(Inegra, 09/01/2015) Por Miriam, por Gaia, por nós e pelo nosso povo: Mulheres Negras contra o Feminicídio e o Racismo Institucional
Nós, mulheres negras do Ceará e do Brasil, militantes de diferentes movimentos sociais, manifestamos nossa profunda indignação com a violência praticada contra as mulheres. O assassinato brutal e covarde de Gaia Molinari em Jericoacoara, em 24/12, soma-se ao de mais 265 mulheres assassinadas no Ceará em 2014. Se comparado com os números de 2013, onde 214 mulheres foram assassinadas, a taxa de feminicídio cresceu cerca de 25%. Esse número coloca o Ceará no 6º lugar no ranking nacional. O crescente assassinato de mulheres denuncia nossa cultura sexista e a incapacidade do poder público estadual em adotar ações efetivas pelo fim do feminicídio e outras formas de violência contra as mulheres.
Leia mais:
Inclusão do feminicídio no Código Penal é uma questão de igualdade e gênero, por Mariana Armond Dias Paes (ConJur, 10/01/2015)
Liberdade para Miriam França, por Dennis de Oliveira (Fórum, 07/01/2015)
O crime contra Gaia gera comoção nacional e internacional, diferentemente das outras 265 mulheres assassinadas, pelo fato dela ser um estrangeira europeia. Isso pressiona a polícia civil e a justiça do Ceará a acelerar as investigações, identificar e punir os autores do crime. Na busca de fazer justiça pela morte de Gaia, o Estado comete uma injustiça contra a farmacêutica Mirian França de Melo, acusada e presa pela polícia do Ceará por suspeita de ter cometido tal crime. Embora existam 15 pessoas suspeitas, sem nenhuma prova ou razão legal, Mirian que é uma mulher negra, encontra-se desde o dia 26 de dezembro presa na Delegacia de Capturas/CE.
Essa atitude do Estado é parte de uma história muito conhecida pela população negra em geral e mulheres negras em particular: uma história de racismo e violência institucionais que atinge diretamente nosso povo. Desumanizados pela lógica racista que nos julga por nossa cor, as mulheres e os homens negros têm sido violentados e exterminados pela violência policial e jurídica que prejulga, condena, encarcera e nega o básico direito de defesa. Amontoada em cadeias e presídios a gente preta do Brasil do século XXI revivencia os velhos navios negreiros, sujeita aos chicotes, às doenças e à morte.
Tal como Miriam, também somos cotidianamente ultrajadas pelo discurso midiático racista e sensacionalista que transforma o nosso sofrimento em espetáculo: protagonista rejeitada dos programas e páginas policiais, o trato para a nossa gente é: “atira primeiro, que depois ninguém pergunta!”.
Não, nós mulheres negras não aceitamos caladas essa situação, denunciaremos e lutaremos sempre pela nossa liberdade e de nosso povo, pelo direito à defesa e contra violações. Por isso exigimos das autoridades públicas a imediata soltura de Mirian França de Melo, e que o sistema de justiça, faça jus a si próprio, refazendo-se de sua violência e racismo! Consideramos que uma justiça e uma polícia competentes e comprometidas com a segurança pública não pode, junto com a grande mídia, mascarar o fato de que, Jijoca de Jericoacoara é um lugar inseguro para as mulheres, onde em 2012, foi considerado o 32º município do Brasil a ter o maior número de casos de violência contra as mulheres (Centro de Atendimento à Mulher – Ligue 180).
De nossa parte somos solidárias com a família e amigos de Miriam e de Gaia e com todas as vítimas desse tipo de violência naturalizada, e mais do que nunca, estaremos vigilantes e atentas!
