(Metrópolis, 18/12/2015) Carta aberta com 500 assinaturas repudia a demissão da docente. Signatários atribuem a saída dela ao fato de Soraia da Rosa Mendes ter assinado manifesto favorável ao projeto que legaliza aborto
Um dia depois de ser convocada pelo Departamento de Gestão de Pessoal da Universidade Católica de Brasília (UCB), a professora Soraia da Rosa Mendes foi procurada por um aluno interessado em fazer direito penal com ela. Mas o nome dela não estava na relação de docentes da faculdade para o próximo semestre. Foi aí que ela desconfiou que o assunto tratado na área de recursos humanos da entidade seria sobre a sua demissão.
O desligamento de Soraia, que ocorreu na última segunda-feira (14/12), motivou os estudantes da UCB a protocolarem na reitoria uma carta aberta contra a demissão. Segundo acusam os alunos, a motivação teria sido o fato de a professora defender publicamente a legalização do aborto. O documento contém 500 assinaturas.
O motivo alegado para o desligamento foi o de que ela não estava mais nos planos da universidade, que está reestruturando o curso de direito. Mas a docente apresenta fatos polêmicos que a envolveram na faculdade e que corroboram a acusação dos estudantes.
De acordo com Soraia, em julho, ela recebeu um e-mail da direção do curso pedindo seu comparecimento para se retratar do apoio manifestado ao projeto de lei do deputado Jean Wyllys (PSol-RJ) que legaliza a interrupção voluntária da gravidez no Brasil.
Soraia afirma que assinou uma petição pública encampada pelo grupo Demodê — Desigualdades e Democracia, do Instituto de Ciências Políticas da Universidade de Brasília com manifestação favorável ao projeto do deputado.
Na parte debaixo do memorando, tinha um e-mail da assessoria de um deputado federal do qual não se recorda, questionado o fato de que “existisse um grupo de pesquisa na faculdade que debatesse esse tipo de assunto quando, na verdade, é uma entidade que defende a vida”.
Além de ministrar as aulas, Soraia coordenava, na UCB, um grupo de pesquisa chamado “Política Criminal e Direitos Fundamentais”, que tem como foco o direito das mulheres. Um dos assuntos abordados era justamente a legalização do aborto.
Ao chegar ao departamento na ocasião, Soraia afirma que um diretor teria sugerido que ela responsabilizasse os alunos pela assinatura do manifesto a favor do aborto. “Disse que não. Que o ato era meu”, conta a professora. O diretor, então, teria manifestado desapontamento com a decisão. “Você poderia ter deixado as coisas mais fáceis para nós”, disse à docente.
Ministério
Soraia suspeita que não tenha sido demitida naquele período em virtude da visita de integrantes do Ministério da Educação à UCB que ocorreu em julho. Após isso, passou a ser perseguida pela direção e colocada na geladeira. Primeiro, pediu relatório sobre presença dela na instituição. Depois, não respondiam seus questionamentos e justificativas. Certa vez, avisou que estava indo para um congresso e precisaria ausentar-se. “Perguntei se poderia assinar o ponto, mas ninguém respondeu”, lembra.
Desligada da UCB há menos de uma semana, a professora conta que tem enfrentado dificuldade para entender seu afastamento. A parte mais dolorosa é justamente a quebra da rotina de estar no campus de Taguatinga durante cinco anos em que fez parte do quadro da faculdade. “Um professor dentro de uma faculdade não pode estar cerceado. Troquei as senhas das minhas contas no banco porque era a data de entrada na faculdade. Para você ver o tanto que era importante para mim”, desabafa.
A UCB nega que a demissão tenha relação com a assinatura do manifesto em favor do aborto, mas ao excesso de faltas. Porém, Soraia afirma que, no último semestre, precisou se ausentar da faculdade por uma vez, em virtude de licença médica. “Como pode, de uma semana para outra, eu me tornar uma pessoa faltosa?”, contesta.
Ary Filgueira
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