Paulistas lançam preparativos à Marcha das Mulheres Negras 2015

30 de julho, 2014

(Luciana Araújo / Agência Patrícia Galvão, 28/07/2014) Na noite do último dia 25 de julho, um ato em São Paulo inaugurou o processo local de organização da Marcha das Mulheres Negras 2015. Primeira iniciativa pautada nas demandas mais urgentes das mulheres afrodescendentes no país, a Marcha acontecerá na capital federal em 13 de maio de 2015 (Dia Nacional de Denúncia do Racismo). As participantes pretendem denunciar a dupla discriminação que essa parcela da população sofre – sexista e de raça – e cobrar do Estado brasileiro o compromisso efetivo com o combate ao racismo e a promoção da igualdade racial e de gênero.

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O lançamento público das atividades do grupo impulsor paulista aconteceu na mesma data do lançamento nacional da Marcha: o 25 de julho (Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e Dia Nacional de Teresa de Benguela e da Mulher Negra). “Somos alvo de discriminações de toda ordem, as quais não nos permitem, por gerações e gerações de mulheres negras, desfrutarmos daquilo que produzimos”, afirma o manifesto de convocação nacional.

As negras ainda são 60% das vítimas de óbitos violentos e de mortalidade materna por causas tratáveis, maioria entre os desempregados e ocupantes de postos de trabalho precarizados, recebem em média 54% do valor pago a homens não-negros. Estudos mostram que essas mulheres também sofrem discriminação no atendimento no SUS (Sistema Único de Saúde), o que acaba por aumentar os índices de mortes evitáveis por doenças como hipertensão, anemia falciforme, diabetes e outras.

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Enfrentar o racismo na saúde, na educação e nas instituições

A deputada federal Janete Pietá (PT) lembrou o problema das dificuldades de atendimento médico que as mulheres negras enfrentam. “Os agravantes à saúde da mulher negra estão muito relacionados ao racismo e ao racismo institucional. É necessário que batalhemos para que essa questão seja tratada diretamente pelo Ministério da Saúde. A grade curricular dos cursos de Medicina precisa tratar da questão da saúde da mulher negra, das doenças típicas das mulheres negras” afirmou a parlamentar.

“Hoje temos quatro pilares que não podemos esquecer, que foram aprovados. E como a gente fala em relação à Lei Maria da Penha, temos que afirmar: ‘Cumpra-se!'”, disse. De acordo com a parlamentar, os quatro pilares legislativos da luta racial são: a Lei nº 10.639/2003 (que estabelece a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira), o Estatuto da Igualdade Racial e o estabelecimento dos sistemas de cotas raciais para ingresso nas universidades e da reserva para negros de 20% das vagas abertas nos concursos públicos de âmbito federal. Janete lembrou também do baixo número de parlamentares negros.

Levantamento realizado pela ONG União de Negros pela Liberdade (Unegro) aponta que apenas 43 candidatos afrodescendentes se elegeram à Câmara dos Deputados em 2010, sendo sete mulheres, e dois alçaram cadeiras no Senado (nenhuma mulher).

A compositora, cantora e deputada estadual Leci Brandão (PCdoB) – segunda mulher negra a ser eleita para a Assembleia Legislativa de São Paulo – também prestigiou o evento.  Ela criticou o fato do Estado não ter ainda uma Secretaria de Políticas para as Mulheres, mantendo tais questões sob a responsabilidade de uma Coordenadoria.

Falou ainda do problema que representa para todas as mulheres, e especialmente para as negras, o modelo de funcionamento das delegacias especializadas em atendimento às mulheres vítimas de violência. “Quando uma mulher chega para fazer uma denúncia de violência, o delegado de plantão já deve mandar prendê-lo. Não pode esperar que seja levado o nome dessa mulher para ele fazer o atestado de óbito. Se mandar prender na primeira denúncia, a coisa pode ser que ande. Porque a Lei Maria da Penha existe, mas ninguém está respeitando de fato, senão não teríamos tantas mulheres mortas”. E criticou o fato de os partidos políticos burlarem o cumprimento da lei que estabelece a cota de gênero que determina um mínimo de 30% na lista de candidaturas dos partidos políticos. “Mulher laranja ninguém quer não. Queremos direito à inclusão para que passemos a ter uma participação com dignidade no Poder, seja Executivo, Legislativo ou Judiciário”.

Kika Silva, coordenadora do Fórum de Mulheres Negras de São Paulo, ressaltou que a situação vivida por mais da metade da população brasileira é produto do “racismo estruturante” do capitalismo brasileiro.

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Homenagens

Durante o evento, foram homenageados a prefeita do município baiano de São Francisco do Conde, Rilza Valentim (que falecera um dia antes em virtude de complicações derivadas de anemia falciforme), e o fotógrafo uruguaio e pesquisador de comunidades quilombolas Mário Espinosa.

A deputada Leci Brandão lembrou da carioca Cláudia Ferreira da Silva, baleada durante uma operação policial e cujo corpo foi jogado no porta-malas de uma viatura e arrastado por mais de 300 metros em uma das principais rodovias do Rio de Janeiro em março deste ano. Negra, Claudia era mãe de quatro filhos e criava outros quatro sobrinhos.

A atriz Dina Alves também apresentou uma adaptação teatral do conto “Darluz”, de Marcelino Freire, que retrata a vida de mulheres negras em situação de miséria e é baseado em uma personagem real, retratada em reportagem entregando os filhos para adoção em um cruzamento. “Darluz nasceu de uma história real, da história de muitas mulheres negras no Brasil, que são dependentes do Bolsa Família – tão criticado, mas que para muitas é a única renda que existe”, relatou Dina ao final da apresentação aplaudida de pé. “A partir desse texto [é possível] discutir a questão de raça, classe e gênero, até dentro dos movimentos e fora deles. E Darluz está aí, viva. E temos que dar voz a essa mulher. É por isso que marchamos”, encerrou emocionada.DSC_0241

 

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