Mulheres com plano de saúde vão ao SUS em busca de parto normal

26 de janeiro, 2015

(Folha de S. Paulo, 26/01/2015) Mulheres com plano de saúde estão deixando os hospitais privados para ter seus filhos em casas de parto e maternidades do SUS.

Segundo as mães, essa migração, que ocorre em vários Estados, é resultado da dificuldade de encontrar médicos na rede suplementar que dispostos a realizar o parto normal. A cirurgia significa maior previsibilidade para o médico, que pode agendá-la.

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A gestora de redes sociais Ana Bárbara Rossato, 24, por exemplo, foi a vários obstetras do convênio Marítima durante a sua primeira gravidez. Um deles quis cobrar uma taxa de disponibilidade de R$ 6 mil para o parto normal, afirma.

A solução for ter o bebê na Casa de Parto de Sapopemba, na zona leste, uma das preferidas desse grupo de gestantes. De 2012 para 2014, o número de partos no local se manteve em 160. Já o número de mulheres com convênio tendo bebê foi de 48 para 69.

“Soube pela internet. Morava na Lapa, do outro lado da cidade. Eu e meu marido pegamos o GPS e fomos. A família ficou um pouco receosa, mas deu tudo certo.”

O local só recebe gestantes de baixo risco e o parto é feito por enfermeiras obstetras. Em caso de intercorrência, a paciente é transferida.

Hoje, 84% dos partos na rede privada são cesáreos. Na rede pública, o índice é de 40%.

Com o boca a boca, algumas maternidades públicas se tornaram referência em partos normais entre as gestantes. A recepcionista Cristiane de Lima, 37, por exemplo, já decidiu que terá seu segundo filho na maternidade pública Maria Amélia Buarque de Hollanda, inaugurada em 2012 no centro da cidade, mesmo tendo convênio.

“Tem gente que diz que sou maluca. Mas como o médico começou a colocar dificuldades para fazer o normal, algumas amigas disseram ‘vai pro SUS, está todo mundo fazendo isso’. Faço pré-natal com um médico do plano. Para não ter discussão, vou enrolando ele e na hora do parto vou para a Maria Amélia.”

“Não temos a mesma acomodação do setor privado, a enfermaria no pós-parto é compartilhada, mas nossos índices de cesáreas e intervenções é baixo”, diz Wallace Mendes, diretor clínico.

Também na Maria Amélia, a pedagoga Luana Gonçalves, 30, atravessou a ponte Rio-Niterói para dar à luz seu filho Renzo, em 2013.

“O único porém é a enfermaria coletiva pós-parto. Não tem muita privacidade. Você cansada, aprendendo a amamentar, e não tem nem uma cortininha. Fora isso, foi ótimo”, diz ela, que tem Unimed.

A servidora pública Camila Cabral, 33, que teve a filha em um hospital público)

A servidora pública Camila Cabral, 33, que teve a filha em um hospital público (Foto: Sergio Lima/Folhapress)

Em Belo Horizonte, fenômeno parecido ocorre no hospital público Sofia Feldman.

“O hospital fica num bairro longe do centro e bem pobre. Quando tive meu primeiro filho, em 2011, até escondi da família do meu marido. Hoje as mulheres falam em alto e bom som que vão para o Sofia”, diz a advogada Gabriella Sallit, 35, deu à luz seus dois filhos no local.

“Dividi enfermaria com menina de 16 anos que usava crack e tinha acabado de parir. Mas fiz essa escolha consciente, queria parto normal.”

RESSARCIMENTO

Não há impedimento legal para que a rede privada abra maternidades em que partos normais sejam feitos por enfermeiras obstetras. Tais estabelecimentos, porém, ainda são raros. Se uma paciente com plano vai ao SUS, a internação, por lei, deve ser ressarcida pela operadora. Partos ocupam o primeiro lugar na lista de procedimentos reembolsados –o governo cobra R$ 443 por um parto normal.

Há estudos, porém, que apontam que o Fundo Nacional da Saúde recebe menos do que deveria dos planos. A ANS diz que o sistema vem sendo aprimorado e deve incluir consultas e outros serviços.

Quando a servidora pública Camila Cabral, 33, de Brasília, teve a filha Alyce na Casa de Parto de São Sebastião (DF), foi procurada pela Amil para saber por que não tinha usado o plano. “Fiquei morrendo de medo de entrar na faca. Sempre paguei convênio, mas meu plano A era ter a Alyce no SUS.”

OUTRO LADO

Segundo Karla Coelho, gerente de Assistência à Saúde da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), usuárias de plano de saúde não deveriam ter que recorrer ao SUS para fazer parto normal.

“Sabemos que as mulheres estão com dificuldades de ter um parto normal na saúde suplementar. O ideal é que busquem o profissional que faça esse parto. Se a operadora não indicar os médicos, poderá ser multada”, afirma.

Ela afirma ainda que a ANS está buscando novos modelos de atendimento às gestantes para melhorar as taxas de cesarianas e que a entidade quer trazer as experiências exitosas da rede pública.

Em notas, as operadoras citadas afirmaram ter como diretriz iniciativas que estimulem o parto normal. Como forma de incentivo, a Amil disse que adota políticas de remuneração que estimulam os médicos a realizar parto normal, além de dar orientações sobre esse tipo de parto.

A Marítima disse que apoia as políticas públicas que visam incentivar a realização de mais parto normais, mas que não compete à seguradora a decisão sobre realização de parto normal ou cesário. Sobre a “taxa de disponibilidade obstétrica”, a empresa disse que essa cobrança não faz parte da cobertura do seguro.

Coelho afirma que a cobrança dessa taxa é ilegal e deve ser denunciada. “A cliente já paga o plano, e taxa nem é uma garantia de que ela terá parto normal.”

Segundo a Unimed-Rio, nenhum plano da rede faz restrição ao parto normal. A Unimed-BH afirma que desenvolve programas de incentivo ao parto normal para médicos cooperados e rede hospitalar.

Mariana Versolato

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