(RFI, 03/05/2016) A plataforma de artigos Rue89, do grupo francês de comunicação L’Obs, publica uma matéria nesta terça-feira (3) sobre o crescimento da mobilização das mulheres brasileiras contra o sexismo e a misoginia. “Em um país extremamente machista, as feministas do Brasil tentam ser ouvidas se manifestando nas redes sociais: uma estratégia recente que dá certo”, escreve o jornalista Jean-Matthieu Albertini.
O Rue89 abre a matéria falando do episódio “Bela, recatada e do lar”. “Milhares de fotos de mulheres invadiram a internet brasileira nos últimos dias”, escreve Albertini, explicando a origem da mobilização. “O objetivo: rir um pouco, mas sobretudo ridicularizar uma matéria da conservadora e poderosa revista Veja”, diz.
O jornalista ressalta que, na controversa publicação, a esposa do vice-presidente Michel Temer, “provável próximo presidente do Brasil em caso de impeachment de Dilma Rousseff”, é apresentada como a primeira dama ideal. “A matéria a descreve como a mulher perfeita, porque ela é ‘bela, recadata e do lar’. Não foi preciso mais nada para inflamar a internet”, avalia Albertini.
“Brasil é um país extremamente machista”
O Rue89 lembra que esta não é a primeira manifestação feminista a invadir a web brasileira, sublinhando que desde 2013 campanhas contra o machismo se multiplicam nas redes sociais. E contextualiza: “O Brasil é um país extremamente machista: em 2012, 4.719 mulheres foram assassinadas, frequentemente por seus maridos”.
Albertini diz que as mulheres brasileiras começaram a despertar para o movimento feminista com a popularidade de uma campanha contra o assédio sexual nas ruas, a #chegadefiufiu, realizada pelo coletivo Think Olga.
No final de 2015, outra manifestação feminista nas redes, a #meuprimeiroassedio tomou conta das redes sociais no país. O motivo, explica o jornalista, foi a reação inapropriada de alguns internautas aos atributos físicos de uma participante do Master Chef Junior, de apenas 12 anos. “Centenas de homens publicaram tweets de caráter pedófilo sobre a adolescente”, publica Rue89.
Neste momento, o Brasil tomou consciência da gravidade do assédio sexual, diz Albertini. Ele lembra que a campanha foi apelidada de “a primavera das mulheres” pela mídia do país e a hashtag #meuprimeiroassedio contabilizou mais de 11 milhões de buscas. “Mais importante, a campanha saiu do meio virtual e passou a fazer do debate nas mesas de bar, nos jantares de família, de conversas entre maridos e mulheres, mães e avós”, reitera.
Políticos conservadores acirraram ânimos das brasileiras
Para o jornalista, a eleição de uma câmara de deputados extremamente conservadora, em 2014, também estimulou as mulheres a se engajarem. No começo de 2015, a chegada de Eduardo Cunha, deputado evangélico, à liderança da casa, estremeceu as feministas. Logo que assumiu a presidência da câmara, Cunha declarou que a legalização do aborto não passaria nem mesmo sobre seu cadáver.
Os projetos de lei do deputado, como o PL 5069, acirraram ainda mais os ânimos das brasileiras. Albertini explica que a polêmica proposta, da qual Cunha é um dos autores, complica e limita o atendimento hospitalar às vítimas de violência sexual, dificultando o aborto em casos nos quais a prática é legal no Brasil.
Engajamento incita a ira dos machistas
“Essa nova visibilidade das mulheres não agradou a todos”, publica Rue89. O crescimento do movimento feminista também incitou a ira dos machistas, que se manifestam, sobretudo, nas redes sociais. Ataques cibernéticos contra sites, blogs e páginas no Facebook são constantes, lembra o jornalista, ressaltando a revolta dos que apelidaram as militantes de “feminazis”.
Albertini entrevistou uma integrante do coletivo Não me Kahlo, Bruna Leão, para quem essa reação exacerbada dos machistas não é de todo negativa. “Cada vez que um movimento progressista ganha amplitude, os reacionários entram em pânico. Quanto mais eles se mobilizam, mais temos provas de que estamos ganhando terreno”, diz a militante à Rue89.
Daniella Franco
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