(Rede Brasil Atual, 09/05/2015) Trabalhadores negros são excluídos de empregos com maior relevância econômica desde o início do período republicano. Confira também lançamentos de Ferréz e Lenine, a Semana do Brincar em todo o país e um sarau feminista na Casa das Rosas, em São Paulo
“Precisa-se de uma boa lavadeira e engomadeira branca para lavar em sua própria casa.” “Lavadeira branca para senhor só.” “Lavadeira, que saiba engomar, branca, para casa de família.” “Precisa-se de perfeita cozinheira estrangeira, que durma no aluguel, tratar-se Av. Paulista, 60.” O racismo no início do século 20 no Brasil não era velado, como mostram esses anúncios publicados originalmente no jornal Diário Popular, entre 1912 e 1913. A escravidão no Brasil durou mais de 350 anos e marcou de maneira profunda a formação econômica, social, política e cultural do país – e seus efeitos perversos continuam até hoje.
É por isso que o historiador Ramatis Jacino debruçou-se em pesquisas durante quatro anos, na tentativa de compreender as razões e os mecanismos da exclusão da mão de obra negra na cidade de São Paulo, o epicentro econômico e financeiro do país nas primeiras décadas da República. Resultado de trabalho que lhe deu o título de doutor em História Econômica pela Universidade de São Paulo (USP), o livro Transição e Exclusão – O Negro no Mercado de Trabalho em São Paulo Pós-Abolição – 1912/1920 (Nefertiti Editora, 226 págs.) constata que houve uma opção por “branquear” o mercado de trabalho por parte das elites, que ao privilegiar os imigrantes europeus negaram ao homem e à mulher negra ocupações valorizadas socialmente e mais bem remuneradas.
“A ideia de pesquisar a exclusão do negro no mercado de trabalho ao final do período escravista surgiu durante a minha graduação, quando pensei em buscar as razões da atual discriminação que homens e mulheres negras vivenciam no mercado de trabalho e na sociedade”, afirma Jacino. O autor comprovou que mesmo atividades historicamente consideradas “ocupações de negros” – serviços domésticos, comércio de rua, atendimento a saúde e demais atividades até então consideradas desprezíveis para brancos – começaram a ser disputadas pelos imigrantes europeus. Estes eram favorecidos por “ações administrativas” protagonizadas pelos setores abastados da cidade e até mesmo pela legislação que, implícita ou explicitamente, proibia que homens e mulheres negras ocupassem certas vagas.
As razões para esse “branqueamento” do mercado de trabalho, segundo o pesquisador, são as opções ideológicas das elites daquele período, em especial das oligarquias cafeeiras paulistas. “Por serem profundamente racistas, compreendiam que o crescimento e a modernização do país pressupunha o ‘branqueamento’ do seu povo. Os efeitos desse ‘branqueamento’ são econômicos, pois homens e mulheres negros ainda estão condenados aos trabalhos mais insalubres, mais mal remunerados e mal valorizados socialmente; são sociais, pois os descendentes de escravizados continuam marginalizados; são políticos, pois estão sub-representados nos espaços de poder; e são culturais, uma vez que a extraordinária contribuição cultural dos descendentes de africanos permanece desprezada, demonizada, criminalizada ou, na melhor das hipóteses, tratada como ‘folclore’”, lamenta Jacino.
Xandra Stefanel
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