Pela hashtag #EuViviUmRelacionamentoAbusivo, mulheres relatam situações em que foram vítimas de agressões psicológicas e até físicas
“Quando consegui arrumar emprego, percebi que ele não ficou feliz. Dava impressão de que se sentia inferior a mim. Quando eu saía, enviava fotos da roupa para ele saber o que eu estava vestindo.” O relato de Mayara, de 21 anos, é um entre várias manifestações de mulheres sobre relacionamentos abusivos.
(O Estado de S.Paulo, 11/04/2017 – acesse no site de origem)
O tema ganhou as redes sociais nesta terça-feira, 11, após Marcos Harter, de 37 anos, ser expulso da 17.ª edição do reality show Big Brother Brasil (BBB) supostamente por agredir Emilly Araújo, de 20 anos. Pela hashtag #EuViviUmRelacionamentoAbusivo, mulheres relataram situações em que foram vítimas de agressões psicológicas e, em alguns casos, até mesmo físicas por parte dos parceiros. A discussão entrou nos Trending Topics – lista dos assuntos mais comentados – do Twitter nesta terça. Harter aproveitou a rede para se defender. “Jamais tive intenção de a machucar física ou emocionalmente.”
Leia mais:
Mulheres usam hashtag no Twitter para relatar casos de relacionamentos abusivos (Agência Brasil, 11/04/2017)
Após expulsão de Marcos do BBB, mulheres relatam relações abusivas (O Globo, 11/04/2017)
Mulheres contam histórias de relacionamento abusivo após eliminação no BBB (UOL, 11/04/2017)
Na web, as vítimas denunciaram abusos por parte dos parceiros como o controle sobre dinheiro, amizades e senhas. “Na minha festa de aniversário, ele não foi, mas eu tinha de conversar o tempo inteiro com ele pelo celular”, conta Mayara, que trabalha no setor financeiro de uma empresa. O relacionamento foi o segundo em que a jovem se sentiu agredida psicologicamente. “No primeiro, eu aceitava migalhas porque achava que ele era o melhor. Ele ia à minha casa quando queria e eu ficava à disposição dele”, diz.
De acordo com a psicóloga Raquel Silva Barretto, nos relacionamentos abusivos há uma concentração de poder. Identificar o problema, no entanto, é um desafio. “Os sinais são sutis. Parece um conto de fadas, mas, desde o começo há um excesso de controle mascarado sob forma de zelo”, explica ela, doutoranda em Saúde Pública, com ênfase em saúde e violência, pela Fundação Oswaldo Cruz, e colaboradora do blog Livre de abuso.
Para a estudante Ana Luiza Costa, o início do namoro foi como muitas histórias de princesas. “No começo é sempre aquele ‘mar de rosas’. Ele me dava presentes e queria muito que eu os usasse. Quando não usava o tempo todo, ele ficava chateado, e então foi piorando: queria que eu usasse somente o que ele me dava”, conta a jovem de 18 anos.
“Fui me percebendo cada vez mais sem amigos, sozinha, ouvia sempre que ele era a melhor pessoa que eu já tinha ficado e que nunca ia achar alguém melhor. Me sentia mal quando fazia algo melhor do que ele, o que muitas vezes me levava a mentir para ele se sentir melhor consigo mesmo.” Segundo Raquel, o controle emocional das vítimas – que na maioria dos casos é mulher – pode desembocar em agressões físicas.
“Ele dizia que ia se matar”, conta a estudante Bruna Ogliari, de 18 anos, sobre a tentativa de por fim a um relacionamento abusivo. Após dois envolvimentos desse tipo, ela se sente insegura para se relacionar novamente. “Não consigo confiar.” Os términos não foram fáceis. “Sabia que estava em um relacionamento abusivo, mas não conseguia sair. Terminei depois de um tempo e com ajuda de pessoas próximas”, diz ela. Apesar de ter conseguido encerrar os namoros, relata que passou a reproduzir o comportamento dos parceiros. “Passei a ser abusiva em meus outros relacionamentos. Fiquei insegura a ponto de não conseguir confiar e ter senhas de tudo.”
Cópia. Para Mayara, as agressões também criaram o temor de que ela reproduzisse abusos com outras pessoas. A jovem conta que teve crises de choro ao notar que estava se comportando com o atual namorado da mesma forma que os ex-companheiros. “Tenho medo de ser abusiva porque nunca fui tratada diferente disso.”
Ela acredita que a visibilidade do tema nas redes sociais pode ajudar outras vítimas. “Acho que, quanto mais a gente falar, mais as pessoas vão ver que não estão sozinhas. Hoje tuitei três frases que o meu último ex me dizia e uma menina me mandou uma DM (mensagem no Twitter) para falar que estava na mesma situação.”
CONHEÇA AS CARACTERÍSTICAS DE UM RELACIONAMENTO ABUSIVO
1. Zelo em excesso.
Os sinais de um relacionamento abusivo são sutis e podem ser confundidos com cuidado. “O parceiro se faz muito presente, na porta da universidade, no trabalho, o tempo todo”, diz a psicóloga Raquel Silva Barretto.
2. Ciúmes de tudo e todos
Outro ponto em comum é ciúme extremo. “No meu consultório, clientes relatam ciúmes de tudo: da família, dos amigos de infância, das roupas que elas usam e dos lugares que vai.”
3. Controle.
O abusador passa a querer mudar o comportamento da companheira. “Começam a haver brigas e ele tenta usar características pessoais para diminuí-la.”
4.Violência.
No auge, o parceiro se torna explosivo e pode partir para agressão física e sexual. Pessoas nessa situação devem procurar ajuda de amigos e familiares e apoio psicológico.
Júlia Marques,
O Estado de S. Paulo