Uma mulher que busca o aborto legal pode estar inserida em três contextos: a criança – muitas vezes desejada – não tem chances de sobrevida; a gravidez lhe traz o risco de morte ou é resultante da violência máxima do estupro. O fracasso, a frustração, o desespero, o horror são companheiros comuns nessa jornada. Além disso, mulheres e meninas ainda costumam enfrentar o julgamento velado ou explícito: “Como assim não vai permitir que o filho nasça?”, “Uma mãe de verdade se preocupa apenas com seus filhos”, “O que estava fazendo àquela hora naquele lugar?”, “Que roupa estava usando?”, “Se ficasse com as pernas fechadas nada disso aconteceria”.
Nem mesmo a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de proibir que mulheres vítimas de violência sexual sejam desqualificadas em julgamentos ajuda. Elas são egoístas, assassinas. E precisam pagar por isso. Que o digam as mulheres que foram estupradas e não conseguiram interromper a gravidez depois da publicação da portaria do Conselho Federal de Medicina (CFM) restringindo o procedimento em gestações com mais de 22 semanas. O ministro do STF Alexandre de Moraes suspendeu a norma. Mas, mesmo assim, uma dessas mulheres, que teve de sair da cidade onde mora no interior paulista para buscar ajuda, foi obrigada a ouvir os batimentos cardíacos do feto após três hospitais diferentes da cidade de São Paulo negarem à realização do aborto legal.