Editorial da Folha de S.Paulo aborda aumento dos casos de sífilis em gestantes

23 de fevereiro, 2016

(Folha de S. Paulo, 23/02/2016) Há certas notícias do Brasil que parecem nos transportar de volta ao século 19, ou antes. Não bastassem zika, chikungunya e dengue, viroses transmitidas pelo velho e conhecido mosquito da febre amarela, o país vê explodirem também os casos de sífilis congênita.

Em 2014, último dado disponível, foram 16.266 ocorrências de nascituros infectados. Entre gestantes, a incidência quase quadruplicou, indo de 7.920 casos, em 2008, para 28.226, seis anos depois.

Para comparação: há 508 casos confirmados de microcefalia desde outubro, que provocaram alarme nacional. Os números da sífilis são coisa muito mais séria.

A infecção pela bactéria Treponema pallidum, ao ser transmitida da mãe para o bebê, pode causar malformações ósseas no feto (inclusive microcefalia). Se não for tratada até um mês de vida, há risco de cegueira, surdez e retardo mental.

Neste caso, não há uma população de insetos fora de controle por incúria do poder público. Há, isso sim, uma coleção de falhas –passadas e presentes– das autoridades de saúde.

Atribui-se a explosão de sífilis, primeiro, a um aumento de notificações. O problema já existiria faz muito e não teria sido conhecido na sua real dimensão. Ora, isso só demonstra um fracasso do sistema de vigilância sanitária, mitigado por avanços mais que tardios.

Há fatores concorrentes e mais atuais. Tantas mulheres infectadas evidenciam uma frequência ainda alta de sexo desprotegido, a atestar a deficiência dos programas governamentais de educação e prevenção a respeito de doenças sexualmente transmissíveis (DST).

Outra explicação, ao que tudo indica ainda mais grave, é a falta de medicamentos para tratar as mães e sua prole –há carência das duas modalidades de penicilina (benzatina e cristalina). Levantamento do Ministério da Saúde em janeiro apontou desabastecimento em 16 Estados.

Se a sífilis é a mais conhecida DST, a penicilina é o pai de todos os antibióticos. A substância foi identificada em 1928 a partir do fungo Penicillium por Alexander Fleming e abriu uma nova era de combate a germes que afligem a humanidade desde o início da espécie.

Há algo de muito enfermo em um sistema de saúde que não consegue, em pleno século 21, manter e distribuir estoques adequados de um remédio tão básico.

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