16/08/2013 – Esperado pela comunidade lésbica, filme ‘Flores Raras’ vai além disso, por Rita Quadros

16 de agosto, 2013

(Folha de S.Paulo) Este poderia ser só mais um filme ansiosamente esperado pela comunidade lésbica e, embora seja, vai além. “Flores Raras” nos conta a história de duas mulheres vivendo os encontros e desencontros do amor e da vida, os traumas familiares e suas consequências e a maneira como, cada uma a seu modo, sobrevivem a tudo isso.

Estamos diante de um belo filme. A concretude e objetividade de uma, que explode um morro para proporcionar uma vista maravilhosa à amada, e a subjetividade de outra, que se liberta diante do estrangeiro que a acolhe.

A fortaleza e a assertividade se fundem com a insegurança e a sensação de não ter lugar no mundo: uma se fundindo com outra, vivendo a troca que torna surpreendente o final dessa história de amor intenso e denso.

A trama aguça a curiosidade pela poesia de Bishop e o papel de Lota na arquitetura carioca. Mas tem mais. Uma mulher muda a vida de outra. Empresto a frase de Norma, promotora legal popular, no documentário “Imagem Mulher”, que dialoga com o papel da mídia na legitimação da violência contra a mulher (a ser exibido em setembro).

A militância lésbica está colocada diante dos desafios de romper com os padrões heteronormativos das relações entre mulheres e de participar na construção de um mundo onde mulheres não sejam menos que homens.

No filme, as duas transitam sem problema por salões, festas e reuniões, tratadas com respeito e admiração. Em tempos de debates sobre laicidade do Estado, concepções de cidadania e novos arranjos familiares, “Flores…” nos mostra o quanto o poder aquisitivo ainda é passaporte para acesso a direitos.

Tempos em que a intolerância religiosa interfere de maneira brutal na vida das pessoas, quando direitos podem se tornar moeda de troca em espaços que deveriam garantir acessibilidade e equidade nas políticas públicas e no Judiciário.

Uma mulher muda a vida de outra mulher. Mas, onde estão as mulheres? Onde estão as lésbicas? Há mais de 30 anos a participação política dessas mulheres tem contribuído para os avanços.

Tem mais. Precisamos superar a violência física e/ou psicológica que pode ser impingida pelo simples fato de a pessoa ser mulher, por usar roupa “inadequada” ou pelo “despudor” de se relacionar com alguém do mesmo sexo.

Glória Pires e Miranda Otto são dignas de homenagens. Assim como Bias e Roses, Célias e Camilas, Érides e Anas Cleides e Telmas, Silvias e Cris. E tantas outras anônimas que em seu dia a dia, se comprometem e transformam a vida de tantas outras mulheres. Todas podem ser flores, mas nada banais.

RITA QUADROS, feminista, integra a coordenação do Cinemulher e coordena a área de controle social da Secretaria de Política para Mulheres de São Paulo.

Acesse o PDF: Esperado pela comunidade lésbica, filme vai além disso (Folha de S. Paulo, 16/08/2013)

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