(iG) A aplicação da lei para os criadores e incentivadores do chamado “rodeio das gordas” constitui um processo pedagógico e não mera punição. Essa é a opinião da antropóloga Paula Miraglia, diretora geral do International Centre for the Prevention of Crime e especialista em segurança pública, justiça e cidadania. Leia o artigo na íntegra:
“Justiça pedagógica
O Ministério Público usou a Lei Maria da Penha para estabelecer um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC) com dois jovens que participaram do “Rodeio das Gordas”. A ação é resultado do inquérito instaurado em outubro de 2010 para apurar a competição criada informalmente entre os campi da Universidade Estadual Paulista, onde estudantes eram abordadas por colegas homens, que tinham como objetivo agarrá-las e “montá-las” durante o maior tempo possível.
A perversão da agressão é chocante. O fato de que tenha acontecido no ambiente universitário consegue tornar o episódio ainda mais assustador. Além da violência em si, revela preconceitos de toda ordem misturando desrespeito às mulheres com estereótipos relacionados ao tipo físico.
O caso evoca uma série de elementos comuns em situações semelhantes. A atuação em grupo parece deixar as pessoas mais confortáveis para a prática do abuso. Esse parece mais legítimo quando praticado coletivamente. A divulgação das imagens na internet, ao mesmo tempo em que dá visibilidade imediata ao acontecido, reduz a responsabilização, já que ganha cúmplices instantâneos em seus espectadores. Para as vítimas, é uma forma de perpetuar sua humilhação.
Imediatamente após ser divulgado, o caso gerou uma onda de reações. A universidade não se absteve e criou uma comissão para apurar as agressões, O Ministério Público instaurou um inquérito civil e a comunidade discente se mobilizou, deixando claro que não compactuava com a atitude.
Esse tipo de intolerância positiva é um atalho importante para a prevenção e combate de violências alimentadas pelo preconceito. A coerção social amparada pela Justiça manda uma mensagem clara dos nossos limites.
Quando casos de homofobia, racismo ou mesmo outros tipos de agressões contra a mulher são aceitos socialmente ou pelo menos tolerados, estamos inspirando a Justiça a ser menos enfática.
O caso também mostra como a aplicação da lei pode ser um processo pedagógico e não mera punição. De acordo com o TAC assinado, os jovens vão responder por dano moral coletivo e terão de pagar uma indenização de 20 salários mínimos cada um a três instituições dedicadas à prevenção e ao combate da violência de gênero e à dependência química.”
Acesse o artigo na íntegra: Justiça Pedagógica, por Paula Miraglia (iG – 2/09/2011)