(Folha de S.Paulo) Ela já foi professora de aeróbica, casou aos 24 e divorciou-se aos 25, já chorou na frente dos chefes e levou quase um ano para arranjar emprego no Vale do Silício.
Hoje, aos 43 anos, Sheryl Sandberg é a executiva mais poderosa do setor de tecnologia, no cargo de diretora de operações do Facebook.
Ela conta detalhes de seu passado pouco glorioso, assim como situações embaraçosas no mercado de trabalho, no livro “Faça Acontecer” (Cia das Letras), uma mistura de biografia com autoajuda, ou, como ela mesma descreve: “Uma espécie de manifesto feminista”.
Leia trechos da entrevista concedida na sede do Facebook no Vale do Silício.
Folha – Tenho a impressão de que há mais mulheres no Facebook do que quando visito a Apple ou o Google. Isso tem a ver com a sua gerência?
Sheryl Sandberg – Antes de eu chegar ao Facebook já havia aqui políticas ótimas para as mulheres. O que fiz foi abrir o debate sobre gêneros. Quando nos dão retorno sobre o trabalho de outras mulheres, é comum ouvir que são agressivas. E nós perguntamos: por quê? Geralmente, quando um homem faz as mesmas coisas, ele não é considerado assim. Todo mundo quer um líder que as pessoas gostem e respeitem. E as mulheres têm mais dificuldade em ser ambos.
Por quê?
Nós não nos sentimos confortáveis com mulheres no poder. Nosso estereótipo diz que mulheres devem nutrir, ajudar, cuidar dos outros, enquanto os homens devem ser poderosos.
A sra. não tem receio de que, com o livro, suas decisões sejam vistas como interesse de beneficiar outras mulheres?
Não, imagine. A maioria das pessoas que trabalha para mim é homem, ainda hoje. A maioria da equipe sênior do Facebook é de homens, a maioria das equipes seniores em todos os lugares é de homens. Meu sucesso nos negócios sempre dependeu da minha habilidade de trabalhar bem com homens e mulheres.
Em qual momento a sra. passou a se identificar como feminista?
Foi quando passei a reconhecer essas questões e a perceber o quão grande é o papel do gênero. Foi apenas observando homens e mulheres que administrei ao longo de 15 anos. Não importa o que eu fizesse, os homens sempre saíam na frente.
No livro, a sra. diz que “ter tudo” é “talvez a maior armadilha de todos os tempos para as mulheres”. Mas a sra. tem tudo e é uma das mulheres mais poderosas do mundo.
Eu sou muito sortuda. E sou bem clara quando digo que “ter tudo” é apenas uma linguagem ruim e apenas aplicada a mulheres. Nunca ninguém diz “ele tem tudo”. Homens e mulheres deveriam ter chances iguais. Não estou dizendo que tudo deve ser feito ao mesmo tempo. As mulheres saem do campo de trabalho anos antes de ter filhos. Se você planeja ter um bebê em três anos, não deveria desistir das coisas agora. Se seguir na carreira, quando tiver um bebê, terá um salário melhor e provavelmente mais opções, flexibilidade.
Quando os EUA estarão prontos para uma presidente?
Espero que na próxima eleição. Espero que Hillary Clinton seja candidata.
A sra. não se sente às vezes frustrada por querer ter propósitos maiores e profundos e trabalhar numa empresa conhecida pelo fato de as pessoas trocarem vídeos de gatos?
O profundo pode ser encontrado no mundano, não é? Você pode dividir fotos bobinhas de gatos e se sentir realmente próximo de alguém. As pessoas precisam usar essas habilidades para se comunicar de todas as formas. E acho que é ok, é bom.
Como foi ser contratada pelo Facebook? Quais qualidades Mark Zuckerberg estava procurando que a sra. tinha?
Acho que nós dois tínhamos visões compatíveis sobre o que o Facebook deveria ser. Acho que tinha um monte de experiências e habilidades em áreas com as quais Mark não queria passar seu tempo lidando.
Por que decidiu falar sobre momentos embaraçosos da sua carreira? A sra. agradece a apresentadora Oprah Winfrey ao final do livro. Ela ajudou?
Foi bem difícil me abrir. Quando decidi escrever o livro, foi na época em que conheci a Oprah. E ela me disse para nem começar a escrever se não fosse compartilhar coisas pessoais. Amo dados e estatísticas, mas as pessoas não se interessam. Elas se vêem no que aconteceu comigo e que pode acontecer com elas.
Que dicas daria às mulheres na hora de pedir um aumento?
É importante entender que você se dará melhor se justificar o seu pedido. Dizer apenas que você merece ganhar mais pode ser a verdade, mas não funciona tão bem como funciona para os homens. Você se dará melhor se explicar o porquê. Você merece um aumento porque vai ajudar a empresa a crescer ou porque é importante para sua equipe. Não é ser agressiva, é entender o que o mundo espera de uma mulher.
Acesse em pdf: Não nos sentimos confortáveis quando mulheres estão no poder (Folha de S.Paulo – 14/03/2013)