, enquanto os dois últimos causam 70% das ocorrências de câncer de colo do útero. O esforço federal de vacinação tem como meta frear as atuais estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca), que prevê o surgimento de 16 mil novos casos de tumor de colo do útero em 2016, e 5,4 mil mortes pela doença.

Menina de 9 anos recebe vacina quadrivalente contra o HPV em um posto de saúde da Tijuca, no Rio (Foto: Gabriel de Paiva / Agência O Globo)

A campanha foi feita na primeira quinzena deste mês, e a vacina está disponível até o fim do ano em postos de saúde, mas em unidades como o Centro Municipal Heitor Beltrão, na Tijuca, a procura é cada vez menor. Se cerca de cinquenta doses eram dadas por dia em 2014, ano em que ela entrou no Calendário Nacional de Vacinação destinada somente a meninas de 11 a 13 anos, hoje é aplicada em duas garotas por dia, em média, segundo enfermeiras da unidade.

— O HPV, ao lado da herpes genital, é a virose sexual transmitida com maior frequência. E o ápice da transmissão é abaixo dos 25 anos — contou Cláudia Jacyntho, em sua palestra. — É preciso lembrar, claro, que o HPV, sozinho, não causa câncer. A grande maioria das mulheres entra em contato com ele, mas desenvolve imunidade natural. Para chegar a ter câncer, são necessários outros fatores, como tabagismo e baixa imunidade.

Debate sobre DSTs no Encontro O Globo de Saúde e Bem-estar, com a ginecologista Cláudia Jacyntho e o infectologista Alberto Chebabo (à dir.), com mediação do jornalista William Helal Filho e do cardiologista e coordenador do evento, Cláudio Domênico (Foto: Leo Martins / Agência O Globo)

Muitas dessas doenças só apresentam sintomas quando já estão em estágio avançado. A sífilis, por exemplo, pode levar a problemas cardíacos, meningite e até à loucura. E, contraída por grávidas, pode causar malformações nos bebês. De 2008 a 2013, o número de grávidas infectadas no Brasil saltou de menos de 10 mil para 21.382 — 7,4 casos para cada mil nascidos vivos. No ano seguinte, já eram mais de 25 mil casos diagnosticados.

— A sífilis só começa a dar sinais visíveis nas mulheres quando está na fase secundária — explicou Alberto Chebabo. — Se a doença chegar à fase terciária, ameaça causar, anos depois, problemas como demência e malformação na aorta, principal artéria do corpo.

MILHÕES DE INFECTADOS POR CLAMÍDIA E GONORREIA

Outras doenças transmitidas por sexo são mais comuns do que se pode pensar. A clamídia, por exemplo, afeta 1,9 milhão de pessoas a cada ano no país e a gonorreia, 1,5 milhão, de acordo com estimativa da Organização Mundial da Saúde.

— A clamídia é assintomática em 70% das vezes, e a gonorreia, em 40%. E, mesmo quando dão sintomas, é comum as mulheres acharem que estão com infecção urinária — disse Cláudia Jacyntho.

Clarissa Pains

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