(Bem Estar, 29/02/2016) Pesquisa avaliou pacientes que tiveram a síndrome na Polinésia Francesa. País teve surto de zika entre outubro de 2013 e abril de 2014.
Um estudo publicado nesta segunda-feira (29) encontrou novas evidências de que o vírus da zika pode estar relacionado a casos de Guillain-Barré. A síndrome afeta o sistema nervoso e pode provocar fraqueza muscular e paralisia – geralmente temporária – dos membros. A possível ligação entre zika e Guillain-Barré já vinha sendo avaliada por especialistas há algum tempo.
A pesquisa, liderada pelo Instituto Pasteur de Paris e divulgada na revista científica “The Lancet”, avaliou amostras de sangue de 42 pessoas diagnosticadas com Guillain-Barré no Centro Hospitalar da Polinésia Francesa (CHPF) durante o surto de zika que afetou o território do Pacífico Sul entre outubro de 2013 e abril de 2014.
Todos os 42 pacientes tiveram amostras de sangue coletadas que passaram por testes sorológicos para verificar a presença de anticorpos contra o vírus da zika. Os resultados mostraram que 41 pacientes, 98% do total, tiveram zika.
Enquanto isso, na população geral, a incidência de zika foi de 36%. O grupo controle, usado para estimar a proporção de casos de zika na população geral, foi composto por 98 pessoas que se consultaram no CHPF por queixas não relacionadas a zika ou Guillain-Barré, das quais 35 apresentaram anticorpos que apontavam para a infecção por zika.
Estudos anteriores já tinham apontado para a ocorrência de aumento de casos da síndrome simultaneamente à ocorrência de surtos de zika, porém esta foi a primeira vez que exames sorológicos foram feitos para constatar essa ligação.
“Este é o primeiro estudo a avaliar um grande número de pacientes que desenvolveram a síndrome de Guillain-Barré depois de uma infecção pelo vírus da zika e a fornecer evidência de que o vírus da zika pode causar a síndrome de Guillain-Barré”, disse o principal autor do estudo, o professor Arnaud Fontanet, do Instituto Pasteur, em Paris.
O estudo também buscou identificar se um histórico de dengue poderia contribuir para o desenvolvimento de Guillain-Barré nos pacientes, mas não obteve resultados conclusivos sobre essa questão.
Durante o surto de zika na Polinésia Francesa, houve cerca de 32 mil casos suspeitos de zika.
Aumento de casos na América Latina
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), quatro estados do Nordeste – Alagoas, Bahia, Piauí e Rio Grande do Norte – tiveram aumento superior a 100% no número de casos da síndrome de Guillain-Barré em 2015. O aumento total na incidência do problema no país foi de 19% em 2015, em relação a outros anos.
Ainda segundo a OMS, os casos do distúrbio neurológico aumentaram em cinco países: Além do Brasil, também na Colômbia, El Salvador, Suriname e Venezuela.
Quais são os sintomas da síndrome de Guillain-Barré?
A síndrome de Guillain-Barré – que pode afetar pessoas de qualquer idade, especialmente adultos mais velhos – começa a se manifestar por formigamento nos pés e pernas. A sensação tem caráter ascendente, ou seja, vai subindo para os joelhos, coxas, mãos e braços.
O formigamento e a alteração da sensibilidade dos membros vêm acompanhado de fraqueza nos músculos e paralisia. Os sintomas podem atingir os músculos da face e da respiração, o que faz com que o paciente precise ser tratado em unidades de terapia intensiva (UTI).
Há risco de o paciente ficar com sequelas?
A síndrome de Guillain-Barré é considerada uma doença de prognóstico favorável pelos médicos. Em 85% dos casos, há uma recuperação praticamente completa que pode levar de dois a quatro meses. Em 15% dos casos, pode haver sequelas, desde as mais leves, como fraqueza nos pés ou dormência, até as mais significativas, em que os pacientes podem perder a capacidade de andar.
Quais são as causas da doença?
A síndrome de Guillain-Barré ocorre, na maioria das vezes, algumas semanas após uma infecção por vírus ou bactéria. O que ocorre é que o organismo do paciente desenvolve uma reação imunológica para combater a infecção e destruir os vírus ou bactérias. Mas existem estruturas nos vírus e bactérias que são muito parecidas com a bainha de mielina, estrutura que reveste as células nervosas.
Algumas infecções que já foram associadas ao desenvolvimento de Guillain-Barré são as infecções por citomegalovírus, vírus da gripe, da dengue, da hepatite, além de bactérias como aCampylobacter jejuni.
Considerando o aumento expressivo do número de casos de Guillain-Barré em regiões onde também se constatou a presença do zika vírus, especialistas consideram que existem fortes indícios de correlação.
Como é o tratamento?
A doença pode regredir de maneira espontânea, mas existem dois tratamentos que aceleram a recuperação. Um deles é a plasmaférese, procedimento que lembra a hemodiálise, em que o sangue é filtrado para remover os anticorpos que estão lesando os nervos do paciente. O tratamento exige uma estrutura hospitalar complexa e uma equipe com experiência em hemoterapia.
O outro é a injeção de imunoglobulina humana, que faz com que os anticorpos deixem de atacar os próprios nervos. O tratamento de um único paciente com essa estratégia pode custar entre R$ 30 e 40 mil. Segundo o neurologista Marcondes Cavalcante França Junior, da ABNeuro, os dois tratamentos estão disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS), porém nem todos os hospitais têm a estrutura necessária para aplicá-los.
Além disso, é importante que o paciente fique internado durante a doença porque, caso a paralisia afete os músculos respiratórios, ele precisa ser submetido à ventilação mecânica. Mesmo pacientes com sintomas mais leves devem ser internados, pois a doença pode evoluir rapidamente.
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