A mobilização das mulheres para garantir a descriminalização do aborto na Argentina

12 de junho, 2018

Projeto de lei que pode assegurar direito de escolha às mulheres será votado na próxima quarta-feira (13).

(HuffPost Brasil, 12/06/2018 – acesse no site de origem)

A Argentina, um dos países de maioria católica da América Latina, está pela primeira vez frente à frente com um assunto que foi evitado ao longo da história: a legalização do aborto. Divididos em contra e a favor, milhares de pessoas dos dois lados tomaram as ruas de Buenos Aires desde abril de 2018 para se posicionar sobre um projeto de lei que será votado na próxima quarta-feira (13) no Congresso argentino. Caso o projeto seja aprovado, o procedimento, atualmente considerado crime, poderá ser realizado até a 14ª semana de gestação, em casos específicos.

Os números demonstram que, apesar da proibição, as mulheres continuam abortando.Mariana Carbajal, jornalista e ativista

Com legislação semelhante à do Brasil, atualmente na Argentina é permitido interromper a gravidez apenas em casos de estupro e risco para a vida ou a saúde da mãe. Segundo dados do sistema de saúde argentino, ocorrem cerca de 500 mil abortos clandestinos por ano e, desses, 60 mil acabam em complicações no país.

Leia mais: 23 imagens do grito de jovens por ‘ni una menos’ e pelo direito ao aborto na Argentina (HuffPost Brasil, 13/06/2018)

“Os números demonstram que, apesar da proibição, as mulheres continuam abortando. Quem é de classe média e vive na capital pode dar um jeito, sem correr risco de vida”, afirmou a jornalista e ativista Mariana Carbajal, em discurso no Congresso. “Mas, para as pessoas de baixo recursos ou que vivem no interior, não ter acesso a uma clinica, onde possa abortar legalmente, representa um risco de vida. Ignorar isso é ignorar a realidade”, finalizou.

A partir da aprovação do projeto, a gravidez só poderá ser interrompida em casos de estupro, se representar um risco para a vida e a saúde da mãe, e também se o feto tiver alguma malformação, “incompatível com a vida extrauterina”. Segundo o jornal Clarín, os médicos terão o direito de se negar a praticar abortos, por questões de consciência, mas nesse caso os centros de saúde precisam providenciar profissionais que possam realizar o procedimento e cumprir a lei.

A votação será iniciada nesta quarta-feira (13), mas as previsões são de que termine apenas no dia seguinte. Ainda assim, mesmo se for aprovada pela maioria, a legislação terá que ser submetida ao Senado, considerado setor mais conservador que a Câmara dos Deputados.

As jovens a favor da descriminalização

Para além da onda feminista de 2015, em 2018 uma nova geração de feministas é dona do protagonismo da campanha pelo direito ao aborto ocupando as ruas de Buenos Aires. A imagem de milhares de jovens, sacudindo lenços verdes, símbolo da luta pela descriminalização do aborto, foi capa dos jornais desde março deste ano e se multiplicou pelas redes sociais. A fotografia abaixo é do dia 5 de junho, em Buenos Aires:

“Aborto legal no hospital”, cantavam as manifestantes, em sua maioria adolescentes, segundo o jornal La Nacion. Ainda segundo o jornal argentino, a reivindicação pelo aborto legal vem acompanhada do pedido de que as escolas ofereçam educação sexual integral. Existe uma norma aprovada há 12 anos que, segundo as manifestantes, não é cumprida. Muitas relatam que recebem informação incompleta e enviesada.

Em discurso recente no Congresso, o presidente Mauricio Macri surpreendeu ao apoiar o início de um debate que, segundo ele, “tinha sido postergado durante os últimos 35 anos”. Mas os ministros ainda estão divididos sobre a questão. Na tarde desta terça-feira (12), o jornal La Nacion manteve em sua manchete uma reportagem que destacava os nomes dos parlamentares contra e à favor. Até a publicação desta matéria, o número se mantinha em 119 contra e 111 a favor da descriminalização.

Para além do movimento feminista recente “Ni Una A Menos” (Nenhuma a menos, em tradução para o português), a Argentina foi pioneira na legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo, em 2010, e também na aprovação de uma lei que permite aos transexuais escolher o nome e gênero que querem colocar no documento de identidade, em 2012. Esta é inspiração para o deputado Jean Wyllys (Psol-RJ), que elaborou a Lei João Nery, proposta em tramitação no Congresso Nacional que garante os mesmos direitos aos transexuais brasileiros.

É possível que a Argentina faça história, mais uma vez. Enquanto isso, segundo o jornal Clarín, organizações e ativistas feministas tentam convencer deputados com números: elas contam com o respaldo de mais de 50% da população, um percentual que cresce entre os mais jovens. Já as organizações “pró-vida” contam com o apoio da Igreja e de parlamentares conservadores para barrar a aprovação do projeto. Para esta quarta-feira, ambos os lados preparam uma vigília na praça em frente ao Congresso.

Andréa Martinelli

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