Promotoria do DF pede proteção a ativista pró-aborto vítima de ameaças

13 de julho, 2018

STF vai realizar audiências públicas sobre a descriminalização da prática

(Folha de S.Paulo, 13/07/2018 – acesse no site de origem)

O Ministério Público do Distrito Federal pediu a inclusão da ativista pró-aborto Debora Diniz em programa federal de proteção a defensores dos direitos humanos. O caso está sob análise do Ministério de Direitos Humanos.

Debora é professora de direito na UnB (Universidade de Brasília) e coordenadora da Anis —Instituto de Bioética, ONG feminista que atua na promoção de políticas públicas ligadas a violações e defesa de direitos das mulheres.

A Anis serviu como consultora para uma ação do PSOL no STF (Supremo Tribunal Federal) que pretende descriminalizar o aborto de embriões de até 12 semanas.

Desde que o tema entrou na pauta do Supremo, Debora tem sofrido ameaças e intimidações em redes sociais e aplicativos de mensagens. Ela será uma das participantes da audiência pública que ocorrerá no STF em 3 e 6 de agosto.

“Um youtuber conservador fez um vídeo de enorme repercussão dizendo que eu era a figura por trás do lobby pela descriminalização do aborto no Brasil”, afirma Debora.

Além da exposição de seu nome e imagem em redes sociais, a ativista diz que tem recebido fotos de mãos empunhando armas de fogo e outras ameaças de morte —parte delas sob tortura, como uma que afirma que ela vai morrer empalada.

Debora registrou boletim de ocorrência na Delegacia da Mulher, que abriu investigação. Ela afirma que o governo do DF discute a possibilidade de escolta policial durante as audiências no STF para garantir sua integridade física.

No Brasil, o aborto só é permitido por lei em casos de estupro, risco de vida para a mãe na gravidez ou quando o feto apresenta anencefalia (quando não há desenvolvimento do cérebro) —neste último, Debora foi uma das propositoras da discussão. Partiu dela ainda a proposta de direito ao aborto a mulheres infectadas com o vírus da zika, ainda sem decisão na Justiça.

A pena para uma mulher que intencionalmente interromper a gravidez é de um a três anos de detenção.

O argumento do PSOL e da Anis é que essa criminalização da prática fere princípios e direitos fundamentais garantidos na Constituição, como saúde, dignidade, liberdade e planejamento familiar.

O pedido foi feito ao STF em março de 2017. Após oito meses sem que houvesse manifestações relevantes por parte da relatora, a ministra Rosa Weber, o PSOL acrescentou um pedido de liminar para um caso concreto, o da estudante de direito Rebeca Mendes Silva, então com 30 anos.

A estudante Rebeca Mendes, que abortou legalmente na Colômbia após ter seu pedido negado pela ministra Rosa Weber, do STF (Foto: Anis - Instituto de Bioética)

A estudante Rebeca Mendes, que abortou legalmente na Colômbia após ter seu pedido negado pela ministra Rosa Weber, do STF (Foto: Anis – Instituto de Bioética)

O CASO REBECA MENDES

Mãe de dois filhos e de baixa renda, ela pediu o direito ao aborto na Justiça para não sofrer as punições previstas no Código Penal e ter acesso ao atendimento médico devido.

Rebeca engravidou durante um período de troca de método contraceptivo, em que tentava regular o seu ciclo menstrual. Rosa Weber negou a liminar que poderia conceder a interrupção da gravidez.

Rebeca foi à Colômbia, onde o procedimento é permitido até o 3º mês para garantir a vida da mãe, salvaguardar sua saúde física e mental e em casos de estupro, incesto e deformidade severa do feto.

Ela fez um pedido baseado em riscos à sua saúde mental, teve o direito concedido e abortou no país vizinho. Ainda que o caso individual tenha sido solucionado, o STF colocou o tema em discussão para evitar mais casos desse tipo, o que acarretaria uma judicialização do aborto.

Entidades como a Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva), o Grupo de Estudos Sobre o Aborto e a ONG feminista Think Olga manifestaram publicamente repúdio às ameaças sofridas pela antropóloga Debora Diniz.

A maior parte da América Latina ainda tem legislação restritiva ao aborto. Apenas Uruguai, Guiana e Cuba permitem a interrupção da gestação em até ao menos 10 semanas. A Argentina vota o tema no Senado em 8 de agosto, após aprovação na Câmara para o aborto do feto até a 14ª semana.


ENTENDA AS AMEAÇAS  A DEBORA DINIZ

> mar.17 PSOL entra com ação no STF para análise da descriminalização do aborto de embrião de até 12 semanas. A Anis, ONG que tem como coordenadora Debora Diniz, foi consultora para a confecção da peça

> nov.17 Debora passa a sofrer ameaças virtuais após exposição de sua imagem na internet

> abr.18 A ministra Rosa Weber, relatora do caso no STF, expede edital para a realização de audiência pública sobre o tema em agosto. Ameaças a Debora, que será uma das expositoras, se intensificam

> mai.18 Debora registra na polícia ameaças de morte e violência que recebeu. Governo do DF estuda medidas protetivas

> jul.18 Ministério dos Direitos Humanos recebe pedido da Promotoria do DF para a inclusão de Debora em programa de proteção a defensores dos direitos humanos

Paulo Gomes

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