Violência e ‘abandono’ pós-eleição afastam mulheres da política, apesar de cotas

14 de janeiro, 2025 O Globo Por Nicolas Iory

Candidatas insistem menos do que os homens no projeto político e enfrentam mais dificuldade para conseguir doações diretas

A proporção de candidaturas femininas tem aumentado eleição após eleição desde que os partidos políticos passaram a ser obrigados a destinar ao menos 30% de suas vagas para as mulheres, em 2009. Se de um lado essa cota tem sido capaz de atrair mais mulheres para a política, de outro faltam mecanismos que assegurem a permanência delas para além de um ciclo eleitoral.

Das mais de 187 mil candidatas que concorreram em suas cidades na eleição de 2020, só 24% voltaram a fazer campanha em 2024, segundo levantamento do GLOBO. Entre os homens, a taxa de ‘recandidaturas’ tem sempre girado em torno de 40%.

Foram mais de 159 mil candidatas a prefeita, vice-prefeita e vereadora em todo o país no ano passado, das quais 45.307 haviam disputado também a eleição anterior. Desse grupo, só 8.221 insistiram no projeto político mesmo tendo sido derrotadas nas urnas quatro anos antes.

Segundo a cientista política Hannah Maruci, falta apoio dos partidos e das próprias famílias das mulheres que se arriscam na política, também mais suscetíveis a abandonar esse caminho por conta de uma gravidez ou pela necessidade de cuidar da família, por exemplo.

Maruci é cofundadora do instituto de formação A Tenda das Candidatas, que oferece um curso de apoio a mulheres no pós-eleições. A diretora executiva do grupo, Laura Astrolabio, diz que o treinamento oferecido pelos partidos às suas candidatas é insipiente, e que a violência de gênero é um dos principais obstáculos para a manutenção das mulheres na política.

— Para as mulheres, o percurso eleitoral é muito violento. Dentro dos partidos, nas redes sociais, nas ruas. É muito intenso e a gente acaba perdendo muitos quadros excelentes por conta do trauma que isso gera. Soma-se a isso o fato de que as mulheres têm menos tempo que os homens para a política porque fazem jornada tripla, com filhos e a casa para cuidar, além do trabalho — diz Astrolabio, que é advogada e mestre em políticas públicas.

Mayara Torres, de 29 anos, disputou no ano passado sua segunda eleição. Obteve 5.093 votos, concorrendo pelo PSB à Câmara Municipal de São Paulo e não foi eleita. Ela relata ter sido alvo de assédio durante a campanha:

— Recebi muitos comentários sobre a aparência, sobre a minha voz. Passei por várias situações que ficaram no limite da violência, do assédio, é muito frequente. A gente romantiza esse lugar da candidatura feminina, mas é muito difícil, e o resultado não depende só do esforço próprio. No geral, é eleito quem tem dinheiro ou padrinhos políticos. Mas é difícil não se abater pela síndrome da impostora, que vem da nossa criação, e não questionar a nossa capacidade.

Além de impor uma cota para candidaturas femininas, a legislação eleitoral também obriga os partidos a destinarem ao menos 30% dos recursos recebidos do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral para suas candidatas — essa mesma proporção deve também ser reservada às mulheres na propaganda gratuita no rádio e na televisão.

Embora tenham agora mais acesso a dinheiro público assegurado por lei, as mulheres ainda recebem menos que os homens, e também encontram dificuldades para conseguir doações diretas. No maior colégio eleitoral do país, por exemplo, as candidatas receberam só 17% das doações de pessoas físicas.

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