(Jornal do Brasil, 19/05/2016) Na Sessão Plenária de quinta-feira (12 de maio) o importante obstetra e ultrassonografista Acadêmico Carlos Montenegro apresentou o tema “Síndrome do Zika vírus Congênita”. Montenegro que é autor do primeiro livro nacional sobre ultrassonografia em obstetrícia e coautor de “Obstetrícia Fundamental” iniciou a apresentação afirmando que a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou em 1º de fevereiro de 2016, a microcefalia como emergência mundial em saúde pública.
Discorrendo sobre a importância da existência de um diagnóstico diferencial entre zika, chikungunya e dengue, o Acadêmico Montenegro afirmou que a zika é caracterizada principalmente pelo aparecimento de exantema (manchas avermelhadas pelo corpo) e conjuntivite. Todavia, o fato de 80% dos casos de zika serem assintomáticos dificulta a avaliação da epidemiologia da doença, cujo quadro evolutivo mais grave é a síndrome de Guillain-Barré – doença autoimune na qual o corpo, para combater um micro-organismo, como vírus ou bactéria, acaba atacando a si próprio –que, possui uma incidência de 0,24 a cada mil casos.
Apresentando os últimos estudos sobre a associação entre o zika vírus e os casos de microcefalia, o Professor Montenegro afirmou que, uma vez que a microcefalia não é a única comorbidade registrada nos casos de zika vírus em gestantes, a nomenclatura utilizada atualmente é de “síndrome zika vírus congênita”.
Com relação à infecção pré-natal, mostrou que esta se dá uma vez que o vírus atravessa o tecido placentário, afetando principalmente o cérebro do feto. O período de 4 a 8 semanas é considerado crítico, tendo em vista que é onde ocorre a maior parte dos casos de microcefalia. Também foi mencionado que, no alerta epidemiológico de microcefalia lançado em 1º de dezembro de 2015 pela OMS, o Brasil foi considerado epicentro – a taxa de casos registrados, que em 2010 era de 57 por 100 mil casos, aumentou em vinte vezes no ano de 2015.
O Acadêmico Montenegro apresentou, então, um histórico do zika vírus no mundo, afirmando que as primeiras evidências do vírus foram encontradas na Floresta Zika, em Uganda, onde até então não há registro de surtos ou epidemias da doença. Após esses registros, entre os anos de 2012 e 2014, notificações da doença foram feitas na Polinésia Francesa.Os primeiros casos da doença no Brasilforam registrados em 2015, em especial na região Nordeste do país. Para o Acadêmico, conhecer estehistórico é importante para reconhecer qual a estrutura do vírus encontrado no Brasil, facilitando a identificaçãodo tratamento adequado e as estratégias para o controle da epidemia.
No que se refere à microcefalia, foram apresentadas as formas de diagnóstico disponíveis atualmente. Na gravidez, é possível realizar diagnóstico por meio de ultrassonografia cefálica; todavia, o diagnóstico por meio deste método não é possível no primeiro trimestre de gravidez, sendo possível apenas a partir de 20 semanas de gestação. Já no recém-nascido, o diagnóstico é feito por meio da medida do perímetro cefálico.
Apresentou estudos de sua ex orientanda e brilhante ultrassonografista, atualmente trabalhando na Paraíba, Dra. Adriana Oliveira Melo, que está à frente dos estudos mais importantes a nível internacional, sobre a relação entre o zika vírus e a microcefalia. A Dra. Oliveira Melo publicou seus achados na prestigiosa revista Ultrasound in Obstetrics and Gynecology no início de 2016.
A síndrome Zika vírus vai muito além da microcefalia, podendo causar entre diversas outras anomalias a hidro-anencefalia (líquido com ausência de cérebro), ascite (líquido intra-abdominal) e derrame pleural.
Como exemplo das reações que a epidemia tem suscitado mundialmente, Montenegro apresentou matéria na qual o principal comissário de Direitos Humanos da ONU, Zeid Ra’ad Al Hussein, solicita que os países com o zika vírus disponibilizem aconselhamento sobre saúde sexual e reprodutiva para mulheres e, de acordo com as legislações nacionais, permitam o direito ao aborto.
Por fim, como resultado do estudo desenvolvido pelo próprio Acadêmico Montenegro, foi apresentado um “algoritmo do zika vírus”, que constitui um conjunto de medidas que visa proteger a saúde das gestantes e tornar mais eficaz a identificação dos casos de microcefalia. De acordo com esse algoritmo, em regiões onde há incidência de zika vírus, a gestante sem apresentação de sintomas deve manter uma rotina de realização de ultrassonografia nos três trimestres de gestação: entre a 11º e 13º semanas; 23º e 24º semanas e por fim com 32 semanas. Na gestante que possui a doença, a rotina incluiria também a realização de ultrassonografias semanais no último trimestre e uma ressonância magnética na 32ª semana, para identificação de sinais de microcefalia.
O Acadêmico Carlos Montenegro ressaltou a importância da discussão de um tema tão importante como este no âmbito da Academia Nacional de Medicina e finalizou a palestra alertando que é preciso que o debate e a difusão de informação sejam constantes, principalmente em razão do surgimento de novos dados.
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