Congresso Nacional homenageou Marcha das Margaridas. Procuradoria dos Direitos do Cidadão também promove iniciativas no marco da Semana de Luta pela Reforma Agrária e Contra a Violência
(MPF, 13/08/2019 – acesse no site de origem)
Mais de 600 mulheres trabalhadoras do campo, das florestas e das águas estiveram reunidas na manhã desta terça-feira (13) no plenário Ulysses Guimarães em uma sessão solene promovida pelo Congresso Nacional para homenagear a Marcha das Margaridas. A atividade reverenciou a mobilização que acontece entre hoje e amanhã, em Brasília, reunindo cerca de 100 mil mulheres trabalhadoras rurais de todo o país. O ato marca a memória da líder sindical paraibana Margarida Maria Alves, assassinada em 12 de agosto de 1983, no contexto da luta por direitos no campo, e que ensejou o Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária.
“A morte de Margarida Alves é marcada por muitas simbologias. É o silenciamento da voz da mulher, da nordestina, da camponesa e dos que lutam por direitos”, destacou a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat.
Para a representante do Ministério Público Federal, o enfrentamento à opressão e à violência é um desafio que aproxima mulheres indígenas, camponesas, trabalhadoras do campo e da cidade. “Ser mulher é ter o compromisso com todas essas lutas por direitos, especialmente diante das atuais ameaças às garantias estabelecidas pela Constituição de 88”.
A procuradora federal dos Direitos do Cidadão apontou que os retrocessos que se verificam em diversas políticas públicas nos mostram que o tempo não é linear e que estamos nos aproximando daquele vivido por Margarida Alves, no qual a violência é a ferramenta para exterminar tudo que não faz parte da hegemonia. “Quero portanto saudar todas as Margaridas presentes, na expectativa de que essas lutas que se iniciam e se fortalecem consigam dizer não ao retrocesso”, destacou.
O reconhecimento à mobilização dessas trabalhadoras também foi lembrado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Em mensagem lida pela deputada Erika Kokay (PT-DF), uma das autoras do requerimento para a sessão solene, o presidente da Casa reforçou que “homenagear o maior movimento de mulheres da América Latina é reverenciar uma mobilização que traz para Brasília camponesas de todos os cantos do país comprometidas com suas bandeiras de soberania popular, de democracia, de justiça, de igualdade e pela diminuição da violência”, destacou.
A Marcha das Margaridas acontece a cada quatro anos e constitui a maior ação organizada na América Latina por mulheres do campo, das florestas e das águas. Em 2019, a mobilização tem como lema “Margaridas na luta por um Brasil com soberania popular, democracia, justiça, igualdade e livre de violência”.
Termo de cooperação para o combate à violência no campo – Também nesta terça-feira – como parte das iniciativas que marcam o Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária e Contra a Violência no Campo – a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão firmou um termo de cooperação com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) voltado a prevenir a violência agrária.
Dados do mais recente relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT) apontam que quase um milhão de pessoas estiveram envolvidas em conflitos no campo no Brasil em 2018. Somente nos três primeiros meses deste ano já foram registrados dez assassinatos em disputas por terra.
“A cooperação tem como referência o reconhecimento do coletivo como importante interlocutor para a construção do diálogo necessário ao desenvolvimento de soluções pacíficas dos conflitos no campo no Brasil. Além de estabelecer uma mesa de diálogo para tratar dos casos de violações de direitos, o protocolo pretende auxiliar na coleta, análise e sistematização de denúncias sobre ameaças e violências, bem como descumprimento na implementação de políticas públicas na área”.
O grave cenário de violência no campo e o papel do Ministério Público Federal na garantia de direitos também levaram a PFDC a elaborar roteiros voltados a subsidiar a atuação do MPF na área. Em “Violências praticadas contra Defensores de Direitos Humanos no Campo– Possibilidades de Atuação” são apresentadas diretrizes para uma atuação pós conflito, com sugestões das primeiras medidas a serem adotadas, assim como ações práticas na definição de estratégias de curto e longo prazo. A publicação busca não apenas indicar caminhos para acompanhar e propor respostas aos conflitos, mas também permitir uma atuação proativa da instituição e um diálogo permanente com as famílias das vítimas.
Já o roteiro “Ameaças contra Defensores de Direitos Humanos no Campo – Possibilidades de Atuação” é voltado à uma atuação institucional que anteceda a prática de qualquer ato de violência no campo. Orientações sobre formalização de ameaças, padronização de registros e fluxos para o adequado acompanhamento processual, análise de risco e encaminhamento de demandas fazem parte do guia, que busca não apenas garantir a integridade física dos defensores de direitos humanos, mas a continuidade da luta pelo direito à terra. Os materiais foram elaborados pelo Grupo de Trabalho da PFDC sobre Direito à Reforma Agrária e podem ser acessados em sua versão eletrônica.
Em defesa de direitos e contra a violência – Diante do encolhimento dos espaços de diálogo institucionais sobre a questão, em 2016, a PFDC reativou o funcionamento do Fórum por Direitos e Contra a Violência no Campo. O colegiado retoma experiência desenvolvida na década de 1990 e busca atuar como agente articulador dos diversos segmentos afetados pela desconstrução de políticas públicas na área, reunindo representantes de organizações da sociedade civil e de movimentos de indígenas, camponeses, pescadores, quilombolas e outras comunidades tradicionais.
Em sua mais recente reunião, promovida na última sexta-feira (9), o Fórum colocou em pauta temas como a MP 881, os impactos causados pelo fechamento de escolas do campo, além da desistência do Incra em processos de desapropriação de terra – assunto que voltou a ser debatido ontem (12), em reunião solicitada pela deputada Érika Kokay, que integra a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara. “O foco de preocupação está no risco de conflitos durante reintegrações de posse decorrentes da desistência de interesse do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária em processos de desapropriação”, destacou.
A reflexão sobre esses e outros desafios na área também está na seleção de artigos científicos que a PFDC está promovendo, e cuja prorrogação das inscrições até o próximo dia 19 foi anunciada hoje. Os textos integrarão coletânea editada pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e deverão tratar sobre reforma agrária, por meio da abordagem do papel do sistema de justiça (Ministério Público, Poder Judiciário, Advocacia-Geral da União, Defensoria Pública, Assessorias Populares, dentre outros), em face das práticas e desafios para a sua efetivação.
Os artigos podem ser de autoria de membros do MPF ou de colaboradores externos à instituição e deverão trazer um enfoque jurídico, podendo conter, também, análises próprias de outros campos do conhecimento.
Diagnóstico da reforma agrária – Ainda como parte das ações que marcam o Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária e Contra a Violência no Campo, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão está coletando informações para elaboração de relatório acerca da situação da reforma agrária no Brasil.
Realizado em ação coordenada com Procuradorias da República em todo o país, o levantamento elencará dados sobre o número de imóveis desapropriados e de assentamentos criados pelo poder público ao longo dos últimos anos no Brasil, assim como a aquisição de terras para a reforma agrária e a evolução orçamentária para a área.
O diagnóstico deverá contar ainda com dados sobre mortes em decorrência de conflitos por terra, ordens de reintegração de posse que estão em aberto no âmbito das Secretarias de Segurança Pública, bem como de mandados cumpridos. A proposta é que as informações possam subsidiar uma ação ampla do Ministério Público Federal na matéria.