Redação de jornal tem mais machismo que áreas de conflito, diz espanhola

26 de fevereiro, 2016

(Folha de S. Paulo, 26/02/2016) A mais conhecida correspondente de guerra espanhola, Mayte Carrasco, 41, costuma inverter o senso comum de que jornalistas mulheres teriam desvantagens ao atuar em zonas de conflito.

“Nunca tive problemas por ser mulher. Além disso, eu tinha acesso à comunidade feminina local, coisa que nenhum colega homem tinha.”

Ela avalia que a próxima fronteira da cobertura sobre o Estado Islâmico deve se voltar ao deserto da Líbia, seu provável próximo destino.

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Como e por que começou a cobrir conflitos?
Nunca quis cobrir guerras, mas tive essa oportunidade quando era correspondente na Rússia e teve início a guerra da Geórgia. Decidi ir para lá e descobri que cobrir conflitos era jornalismo na veia, era ser testemunha da história e falar com seus protagonistas. Dizem que quem tem coragem tem colhão; eu digo que tenho ovários.

E como é ser mulher nesse contexto?
Eu me incomodo quando me perguntam se tenho filhos, porque é algo que nunca se pergunta aos homens. O machismo não está tanto na zona de conflito como está nas Redações e na sociedade.

Os talibãs no Afeganistão me davam acesso e entrevistas. Só não me olhavam nos olhos nem apertavam minhas mãos. No entanto, com militares espanhóis e italianos eu tinha de ser agradável para quebrar certos obstáculos.

Você já esteve sequestrada na Síria sem perceber. Como?
Estava com outro freelancer tentando sair do país para o Líbano e nos abrigamos na casa de uma família, porque a cidade em que estávamos havia sido cercada pelas tropas de Bashar Al-Assad. A família nos tratou muito bem, mas não nos deixava sair da casa nem nos comunicarmos por telefone.

Quando conseguimos sair, fomos informados de que o chefe da família era um contrabandista e havia tentado nos vender, sem sucesso. Tenho muitos colegas que estão sequestrados ou que foram mortos. A exibição propagandística da morte desses colegas é algo obsceno e triste.

Por que os jornalistas se tornaram alvos do EI?
Desde que comecei a cobrir guerras, o risco aumentou muito. Conflitos se tornaram complexos, incontroláveis. A tênue linha de confiança está cada vez mais frágil. E, nesses momentos, valemos o que valem nossos passaportes.

Disse que não volta à Síria. Quais conflitos planeja cobrir?
Quero investigar a dimensão que o EI está tomando fora da Síria, especialmente na Líbia, cujo deserto é um epicentro dos negócios antes liderados pela Al Qaeda, como tráfico de drogas e pessoas.

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