(Agência Brasil, 26/03/2015) A participação da sociedade civil nos sistemas de comunicação e o papel da mídia pública foram temas de debate hoje (26) na quarta edição do Fórum Mundial de Mídia Livre (FMML), na Universidade El Manar, em Túnis, capital da Tunísia. O encontro é um evento paralelo ao Fórum Social Mundial, que ocorre no mesmo local, até o dia 28 de março.
O jornalista e documentarista Stelios Kouloglou, membro do Parlamento Europeu pelo Syriza, partido de esquerda grego que obteve vitória nas eleições gerais em janeiro, disse que as emissoras de televisão e de rádio públicas gregas foram fechadas em 2013 pelo governo anterior sob a justificativa de corte de gastos. Segundo ele, o novo governo vai restaurar o sistema público de comunicação.
“Esta foi uma das promessas eleitorais do nosso governo. A sociedade grega reagiu fortemente ao fechamento porque a programação é independente e de alto nível de qualidade. Há uma tradição de independência da mídia pública em relação ao governo. Uma das formas de garantir a independência é mudar a forma de escolher a direção das empresas de comunicação pública estabelecendo um comitê com especialistas da área. Este comitê, independente do governo, é que vai escolher os dirigentes”, disse.
A jornalista e ativista da Ciranda Internacional da Comunicação Compartilhada, Rita Freire, que também é integrante da comissão organizadora do FMML, ressaltou que, entre os pontos da Carta Mundial da Mídia Livre aprovada no encontro, estão a importância de estabelecer sistemas de comunicação regulados para assegurar a liberdade de expressão e o papel das mídias públicas, além da busca por alternativas para que a sociedade civil e os movimentos sociais participem da construção dos sistemas públicos de comunicação. “Entendemos a mídia pública em sua autonomia como mídias livres do controle do governo e do mercado”.
O diretor-presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), Nelson Breve, ressaltou que a comunicação é um serviço público e precisa ser entendida como um bem público cuja regulação e fiscalização têm de ser feitas pela sociedade civil.
“A comunicação como um direito, e portanto, os meios de comunicação como bem público precisam ter o controle da sociedade na formulação, regulação e fiscalização. Se a sociedade civil não puder acompanhar de perto a formulação das políticas que têm a ver com a comunicação, a sua efetiva regulação e fiscalização, significa que ela não tem controle sobre os seus bens públicos de comunicação. Este é o direito que precisa ser afirmado”.
A representante dos trabalhadores no Conselho Curador da EBC, Eliane Gonçalves, lembrou que a Constituição Federal prevê a complementaridade dos sistemas público, estatal e privado, mas, segundo ela, essa situação ainda não ocorre no Brasil. “O setor privado tem que cumprir sua função pública que não vem sendo feita. Nesse sistema de complementaridade, o campo público é uma área sombreada porque não temos exatamente claro o que é esse campo público, qual a diferença dele em relação ao estatal”.
Nelson Breve foi perguntado, no debate, sobre o documento de análise da comunicação do governo divulgado pelo jornal O Estado de S. Paulo, cuja autoria foi atribuída à Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom). O texto faz uma avaliação da estratégia de comunicação, classificando-a de “errática”. O documento lista erros na comunicação do governo após a reeleição da presidenta Dilma Rousseff e diz que os seus apoiadores estão levando uma “goleada” da oposição nas redes sociais.
O documento sugere alterações na comunicação do governo, colocando sob a mesma coordenação a Voz do Brasil, as páginas oficiais da internet e a Agência Brasil. Para Nelson Breve, houve uma certa confusão porque a lei que instituiu a EBC já prevê uma determinada independência para a empresa.
“Sei que o documento não foi negado pela Secom como sendo produzido pela Secom. Duvido que tenha sido produzido pelo ministro Thomas [ex-ministro Thomas Traumann]. Ele sabe muito bem a distinção que existe entre a Agência Brasil e determinados meios. Talvez tenha tido um lapso, pode ser Portal Brasil em vez de Agência Brasil ou não é no mesmo nível que se falava de Voz do Brasil ou NBR [canal de TV fechado]”.
Segundo ele, ainda é difícil explicar para a sociedade que a EBC trata tanto da comunicação pública quanto da comunicação de governo, por meio da Voz do Brasil e da NBR. “É muito difícil comunicar para a sociedade o que é público e o que é da sociedade, estando [a empresa] tão vinculada às ações da Presidência da República e da área de comunicação social da Presidência da República, que faz a comunicação de governo. É difícil fazer essa explicação. Estamos tentando há sete anos e não estamos tendo muito sucesso para fazer essa distinção”, constatou.
O presidente da EBC defendeu que a parte pública da empresa saia do âmbito da Secom e vá para o Ministério das Comunicações, onde, junto com outras empresas da área de comunicação, possa fazer uma articulação para atuar na regulação dos sistemas de comunicação. “Ou seja, mostrar que é possível fazer de um determinado jeito e depois, pelo exemplo, fazer com que as outras empresas sejam aderentes a esses princípios e passem a prestar um serviço efetivamente público”, disse. Ele ressaltou, no entanto, que não há ambiente político no momento para fazer essa mudança.
A EBC é uma empresa pública que tem sete emissoras de rádio (Nacional FM Brasília,Nacional Rio AM, Nacional Alto Solimões, Nacional Brasília AM, Nacional Amazônia, MEC FM – Rio, MEC AM – Rio), duas emissoras de televisão (TV Brasil e TV Brasil Internacional), duas agências de notícias (Agência Brasil e Radioagência Nacional) e o Portal EBC, que integra os conteúdos de todos os veículos.
A empresa é responsável ainda pela prestação de serviço, na área de comunicação, ao governo federal por meio da NBR, da Voz do Brasil e das mídias impressa e eletrônica.
Ana Cristina Campos
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