Estrutura partidária ainda impõe barreiras à entrada das mulheres na política

15 de agosto, 2016

(Dimalice Nunes/Agência Patrícia Galvão, 12/08/2016) Partidos políticos brasileiros ainda são oligarquias masculinas. A afirmação do cientista político da Universidade de Brasília (UnB), Luis Felipe Miguel, especialista em participação feminina na política, dá o tom das dificuldades que as mulheres que decidem entrar na vida pública enfrentam. Avanços existem, mas o que persiste é um enorme número de candidatas lançadas apenas para cumprimento de cota – com apoio desigual para as candidaturas de homens e mulheres e violência contra aquelas que rompem essas barreiras. “As cotas ajudam, mas ainda incentivam candidaturas pouco competitivas dentro dos partidos”, afirma Luis Felipe.

Solange Jurema (crédito: George Gianni/PSDB)

Solange Jurema (crédito: George Gianni/PSDB)

Alguns partidos apostam em conscientização para que as eleições municipais de 2016 tenham uma queda expressiva no número de candidatas fictícias. Há dois anos o PSDB trabalha na capacitação de mulheres, especialmente com as possíveis candidatas a prefeitas e vereadoras neste ano. “Uma coisa que a gente bateu muito foi isso: não se candidate para ser laranja. Não permita que o partido lhe use”, explica Solange Jurema, presidente nacional do PSDB Mulher. A ideia é orientar sobre como planejar e estruturar a campanha, como organizar o comitê e tudo o mais que envolve a entrada da candidata no universo de disputa por um cargo eletivo.

A ação de maior apoio a candidatura de mulheres, porém, não vem de uma conscientização dos dirigentes de partidos. Para a campanha deste ano existe uma mobilização das procuradorias eleitorais para cobrar dos partidos o cumprimento da cota por sexo. Embora exista desde 1997 a determinação de que 30% das candidaturas de cada partido seja de um dos sexos, isso passou a ser respeitado apenas nas eleições de 2010 e em 2014, após maior rigor de fiscalização das Procuradorias Regionais Eleitorais (PRE). Nas eleições de 2004, por exemplo, 93% dos municípios não cumpriram a cota de 30%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM).

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A briga, agora, é pela qualidade dessas candidatura. É isso que as procuradorias de todo o país prometem fiscalizar. “Há muitos casos em que as candidatas não têm um voto sequer, nem o dela”, conta Solange. “Estou muito ansiosa para ver qual será o resultado, pois foi um trabalho de formiguinha em todo o Brasil.” A promessa da PRE é fruto de pressão dos diretório femininos dos partidos, mas também do movimento feminista. Desde 2010 também é lei que 5% da verba do Fundo Partidário seja aplicada na formação política de mulheres e 10% do tempo de propaganda partidária dos partidos deve ser utilizado pelas mulheres desses partidos.

Alda Marco Antônio (crédito: PSD).

Alda Marco Antônio (crédito: PSD).

A expectativa para este ano é grande também no PSD. Alda Marco Antônio, coordenadora nacional do PSD Mulher, afirma que o partido espera já neste ano não ter nenhuma candidatura fictícia. “Nenhuma mulher merece ser laranja e estamos conseguindo com que todas as candidatas a vereadoras e prefeitas sejam candidatas verdadeiras, que busquem de fato o voto”. Para ela, por tratar-se de um partido novo, fundado há menos de cinco anos, há maior sensibilidade dos dirigentes do PSD para a questão.

“Estamos trabalhando para criar um ambiente favorável à militância feminina e estamos conseguindo isso”, comemora, sem deixar de reconhecer o atraso da estrutura partidária em relação aos avanços da sociedade. “Os dirigentes partidários adoram as mulheres, mas como secretárias e para buscar votos para eles. E as mulheres têm que entender que podem buscar voto para elas mesmas ou para outras mulheres”, afirma Alda. Solange concorda: “no fundo, os homens apenas nos aguentam. Por outro lado, como eles são políticos, não podem dar uma declaração dentro do politicamente incorreto. Então é dentro desse espaço em que atuamos que a gente abre caminhos”.

Laisy Moriere

Laisy Moriere (crédito: PT)

Embora todos os avanços – sejam legais ou fiscalizatórios – sejam positivos, é fundamental manter o olhar crítico. Para Laisy Moriere, secretária nacional de mulheres do PT, para romper o ciclo da baixa participação das mulheres na política a máxima feminista “não basta ser mulher” precisa estar no centro da discussão. “As mulheres que conseguem romper as barreiras e assumir cargos de poder e decisão, também dentro dos partidos, precisam se perceber como mulheres com um cargo de poder e decisão. Não é para fazer como os homens fazem. As mulheres que ocupam esses espaços têm que ter em sua bagagem essa percepção feminista de busca de igualdade de gênero”, defende.

Para Laisy, a principal dificuldade é o partido entender que para uma plena democracia as mulheres precisam ser tratadas com igualdade na questão da representação político-partidária. No PT, ela explica, há paridade para os cargos de comando, “mas a paridade é um número, ela não é uma política paritária. Porque as mulheres que chegaram à direção do partido ainda não têm essa percepção, de ser uma mulher num espaço de poder. E qual deve ser a atuação dela? Ainda falta isso.”, critica.

Laisy lembra ainda que dos 35 partidos que existem hoje a maioria não tem cota de participação na direção partidária. “Não estou falando de diretório de mulher. O primeiro passo é uma efetiva representação dentro da estrutura de poder do partido. Caso contrário, não avança. Se não mudarem os partidos, não muda a política. Se não mudar a política, não se avança na democracia. Se não avançar na democracia, as mulheres irão continuar sendo a maioria da população, mas com uma representação muito menor do que a que elas têm por direito”, conclui.

Para Fátima Jordão, socióloga e especialista em pesquisas de opinião e campanhas políticas, mais que dificultar, os partidos políticos sabotam as candidaturas de mulheres. “Há um pseudo-apoio e muitas vezes é o próprio partido o maior obstáculo das mulheres.” Fátima participou de mais de 30 campanhas, mas apenas em cinco delas a candidatura era de uma mulher. “E sempre percebi uma diferença absurda na relação dos partidos com as candidatas. Não importa o cargo a que ela está concorrendo, a candidata sempre estará numa posição mais frágil que um candidato.”

Fátima afirma ainda que embora muitas mulheres só se tornem candidatas para o preenchimento das cotas, os partidos começam a perceber o papel da mulher com poder. “Quando se pensa na ‘mulher fraca’ se comete um erro. A sociedade está muito a frente dos partidos políticos, pois vê nas mulheres potencial, força. Do ponto de vista dos partidos ainda estamos em 1956”, disse.

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