(O Estado de S. Paulo) A relação dos patrões brasileiros com os empregados domésticos vai mudar. Se o crescimento previsto para o Brasil se confirmar nos próximos anos, será cada vez menor o número de pessoas dispostas a atuar em tarefas domésticas. No ano passado, por exemplo, a participação desse grupo no total da população ocupada foi de apenas 6,6%, segundo a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do IBGE. É o resultado mais baixo desde 2003.
A redução no número de trabalhadores domésticos elevou o poder de barganha da categoria: o rendimento cresce ininterruptamente desde 2003 e o nível de formalização é o mais alto da história. É nesse cenário inédito que a categoria também se vê próxima de garantir novos direitos por meio da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) das Domésticas.
A proposta, que deve ser votada em segundo turno no Senado na terça-feira, prevê recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e jornada de trabalho de 44 horas por semana, entre outras mudanças.
A intensa disputa pela mão de obra do setor já é sentida por quem demanda o serviço. Nos 12 meses encerrados em fevereiro, o custo de uma empregada doméstica aumentou 11,83%, segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), índice oficial de inflação do País, também apurado pelo IBGE.
Para efeito de comparação, o IPCA cheio aumentou 6,31% no mesmo período.
“Por causa da oferta baixa e da demanda crescente, o preço das empregadas domésticas chegou num patamar em que muitas famílias estão abrindo mão do serviço todos os dias e optando por ter uma empregada duas vezes por semana, por exemplo, para não configurar um vínculo”, afirma Cimar Azeredo, gerente da PME.
Cenário. A mudança na situação do mercado de trabalho doméstico foi sustentada por dois motivos: aquecimento na criação de postos de trabalho e melhora na educação do trabalhador. Esses fatores fizeram com que os trabalhadores domésticos conseguissem migrar para outros ramos de atividades.
No recorte exclusivo do serviço doméstico, é possível identificar essa melhora da educação. Entre 2003 e 2012, o porcentual de trabalhadores analfabetos ou com até oito anos de estudo recuou 15,5%. Já a quantidade de profissionais com 8 a 10 anos de estudo aumentou 27,7%, enquanto a parcela dos profissionais cresceu 139,4% no período.
A queda na quantidade de trabalhadores domésticos também é considerável. Desde 2010, o recuo médio é de 2,7% ao ano.
Em 2012, o total de trabalhadores do setor nas seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE foi de 1,522 milhão de pessoas – em 2008, no auge, chegou a 1,685 milhão.
“Com a melhoria da educação e oportunidade de trabalhar em outros nichos, as trabalhadoras estão conseguindo se inserir principalmente nos serviços prestados a empresas, uma parte mais voltada para terceirização”, afirma Azeredo.
Atualmente, 95% do trabalho doméstico no Brasil é feito por mulheres. Mas há uma migração da mão de obra feminina com o desenvolvimento do mercado de trabalho. Em 2003, 16,7% da mão de obra feminina estava alocada em serviços domésticos. No ano passado, foi de 13,9%. Na contramão, o porcentual de trabalhadoras atuantes em serviços prestados à empresas avançou 3,6 pontos porcentuais no período.
Fuga. “Em geral as pessoas não gostam de ser empregadas domesticas. Sempre que possível elas deixam essa profissão”, afirma o economista Fernando de Holanda Barbosa Filho.
A mudança na estrutura do emprego doméstico deve dar uma cara mais europeizada e americanizada para o setor no Brasil. Em países de economia mais madura, ter um trabalhador doméstico todos os dias da semana é considerado luxo. Quem trabalha no setor, por sua vez, se especializa e, obviamente, cobra mais.
“A tendência é haver pessoas especializadas em serviços domésticos. Não vamos ter analfabeto fazendo esse trabalho, como era no passado. Teremos pessoas com mais escolaridade nessa função com uma remuneração mais elevada”, diz Barbosa Filho.
Acesse o pdf: Número de domésticas diminui no País (O Estado de S. Paulo – 24/03/2013)