Experimento mostra efeitos da violência sexual no cérebro das vítimas

29 de novembro, 2016

Em estudo com ratos, pesquisadores identificaram perda de memória e de capacidade de aprendizado após agressão

(Nexo, 29/11/2016 – acesse no site de origem)

Hoje, no mundo, uma a cada três mulheres já sofreu algum tipo de violência sexual. No Brasil, cinco pessoas são estupradas por hora, segundo dados mais recentes do anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Os danos podem ser físicos – lesões ósseas, musculares ou no aparelho genital, dores crônicas e problemas cardiovasculares – e psicológicos. Eles incluem, com frequência, ansiedade, depressão, abuso de álcool e drogas, maior tendência ao sexo desprotegido e ao suicídio, segundo a Organização Mundial da Saúde. As marcas psicológicas desse tipo de agressão são profundas: duram anos e dificultam a vida social e afetiva das vítimas.

Mas até recentemente não havia um estudo que medisse o impacto cerebral desse tipo de agressão. Isso foi feito pela primeira vez em 2016 por cientistas da Rutgers University, nos EUA, que criaram um modelo para medir o estresse relacionado à agressão sexual em ratos. E o resultado, embora não possa ser transposto diretamente para seres humanos, oferece evidências de que o estresse desse tipo de agressão provoca alterações no funcionamento cerebral.

Os pesquisadores perceberam que o abuso pode interferir na capacidade de aprender determinados comportamentos, inclusive os relacionados à maternidade.

Como foi feito o estudo

A violência sexual não é um comportamento exclusivo da espécie humana. Ela também acontece em uma enorme variedade de animais, dos répteis aos mamíferos. Os estudos sobre esse tipo de violência em animais, entretanto, eram focados somente nos machos. Pouco se sabia sobre a resposta das fêmeas às agressões sexuais.

Para analisar a questão, os pesquisadores criaram um modelo para medir o estresse em ratos. Eles submeteram fêmeas no início de sua idade reprodutiva a diferentes tipos de estresse: as colocaram em uma gaiola com outro rato mais velho, macho ou fêmea, ou em uma gaiola não familiar por 30 minutos diários.

Quando as fêmeas jovens eram colocadas na gaiola com machos mais velhos, frequentemente haviam perseguições e tentativas de cópula. Elas respondiam tentando escapar.

Depois do experimento, os pesquisadores mediam o nível de cortisona, hormônio relacionado ao estresse. As fêmeas que ficavam presas com os machos mais velhos eram as que tinham o maior nível desse hormônio. Ele permanecia elevado por vários dias após o experimento.

As cobaias também tiveram sua atividade cerebral monitorada com eletrodos. As que ficaram presas na gaiola com os machos mais velhos, sujeitas ao estresse decorrente da perseguição sexual, tiveram redução de novos neurônios no hipocampo, região cerebral relacionada à formação de memória.

As fêmeas expostas à agressão sexual tiveram menor capacidade de aprendizado. Isso impactou coisas banais, como aprender a reagir a um estímulo sonoro, e também o aprendizado de atividades relacionadas à maternidade.

Os pesquisadores colocaram as fêmeas com dois filhotes recém-nascidos. As fêmeas que ficaram expostas ao comportamento sexual agressivo tiveram uma redução em atitudes maternais como lamber, fazer ninhos ou agrupar os filhotes.

O que dizem os resultados

“Esse estudo é importante porque nós precisamos entender como as agressões sexuais afetam todas as espécies”, disse a pesquisadora Tracey Shors. “Também precisamos saber quais são as consequências deste comportamento para que consigamos determinar o que podemos fazer para ajudar as mulheres a se recuperarem da agressão sexual.”

É claro que, por se tratar de um estudo feito em ratos, não é possível transpor totalmente seus resultados para a espécie humana. Mas sabe-se, no entanto, que agressões sexuais estão relacionadas à síndrome do transtorno pós-traumático, doença psiquiátrica que é ligada à perda de memória e certas funções cognitivas.

“Se nós realmente vamos ajudar as mulheres que passaram por essas experiências, precisamos saber como elas estão mudando seus cérebros e seus comportamentos. Se fizermos isso, talvez possamos desenvolver intervenções mais alinhadas com suas necessidades, vida e experiências”, disse a pesquisadora responsável.

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