(O Globo) Achava que era só aqui em casa, ou em outras poucas, que a mulher decide, que dá as ordens, que é em suma quem manda. Aí vem o último Censo Demográfico com dados mostrando que o fenômeno é mais geral, pois o número das chefes de família dobrou em uma década: pulou de 9,048 milhões para 18,617 milhões entre 2000 e 2010, enquanto o de homens chefes de família permaneceu praticamente o mesmo: 31 milhões.
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Num país machista como o nosso, o fenômeno é no mínimo curioso, e as razões apontadas são econômicas.
Segundo o técnico do IBGE Gilson Gonçalves de Matos, a mudança representa um avanço, porque reflete maior presença feminina no mercado de trabalho e melhor nível de escolaridade.
Os dados revelam também que houve outras mudanças importantes na família brasileira, como o aumento das uniões informais, dos casamentos inter-raciais, das separações e dos divórcios.
Um terço dos brasileiros que vivem uma relação conjugal não formalizou o casamento no civil nem no religioso. A união consensual foi a única que teve crescimento na década, passando de 28,6% para 36,4%, enquanto a proporção de pessoas casadas no civil e no religioso, no mesmo período, caiu de 49,4% para 42,9%.
Mais do que o fim do casamento, como apregoam os pessimistas, o que essas transformações indicam é o declínio do velho modelo patriarcal, com os papéis bem definidos, o homem como único provedor e a mulher na condição subalterna de dependente econômica, emocional e psicológica — o modelo “Amélia”, que achava bonito não ter o que comer.
Aos que acreditam na decadência moral da sociedade e na dissolução dos costumes pode-se contrapor uma pesquisa recente do Datafolha, que mostrava a família como uma das instituições mais valorizadas. Quase sete pessoas em dez (69%) afirmavam que ela era “muito importante”.
O sintomático é que a família conquistou essa confiança não porque ficou mais rígida e careta, mas, ao contrário, porque aumentou sua tolerância em relação a temas como virgindade, relacionamentos homossexuais, sexo antes do casamento, namoro em casa, gravidez de solteiras. Por exemplo: 55% não viam problema em que a filha solteira não fosse mais virgem.
No “meu tempo”, mulher separada era estigmatizada. Hoje, conheço várias que já se casaram e se descasaram duas, três vezes, e em suas casas é comum ver reunidos irmãos e meio-irmãos, maridos e ex-maridos, esposas e ex-esposas, pais e padrastos, tudo na mais perfeita harmonia.
Acesse em pdf: Elas é que mandam, por Zuenir Ventura (O Globo – 20/10/2012)