Ação do PSB no STF pode acabar com autorização do marido para laqueadura

17 de abril, 2018

Ação da Anadep no STF também questiona Lei do Planejamento Familiar, mas para Procuradoria-Geral da República, associação não pode fazer esse tipo de questionamento.

(HuffPost Brasil, 17/04/2018 – acesse no site de origem)

Uma ação do PSB (Partido Socialista Brasileiro), partido que irá lançar o ex-ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa como candidato à Presidência da República, pode acabar com a exigência de autorização do marido para laqueadura no SUS (Sistema Único de Saúde).

A legenda ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5911) contra dispositivos da Lei do Planejamento Familiar em março. O trecho determina que a esterilização voluntária só pode ser feita por homens e mulheres acima dos 25 anos com pelo menos 2 filhos vivos e com autorização de ambos os cônjuges.

A lei também estabelece um período de 60 dias entre o pedido e a cirurgia, em que a pessoa terá aconselhamento ” visando desencorajar a esterilização precoce”.

O relator é o ministro Celso de Mello, que também tem nas mãos outra ação (ADI 5097) sobre o tema, ajuizada pela Associação Nacional de Defensores Públicos (Anadep), em 2014. A entidade questiona a exigência de autorização do cônjuge para a cirurgia.

Para a Procuradoria-Geral da República (PGR), contudo, a Anadep não teria legitimidade para propor esse tipo de ação. O Supremo reconhece viabilidade de ações diretas propostas por entidades de classe de abrangência nacional, “desde que o objeto da ação guarde pertinência com os interesses próprios da classe representada”, escreveu o então-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em parecer em setembro de 2015.

A PGR reconhece que o tema é “norma de relevância para a sociedade”, mas afirma que “não possui relação com interesses jurídicos típicos de defensores públicos, suas prerrogativas e direitos”, de modo que a ação estaria prejudicada.

A previsão para partido proporem ações diretas de inconstitucionalidade, por sua vez, está prevista no Artigo 103 da Constituição.

Ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, defendeu fim da obrigatoriedade do marido dar autorização para laqueadura. (Foto: AFP Contributor/Getty Images)

Lei viola dignidade e direitos reprodutivos

De acordo com o PSB, as exigências da Lei do Planejamento Familiar violam direitos previstos na Constituição, como a dignidade da pessoa humana, igualdade, liberdade de escolha e de planejamento familiar, além dos direitos sexuais e reprodutivos. “Essas exigências afrontam direitos fundamentais, contrariam tratados internacionais firmados pelo Brasil, além de divergir dos principais ordenamentos jurídicos estrangeiros”, argumenta o partido na ação.

A sigla sustenta que a demanda reprimida por mecanismos efetivos de planejamento familiar tem resultado em gestações indesejadas e em “todas as nefastas consequências daí advindas”.

“Não restam dúvidas de que os dispositivos excessivamente restritivos trazidos pela Lei 9.263/96 vêm prestando um verdadeiro desserviço à implementação de políticas públicas efetivas no âmbito do planejamento familiar.”

Ao justificar o questionamento, a ação destaca que o artigo 226 da Constituição prevê que o planejamento familiar é de “livre decisão do casal” e que é vedada ao ao Estado “qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas”.

A petição também destaca que, de acordo com a Lei Maria da Penha, é considerada violência doméstica impedir uso de método contraceptivo. “Além disso, as mulheres de classes menos favorecidas têm que lidar com o maior desequilíbrio de poder entre os gêneros, além dos desafios relativos à falta de informação e às carências da rede pública de saúde”, afirmou o presidente do PSB, Carlos Siqueira.

Na ação, a legenda cita pesquisa de acordo com a qual, 25,8% das mulheres e 31% dos homens que pediram a cirurgia no SUS não tiveram sucesso após 6 meses. O estudo foi feito em 6 capitais brasileiras (Palmas, Recife, Cuiabá, Belo Horizonte, São Paulo e Curitiba) e revelou também que 8% das mulheres acompanhadas engravidaram no período de espera pela esterilização.

A sigla pede a concessão de medida cautelar para suspender a eficácia desse trecho da Lei do Planejamento Familiar. Também pede que seja considerada inconstitucional a exigência de idade mínima, número de filhos e autorização do cônjuge.

Autorização do marido para laqueadura

De acordo com a Anadep, a autonomia privada é um dos componentes primordiais da liberdade e incluiu a autonomia corporal. “Condicionar a realização de cirurgia de esterilização voluntária à anuência de terceiro (no caso, do cônjuge) constitui ato atentatório à autonomia corporal e ao direito ao planejamento reprodutivo de forma livre e incondicionada”, diz a associação.

A ação também pediu a suspensão liminar da norma, mas a medida cautelar foi negada por Mello em fevereiro de 2015. De acordo com ele, o “tardio ajuizamento da ação direta de inconstitucionalidade”, considerado que a lei é de 1996, inviabiliza o pedido.

No mérito, a Procuradoria-Geral da República considerou inconstitucional o marido ter de autorizar a laqueadura. “Criminalizar esterilização voluntária realizada sem consentimento do cônjuge ou companheiro impõe à mulher situação de restrição extrema. Com isso, ela se vê sob a dupla ameaça da criminalização do aborto e da esterilização sem consentimento do cônjuge, na constância da sociedade conjugal”, escreveu Rodrigo Janot, em parecer assinado em setembro de 2015.

De acordo com o procurador, a criminalização de ambas as condutas violam o direito ao planejamento familiar autônomo do casal.

“A situação consubstancia grave violência sociojurídica e até psicológica, inaceitável anacronismo jurídico, porquanto o Estado, ao criminalizar ambas as condutas – o aborto e a esterilização voluntária realizada sem consentimento de terceiro –, impõe reprodução não planejada aos casais e colide frontalmente com o direito constitucional a planejamento familiar.”

Na avaliação da procuradoria, a dignidade da pessoa é vinculada à sua capacidade de escolha e não cabe ao Estado “tolher ou rechaçar escolhas legítimas feitas pelos indivíduos capazes”.

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