(Agência Brasil, 06/11/2015) Renata da Silva não trabalhava, “vivia com dificuldades, às custas da mãe”, até que decidiu aproveitar a oportunidade aberta pelo Projeto Mão na Massa e teve a vida transformada. O projeto capacita mulheres em situação de vulnerabilidade social, com idade entre 18 e 45 anos e escolaridade a partir do 5º ano do ensino fundamental, para trabalhar na construção civil. Renata destacou que o projeto representou tudo para ela: “Depois do Mão na Massa, minha vida melhorou 1.000%”.
Ela fez o curso de carpintaria e se tornou profissional, sendo contratada, com mais cinco colegas do projeto, pela Cofix Construções e Empreendimentos, uma das primeiras empresas do setor, no Rio de Janeiro, a acreditar no potencial feminino para esse trabalho, considerado até então exclusivo de homens. Incentivadas por Renata, a filha e a irmã dela também se inscreveram no projeto, sendo selecionadas. “Está todo mundo na construção civil”. Com os cursos profissionalizantes que fizeram, Renata e a filha estão melhorando a casa em Bangu, na zona oeste da capital, que era “um barraco feio e agora está ficando bonitinho”, segundo elas.
“Eu sou culpado por trazê-las para cá”, disse o empresário João Fernandes, presidente da Cofix, parceiro desde o início do Projeto Mão na Massa. “É muito importante esse trabalho”. Ele ainda vê um pouco de discriminação dos homens em relação às mulheres no canteiro de obras, mas acredita que isso será superado com o tempo. Alguns problemas deverão ser resolvidos, como vestiário e banheiro específicos para mulheres. Para Fernandes, as operárias têm mais facilidade em fazer serviços de qualidade e são mais cuidadosas do que os homens em relação à segurança. “Acho ótimo”. Ele pretende contratar mais mulheres para a companhia, especializada em formas de concreto.
Com o apoio da Petrobras desde 2007, o Mão na Massa chega à 14ª edição, superando o total de mil mulheres capacitadas, informou a engenheira civil e técnica em edificações Deise Gravina, idealizadora do projeto. Para ela, foi alcançado o objetivo de encontrar uma porta de saída de um ciclo vicioso de miséria e mudar o paradigma do Brasil inteiro, porque foi o pioneiro. Ninguém antes tinha pensado em colocar mulher trabalhando na construção civil, nas profissões mais pesadas”. O projeto assegura formação profissionalizante gratuita a mulheres de baixa renda, que se empregam em canteiros de obras como pedreiras, pintoras, carpinteiras, encanadoras e eletricistas.
A metodologia do Mão na Massa foi copiada por diversos municípios do país. “Hoje, você vê mulheres trabalhando em obras em todo o Brasil”. O projeto beneficia mulheres com vulnerabilidade social, de baixa renda, muitas vítimas de violência doméstica. A base para a criação do projeto foi um diagnóstico feito na comunidade do Rato Molhado, no Jacaré, zona norte da capital fluminense, no qual 216 mulheres entrevistadas indicaram que gostariam de fazer curso na construção civil, aproveitando que já faziam pequenos reparos em casa. “Foi o nosso pontapé inicial. Acho que era o último nicho que faltava a nós, mulheres, invadir”, comentou Deise”.
Quando conseguiu que a primeira empreiteira contratasse as novas profissionais, os resultados apurados surpreenderam e a demanda começou a crescer, contou Deise. “A ponto de formarmos a última turma e já não termos mulheres para mandar para as empresas. Todas já estavam empregadas”. Segundo a engenheira civil, as mulheres são mais detalhistas e mais econômicas que os homens e usam os equipamentos de segurança.
Mudança de cultura
As mulheres, completou Deise, mudam a cultura do canteiro de obras. “O linguajar dos operários muda, bem como a forma de se comportarem. Como elas entram com o curso técnico, não podem ser contratadas como serventes. Com isso, os homens também voltaram a estudar. Onde elas entram, realmente dão banho”. Outro fator que leva as empresas da construção a dar preferência à contratação de mulheres é que elas não recusam tarefa, destacou Deise Gravina. “Elas não ‘morcegam’, na linguagem do setor, e quando terminam um serviço, pedem outro. Estão sempre prontas a fazer hora extra, porque ajudam muito no orçamento familiar. O dinheiro que recebem investem na família, na melhor alimentação, na melhor educação dos filhos”.
Para cada turma de 60 mulheres, são feitas em média 300 inscrições. Deise lembrou que a profissionalização recupera a autoestima dessas mulheres, que resgatam também seus direitos, a cidadania. Muitas se separam porque apanhavam dos maridos e eram humilhadas. “Quando conseguem a independência, resolvem seguir seu próprio caminho”. O curso dura de cinco a seis meses, dependendo da profissão. O índice de empregabilidade é elevado, acima de 60%.
O sucesso do projeto atraiu mulheres de comunidades de outros municípios, como Nova Iguaçu, Belford Roxo e São João de Meriti, na Baixada Fluminense, e Niterói e Itaguaí, na região metropolitana do Rio. A ideia agora é levar a metodologia do Mão na Massa para todo o país, principalmente para as chamadas “mulheres viúvas das obras”, cujos homens vão embora ao fim de um grande empreendimento, atrás de novas oportunidades de trabalho, e deixam a família para trás. “É uma forma de aproveitar mão de obra e resgatar essas pessoas”.
Proporcionalmente, Deise disse que as mulheres estão conseguindo mais colocações dentro das obras do que os homens, porque trabalham em uma fase mais cara, que é a de acabamento. No fim deste mês, o projeto formará mais 140 mulheres, que terão como madrinha a jornalista Leda Nagle, apresentadora do Programa Sem Censura, da TV Brasil. As aulas teóricas do projeto são dadas no Abrigo Maria Imaculada, enquanto as aulas práticas ocorrem no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai).
Alana Gandra; Edição: Graça Adjuto
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