Quem são os aliados das mulheres? Se eles existem, chegou a hora de esses líderes se apresentarem, por Antonia Pellegrino e Manoela Miklos

19 de agosto, 2019

As salas dos partidos de centro ficam no primeiro pavimento do Congresso Nacional. Através de suas janelas de vidro do teto ao chão, os líderes partidários que regem a vida nacional podiam assistir, na semana passada, a dispersão da marcha das Margaridas —que reuniu 100 mil mulheres de todo o país na luta por justiça ambiental— enquanto discutiam o fim da lei de cotas para candidaturas femininas. Nenhuma mulher presente à mesa.

(Folha de S. Paulo, 19/08/2019 – acesse no site de origem)

Depois do escândalo do laranjal do PSL, quem quer ser o próximo pego em flagrante? Até setembro, um ano antes do início das eleições de 2020, alguma solução precisa ser encontrada. Não à toa, o primeiro projeto de lei a circular sobre a extinção das cotas foi proposto por duas mulheres úteis: a presidente nacional do Podemos, Renata Abreu, com relatoria da deputada do PSL Bia Kicis.

Na justificativa ao projeto que pretende acabar com a punição aos partidos que não cumprirem a lei de cotas, Renata Abreu diz: “Buscamos afastar entendimentos equivocados, garantindo que os partidos mantenham a busca por candidaturas de cada gênero, mas que não sejam penalizados pelo quadro político que se apresentar em cada pleito”. Não há equívoco algum: se não há pena por não cumprir a lei, a lei não será cumprida por boa vontade. E se os partidos abrem mão de sua atribuição democrática de apresentar um quadro político representativo a cada pleito, melhor redigir um projeto pedindo a extinção dos mesmos.

Diante dos limites autoimpostos pela redação do projeto, a dupla tornou-se inútil e os líderes de centro entraram em campo. Neste momento, eles trabalham em um substitutivo. A disputa pelo consenso opõe primitivos a esclarecidos.

Por primitivos entenda-se aqueles que estão confortáveis em ver o Brasil ocupar a posição 133 no ranking Mulheres no Parlamento, que a IPU (Inter-Parliamentary Union) divulga anualmente para alertar sobre a dificuldade do acesso das mulheres aos espaços de tomada de decisão.

O fato de até regimes sexistas, como a Arábia Saudita, que violam sistematicamente direitos das mulheres, terem números melhores que os nossos não os envergonha. Os primitivos são líderes que se eximem de responsabilidades históricas, entre eles o “líder” do DEM, Elmar Nascimento, o mesmo que encampou a anistia aos partidos que não investiram 5% do fundo partidário em formação de mulheres.

Do outro lado, entre os esclarecidos, estão o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o líder do PP, Arthur Lira (AL). No grupo de pressão, em defesa dos direitos das mulheres, militam as deputadas Margarete Coelho (PP-PI), Prof. Dorinha (DEM-TO), Soraya Santos (PL-RJ) e a senadora Simone Tebet (MDB-MS).

O pleito delas é pela manutenção das cotas e, como explica Margarete à coluna: “Lutar por novos mecanismos de incentivo à participação de mulheres na política, como a destinação de mais recursos dos fundos partidário e eleitoral, a reserva de cadeiras para mulheres no Parlamento e a adoção de democracia interna nos partidos, que permita às mulheres voz e vez nos órgãos de direção partidária”.

Porém, o substitutivo que hoje ganha força extingue os 30% das cotas, mantém os 30% do fundo de campanha e os 5% para formação, além de propor que as deputadas federais tenham peso dobrado na contabilidade do fundo partidário. A grande treta é a reserva de 20% das cadeiras proposta pela bancada feminina.

Mas é preciso estarmos atentas ao voto do ministro Fachin, que obrigou os partidos a destinarem 30% do fundo de campanha às mulheres a partir de 2018. Fachin chegou a este número por equivalência aos 30% da lei de cotas.

Acabar com a lei de cotas será o primeiro passo para acabar com o fundo de campanha? Se essa for a ideia, vamos descobrir que não existe distinção entre líderes esclarecidos e primitivos.

Por Antonia Pellegrino e Manoela Miklos

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