(Carta Capital) Deputados de todos os partidos britânicos apoiam uma dura lei no estilo norte-americano que tornaria a agressão doméstica uma ofensa específica, penalizada com até 14 anos de prisão
O projeto de lei, patrocinado pelo Grupo de Sindicatos de Justiça e o Grupo Multipartidário sobre Perseguição e Assédio, faria pela primeira vez as sentenças refletirem se o abuso doméstico, tanto físico quanto psicológico, faz parte de um padrão de comportamento. Ele tem como modelo a legislação adotada nos Estados Unidos, que resultou em um aumento drástico de denúncias e condenações por agressão doméstica. Ele se segue a uma campanha bem-sucedida para aprovar novas leis contra perseguição na Inglaterra e em Gales que foram apresentadas ao Parlamento de maneira semelhante.
Atualmente não existe um crime específico de abuso doméstico definido pela lei criminal. Em vez disso, os agressores são processados por crimes como violação ou agressão. No entanto, em muitos casos a polícia, os tribunais e os promotores deixam de levar em conta o comportamento abusivo anterior do agressor. Especialistas como o serviço de liberdade condicional Napo dizem que isso é preocupante porque é raro que o abuso doméstico se limite a um incidente.
Agora, a lei proposta forneceria um quadro legal que tornaria o abuso doméstico um crime específico e permitiria o exame do comportamento do agressor durante um período de tempo. Os defensores dizem que isto incentivaria mais mulheres a relatarem um crime que com frequência é negligenciado pelo sistema de justiça criminal, às vezes com consequências trágicas. Pesquisas mostram que a vítima média não denuncia o abuso até que seja submetida a pelo menos 30 incidentes. Somente 30% dos relatos à polícia resultam em prisão e só um em cada seis relatos leva a uma denúncia.
A lei faria o abuso doméstico entrar na categoria de físico e psicológico e cometido contra a vítima ou os filhos da vítima. Definiria o abuso como “causar de modo intencional, proposital ou descuidado, ou tentar causar, ferimento físico ou dano psicológico a uma pessoa” e introduziria ordens de proteção, proibindo um agressor de fazer contato com a vítima.
“É extraordinário que o abuso doméstico não seja uma ofensa criminal no Reino Unido”, disse Harry Fletcher, um especialista em justiça criminal e assessor da Napo que redigiu a lei. “Em consequência disso, os relatos são poucos e o comportamento não é registrado pelos trabalhadores do sistema judiciário. Os índices de condenação são extremamente baixos, em 6,5%. A polícia e o Serviço de Promotoria da Coroa tendem a lidar com a questão diante deles, e não do comportamento abusivo repetitivo, em longo prazo. Esta lei tornará o abuso doméstico uma ofensa com uma pena máxima de 14 anos de prisão. Será a primeira vez que se fará uma tentativa de criminalizar um padrão de abuso doméstico neste país.”
Os defensores do projeto de lei acreditam que ele terá amplo apoio no Parlamento e provavelmente será aprovado. Desde que leis semelhantes foram adotadas nos EUA, os relatos de abusos domésticos aumentaram quase 50%. Os incidentes de violência diminuíram em mais de um terço. Fazer que o abuso doméstico seja reconhecido em termos físicos e psicológicos já foi amplamente apoiado por policiais graduados.
“O abuso doméstico se caracteriza por uma série de incidentes, um padrão de comportamento que pode incluir controle coercitivo e chantagem emocional, assim como violência física”, disse Elfyn Llwyd, o deputado do Plaid Cymru que apresentou o projeto de lei no Parlamento.
“Foi positivo que a Associação de Oficiais Chefes de Polícia no ano passado tenha emendado sua definição de abuso doméstico para considerar esse fato. Mas está na hora de que a lei criminal também seja emendada para que o abuso doméstico se torne uma ofensa criminal plena.”
Segundo o Departamento do Interior, cerca de 1,2 milhão de mulheres no Reino Unido disseram que sofreram abuso doméstico no ano passado. Dois em cada três incidentes envolveram vítimas repetidas. Toda semana, duas mulheres são mortas por um parceiro, ex-parceiro ou amante. No ano passado, 400 mil mulheres foram atacadas sexualmente, das quais 70 mil sofreram estupro ou tentativa de estupro.
Mas o verdadeiro número de vítimas provavelmente é ainda maior. Pesquisa realizada pelo grupo Citizens A vice estima que mais de 500 mil vítimas de abuso doméstico ficam amedrontadas demais para relatar suas experiências à polícia.
* Do The Observer
Acesse o PDF: Violência doméstica deverá ter lei rígida e punitiva (Carta Capital, 10/01/2014)