Assinam esta Nota:
1 | UIALA MUKAJI Sociedade das Mulheres negras de Pernambuco |
2 | Alessandro Antônio Lopes Nunes – Agrônomo – CE |
3 | Articulação de Mulheres Brasileiras – AMB |
4 | Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras – AMNB |
5 | Associação Cultural de Mulheres Negras – ACMUN – RS |
6 | Associação Franciscana de Defesa de Direitos |
7 | Bamidelê – Organização de Mulheres Negras na Paraíba |
8 | Blogueiras Negras |
9 | Cecília Feitosa – Presidenta do PSOL Ceará |
10 | CEDENPA – Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará |
11 | Central Sindical Popular – CONLUTAS |
12 | Cícera Barbosa – Professora e Historiadora – Comitê Impulsor no Ceará da Marcha das Mulheres Negras – 2015 |
13 | Coletivo Feminista Luiza Mahin (Rio de Janeiro) |
14 | Coletivo Negrada – ES |
15 | Conselho Comunitário de Defesa Social do Crato – CCDS – Crato |
16 | Conselho Municipal dos Direitos da Mulher Cratense – CMDMC |
17 | Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas – CONAQ |
18 | CRIOLA – RJ |
19 | Fórum Cearense de Mulheres -FCM |
20 | Francisco Nonato do Nascimento Filho – Militante independente do Movimento Negro Ceará |
21 | Francyslene Pereira Neves Pedagoga e Presidenta do Movimento Negro de Rondonópolis/ MT |
22 | Frente de Mulheres dos Movimento Sociais do Cariri |
23 | Geledés – Instituto da Mulher Negra |
24 | Grupo Cactos, Gênero e Comunicação – PE |
25 | Grupo de Mulheres Negras Mãe Andresa do Estado do Maranhão |
26 | Grupo de Mulheres Negras MALUNGA |
27 | Grupo de Valorização Negra do Cariri – GRUNEC |
28 | GT Mulheres de Axé da RENAFRO Ceará |
29 | IMENA – Instituto de Mulheres Negras do Amapá |
30 | Instituto AMMA Psique e Negritude |
31 | Instituto Búzios |
32 | Instituto Negra do Ceará – INEGRA |
33 | Instituto Patrícia Galvão |
34 | Ivanilda Gentle – Secretária Nacional e Estadual de Mulheres Negras da Paraíba – PSB |
35 | Leticia Bezerra de Lima – Professora de Sociologia da Rede Estadual – RJ |
36 | Lúcia de Fátima Júlio – Professora |
37 | Luciana Araújo – Jornalista do Portal Compromisso e Atitude |
38 | Marcha Mundial das Mulheres no Ceará |
39 | Margarida Marques – Setorial de Negras e Negros do PSOL Ceará |
40 | MARIA MULHER – Organização de Mulheres Negras/RS |
41 | Maria Ozaneide de Paula – Secretária das Mulheres da CUT |
42 | Maria Rita Py Dutra – Escritora e pesquisadora – RS |
43 | Mayara Evelyn Oliveira da Silva – Estudante de Publicidade |
44 | Mirt´s Sants – Militante do Movimento Negro e de Direitos Humanos |
45 | Movimento de Mulheres em Luta – MML |
46 | Mulheres Negras Capixabas – ES |
47 | OLPN/MNU De Lutas, Autônomo e Independentes |
48 | Pastorais Sociais do Regional Nordeste I |
49 | Pretas Candangas – Coletivo de Mulheres Negras do Distrito Federal |
50 | Quilombo do Sacopã |
51 | Rede Afro LGBT Mineira |
52 | Rede das Mulheres de Terreiro de Pernambuco |
53 | Rede Fulanas – Negras da Amazônia Brasileira |
54 | Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares – Ceará |
55 | Rede Rádio Mamaterra |
56 | Regiane Nigro – Militante independente da Economia Solidária – SP |
57 | Rita de Cássia Hipólito – Socióloga e Professora de História e Sociologia de São Paulo |
58 | Rosana Paulino – Artista visual, pesquisadora e professora |
59 | Samiris Fraga Peixoto – Estudante |
60 | Sindicato dos Trabalhadores da UNICAMP – STU |
61 | Soraya Vanini Tupinambá – PSOL CE |
62 | SOS Racismo Brasil |
63 | Tambores de Safo |
64 | Tiago Neto da Silva – Estudante e militante da Articulação de Esquerda (PT) |
65 | UNEafro-Brasil |
66 | União da Juventude Comunista |
67 | Vilma Reis – Socióloga e Ativista do Movimento de Mulheres Negras na Bahia |
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