‘A demora do Estado gera mais mortes’, diz especialista sobre escalada do feminicídio

22 de janeiro, 2019

Jackeline Romio desenvolveu metodologia para analisar assassinatos de mulheres no país

(O Globo, 22/01/2019 – acesse no site de origem)

RIO – Na busca por números que auxiliem a formulação de políticas públicas, a demógrafa Jackeline Romio desenvolveu uma metodologia, publicada em seu doutorado pela Unicamp, para entender os casos de feminicídio no país. Em seu trabalho, de 2017, ela aponta que metade das mulheres mortas por agressões no Brasil, entre 2009 e 2014, foi assassinada em casa. Em relação aos óbitos referentes à violência sexual, o que chama de feminicídios sexuais, há relação com a etnia. Segundo ela, mulheres pretas, pardas e indígenas correspondem a 43% dos casos de mortes por agressão sexual no período.

O que os casos de feminicídio do início deste ano indicam?

A morte por violência doméstica é o ponto mais alto das agressões. Se chegamos a esse número de feminicídios, quantas outras estão em um processo que pode levar à morte? É um alerta para a sociedade. Quando ocorre a morte, já houve antes uma sequência de outras violações que, inclusive, podem ter sido registradas. Então, algumas delas tinham direito a medidas protetivas, e a morosidade da Justiça quando a vítima é mulher acaba levando ao óbito. É preciso que as medidas protetivas sejam expedidas com menos de 24h e que se acompanhe se essas medidas estão sendo cumpridas. Além disso, por exemplo, se uma jovem aparece nos sistemas de saúde com sinais de agressão, é preciso atenção. A negligência e a demora do Estado acabam causando mais mortes.

O que mais é preciso fazer para prevenir?

É importante manter patrulhas específicas para monitorar se as medidas protetivas estão sendo cumpridas em todos os municípios. E é preciso positivar a figura da mulher na sociedade, especialmente da negra — que elas sejam vistas em outras posições na sociedade para que sua vida seja valorizada enquanto ente importante e não desprezível a ponto de ser assassinada por sua condição de mulher. Campanhas — inclusive nas escolas — para uma nova masculinidade que não passe pelo exercício da violência também é essencial.

Sua tese aponta que negras e indígenas têm chance maior de sofrer feminicídio e violência sexual.

Há barreiras de acesso à Justiça para negras e indígenas. Elas sofrem uma violência multifacetada, em uma sociedade que tem um racismo também institucional. O racismo aumenta a forma de violação que ela sofre. Entre as mulheres, no geral, a negra está entre as mais pobres, vive em bairros periféricos, o que significa menos infraestrutura urbana. Tudo isso a deixa em situação vulnerável e amplifica as formas de violência.

Ana Paula Blower

Nossas Pesquisas de Opinião

Nossas Pesquisas de opinião

Ver todas
Veja mais pesquisas