A promotora de Justiça do Estado de São Paulo Gabriela Manssur lista mitos e verdades da Lei Maria da Penha
(Revista Trip, 09/10/2018 – acesse no site de origem)
No dia 7 de agosto, a Lei Maria da Penha completou 12 anos de existência. Embora já seja do conhecimento popular, diversos mitos permeiam sua funcionabilidade. “Eu poderia dizer que é uma lei perfeita, não fosse ainda a falta de estrutura e investimento em recursos humanos e materiais para a sua completa efetividade”, acredita a promotora de Justiça do Estado de São Paulo Gabriela Manssur, homenageada pelo Trip Transformadores 2018.
Segundo Gabriela, ao longo desses 12 anos, grande parte das instituições e profissionais que atuam na aplicação da lei se mostrou cada vez mais consciente e sensibilizada de que, nos crimes de violência contra a mulher, a punição isoladamente não basta. É preciso um atendimento acolhedor para a mulher, proteção integral da Justiça e o encaminhamento devido de ambas as partes envolvidas no processo.
“A mulher em situação de violência não consegue sair desse ciclo sozinha. Ela precisa de todo tipo de apoio, pois passará por vários momentos de medo, vergonha, arrependimento e culpa”, conta Gabi. Na tentativa de minimizar esses sintomas, ela listou mitos e verdades sobre a Lei Maria da Penha. Leia abaixo, informe-se e, em caso de agressão, denuncie: ligue 180 (Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência).
1 – Mulheres voltam com seus agressores por dependência emocional, financeira e medo
VERDADE: Aproximadamente 50% das mulheres voltam com os parceiros por entender que não conseguem viver sem eles, ou então por não terem renda própria e sentirem medo de que algo pior possa acontecer caso ela denuncie o agressor. Outras 60% nem chegam a denunciar o parceiro com a esperança de que ele mude de comportamento. Isso não funciona. Ninguém muda ninguém. Ele só vai mudar se quiser e tiver oportunidade.
2 – Não há necessidade de acompanhamento psicológico e apoio de amigos e familiares para ajudar a vítima a sair do ciclo da violência
MITO: A mulher em situação de violência não consegue sair desse ciclo sozinha. Ela precisa de todo tipo de apoio, pois passará por vários momentos de medo, vergonha, arrependimento e culpa. Ninguém precisa passar por isso sozinha. Ajude, você pode salvar uma vida.
3 – Sempre é possível retirar a queixa
MITO: Nos crimes de violência física a mulher nunca pode desistir. Só é possível “retirar a queixa” no crime de ameaça, desde que a vítima seja ouvida em audiência para saber se está desistindo de livre e espontânea vontade, ou se está sendo coagida a mudar o discurso.
4 – A lei Maria da Penha pode ser usada por todas as mulheres do gênero feminino
VERDADE: Independentemente do sexo biológico, se a pessoa se identifica com o gênero feminino e sofre violência por conta disso, ela será protegida pela Lei Maria da Penha (art. 5º da Lei 11.340/2006).
5 – É configurada violência doméstica somente quando há agressão física
MITO: Não espere o primeiro tapa. A violência psicológica muitas vezes antecede as agressões físicas, e causa danos emocionais gravíssimos. Preste atenção aos mínimos sinais de controle, excesso de ciúmes, humilhação, xingamentos e desqualificações constantes.
6 – Mulheres independentes financeiramente também sofrem violência e têm dificuldade para se livrar de relacionamentos abusivos
VERDADE: A independência financeira não garante a autonomia da mulher. Muitas mulheres ricas e escolarizadas sofrem caladas, sentem vergonha e medo de ficarem sozinhas.
7 – Para aplicar a Lei Maria da Penha, o agressor tem que ser marido da vítima ou dividir o mesmo teto
MITO: A lei é clara, e abrange todas as relações íntimas de afeto e/ou de parentesco e/ou de convivência no mesmo ambiente familiar. Podem ser relações atuais ou passadas, e independem do tempo de convivência.
8 – Os filhos são afetados quando presenciam a mãe sendo agredida
VERDADE: São os chamados “filhos da violência”. 67% dos casos de violência doméstica acontecem na frente dos filhos, e as consequências são graves e muitas vezes irreversíveis: baixa autoestima, problemas com álcool e drogas, automutilação, depressão, síndrome do pânico, baixo rendimento escolar e agressividade. Infelizmente muitos deles acabam reproduzindo a violência.
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9 – O agressor sempre será preso
MITO: Nos casos de violência contra a mulher, o agressor será preso sob algumas condições. Em flagrante do delito; se descumprir a medida protetiva ou se, pela gravidade dos fatos — ameaçar vítima e testemunhas, ser reincidente, não tiver ocupação lícita ou residência fixa —, for decretada sua prisão preventiva.
10 – Lugar de mulher é onde ela quiser
VERDADE: Faça suas escolhas. E se alguém falar que você não pode, não vai ou não deve, use a Lei Maria da Penha. Garanto que ela funciona.
Camila Eiroa